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terça-feira, 28 de junho de 2016

LIBERTE-SE DO PASSADO

“Não viva no passado, 
não sonhe com o futuro, 
concentre a mente no momento presente.”
(Buda)
 
 
Parte III
 
Poderemos, então, vós e eu, promover em nós mesmos - sem dependermos de nenhuma influência exterior, de nenhuma persuasão, sem nenhum medo de punição - poderemos promover em nossa própria essência uma revolução total, uma mutação psicológica, para que não sejamos mais brutais, violentos, competidores, ansiosos, medrosos, ávidos, invejosos - enfim, todas as manifestações de nossa natureza que formaram a sociedade corrompida em que vivemos nossa vida de cada dia?

Importa compreender desde já que não estou formulando nenhuma filosofia ou estrutura de ideias ou conceitos teológicos. Todas as ideologias se me afiguram totalmente absurdas. O importante não é uma filosofia da vida, porém que observemos o que realmente está ocorrendo em nossa vida diária, interior e exteriormente. Se observardes muito atentamente o que se está passando, se o examinardes, vereis que tudo se baseia num conceito intelectual. Mas o intelecto não constitui o campo total da existência; ele é um fragmento, e todo fragmento, por mais engenhosamente ajustado, por mais antigo e tradicional que seja, continua a ser uma parte insignificante da existência, e nós temos que nos interessar pela totalidade da vida. 

Quando consideramos o que está ocorrendo no mundo, começamos a compreender que não há processo exterior nem processo interior; há só um processo unitário, um movimento integral, total, sendo que o movimento interior se expressa exteriormente, e o movimento exterior, por sua vez, reage ao interior. Ser capaz de olhar esse fato - eis o que é necessário, só isso; porque, se sabemos olhar, tudo se torna claríssimo. O ato de olhar não requer nenhuma filosofia, nenhum instrutor. Ninguém precisa ensinar-vos como olhar. Olhais, simplesmente. Assim, vendo todo esse quadro, vendo-o não verbalmente porém realmente, podeis transformar-vos, natural e espontaneamente? Esse é que é o verdadeiro problema. Será possível promover uma revolução completa na psique?

Eu gostaria de saber qual é a vossa reação a uma pergunta dessas. Direis, porventura: "Não desejo mudar" - e a maioria das pessoas não o deseja, principalmente aqueles que se acham em relativa segurança, social e economicamente, ou que conservam crenças dogmáticas e se satisfazem em aceitar a si próprios e às coisas tais como são ou em forma ligeiramente modificada. Tais pessoas não nos interessam. Ou talvez digais, mais sutilmente: "Ora, isso é dificílimo, está fora do meu alcance". Nesse caso, já fechastes o caminho, já cessastes de investigar e será completamente inútil prosseguir. Ou, ainda, direis: "Percebo a necessidade de uma transformação interior, fundamental, em mim mesmo, mas como empreendê-la? Peço-vos me mostreis o caminho, me ajudeis a alcançá-la". Se assim falardes, então o que vos interessa não é a transformação em si, não estais realmente interessado numa revolução fundamental: estais, meramente, a buscar um método, um sistema capaz de efetuar a mudança.

Se fôssemos tão sem juízo que vos déssemos um sistema, e vós tão sem juízo que o seguísseis, estaríeis meramente a copiar, a imitar, a ajustar-vos, a aceitar, e, fazendo tal coisa, teríeis estabelecido em vós mesmo a autoridade de outrem, do que resultaria conflito entre vós e essa autoridade. Pensais que deveis fazer tal e tal coisa porque vo-la mandaram fazer e, no entanto, sois incapaz de fazê-la. Tendes vossas peculiares inclinações, tendências e pressões, que colidem com o sistema que julgais dever seguir e, por conseguinte, existe uma contradição. 

Levareis, assim, uma vida dupla, entre a ideologia do sistema e a realidade de vossa existência diária. No esforço para ajustar-vos à ideologia, recalcais a vós mesmo e, no entanto, o que é realmente verdadeiro não é a ideologia, porém aquilo que sois. Se tentardes estudar-vos de acordo com outrem, permanecereis sempre um ente humano sem originalidade.


J.Krishnamurti

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