Translate

sábado, 16 de abril de 2016

SOBRE O VIVER 
MOMENTO POR MOMENTO
  
Uma coisa que tem continuidade
 nunca pode ser nova. 


Pense nisso a fundo e verá: não é nenhum problema complicado. Não há dúvida de que, se eu consigo completar cada dia sem transportar para o dia seguinte minhas ansiedades, minhas tribulações, saberei enfrentar de maneira nova o dia de amanhã. 


O enfrentar o desafio de maneira nova é criação, e não haverá criação se não houver um findar. Você enfrenta o que é novo com o que é velho; por conseguinte, há necessidade de que o velho termine, para você enfrentar o novo. Há necessidade de um findar a todos os minutos, de modo que cada minuto seja um minuto novo. Isso não é nenhuma imagem, nem devaneio poético. 



Se você experimentar, verificará o que acontece. Mas, nós queremos continuar, subsistir. Queremos uma continuação de momento em momento, dia por dia, porque pensamos que sem continuidade não existimos.


Ora, o que é capaz de continuar, 
pode se renovar? Pode ser novo? 


É evidente que só pode haver uma coisa nova, quando há um findar. Seu pensamento é contínuo. O pensamento é resultado do passado; é uma continuação do passado, que em conjunção com o presente, cria, modifica o futuro. Mas o passado, atravessando o presente, para o futuro, é sempre continuidade. Não há solução da mesma. 


Só na quebra da continuidade se pode ver algo novo. O pensamento precisa se extinguir para que o novo exista. Mas você bem sabe o que estamos fazendo. Estamos nos servindo do presente, como uma passagem do passado para o futuro. Não é o que estamos fazendo? Para nós o presente é sem importância. 


Ao pensamento, que é a ação do presente, que é a relação presente, não atribuímos importância alguma.  Atribuímos importância ao produto, ao resultado do pensamento, que é o futuro ou o passado. Não notou como os velhos contemplam o passado, e também os jovens contemplam o passado, às vezes, ou o futuro? Ocupam-se de si mesmos, no passado ou no futuro, e nunca dão inteira atenção ao presente. 


Dessa maneira, usamos o presente como uma passagem para outra coisa, não havendo com isso consideração, observação do presente; e para se observar o presente, o passado precisa morrer. Certo, para percebermos o que é, não podemos olhar o presente através do passado. Se desejo compreender você, devo olhá-lo diretamente e não por meio dos meus velhos preconceitos. Porque, nesse caso, estou apenas olhando os meus preconceitos. Só posso olhá-lo quando não existirem preconceitos; por essa razão, precisamos colocar fim aos preconceitos.


Assim, para compreendermos o que é, que é ação, que é relação, a cada momento, há necessidade de estarmos novos; por conseguinte, o passado precisa terminar; e isto não é nenhuma teoria. Experimente, para ver como esse findar não é tão difícil como lhe parece. Enquanto você está escutando, experimente, e verá como é fácil findar completamente o pensamento e ficar apto para descobrir. 


Isto é, quando você não está influenciado, quando está interessado em alguma coisa, vitalmente, profundamente, você a olha de maneira nova. O próprio interesse expulsa o passado. Só lhe interessa observar o que é e deixar que ele se revele a você. Ao perceber a verdade disso, a sua mente se desocupa momento por momento. Por conseguinte, está descobrindo tudo por maneira nova, e é por isso que o conhecimento nunca pode ser novo. 


Só a sabedoria é nova. O conhecimento pode ser dado na escola, mas a sabedoria não pode ser ensinada. Uma escola de sabedoria é um absurdo. A sabedoria é descobrimento e a compreensão do que é, momento por momento, e como se pode lhe ensinar a observar o que é. Se lhe ensinam, isso é conhecimento, o qual se interpõe entre você e o fato. 


O conhecimento, por conseguinte, é uma barreira diante do novo, e uma mente cheia de conhecimento não pode compreender o que é. Você é instruído, não é? E é nova a sua mente? Ou ela está repleta de fatos armazenados na memória? E uma mente que se torna dia a dia em mero repositório de fatos — como pode uma mente dessas perceber uma coisa nova? Para perceber o que é novo, se requer completa ausência de conhecimentos passados. Só no descobrimento do que é, instante por instante, se encontra a liberdade que a sabedoria traz. A sabedoria, por conseguinte, é algo novo, não repetido, não é coisa aprendida de um livro escolar ou Sankara, do Bhagavad Gita, do Cristo.


Vemos que o conhecimento que continua é uma barreira à compreensão do novo. Se, quando você escuta, coloca em atividade seus conhecimentos anteriores, como você pode compreender? Primeiro, você deve escutar. Senhor, um engenheiro tem conhecimentos relativos à resistência de materiais; mas quando vai construir uma ponte, precisa primeiro estudar o local e o solo. Precisa estudá-los independentemente da estrutura que vai construir, o que significa que precisa olhá-los de maneira nova, e não apenas, copiando um livro. Mas há sempre perigo nas comparações, por isso convém usá-las com sobriedade. 


O que importa é que haja uma renovação e que nela haja criação, ímpeto criador, renascimento constante; e isso só é possível quando morremos a cada minuto. Assim pode a mente receber a verdade. A verdade não é uma coisa absoluta, definitiva, remota. Ela existe para a descobrirmos momento por momento, e não podemos descobrí-la num estado de continuidade. 


Continuidade, afinal de contas, é memória, e como pode a memória ser nova? Como pode a memória, que é experiência, que é passado, compreender o presente? Só quando o passado está perfeitamente compreendido e a mente vazia, pode ela perceber o presente na sua significação integral. Mas em geral a nossa mente não está vazia. 


As nossas mentes estão cheias de conhecimentos, e não são mentes que pensam. São mentes que só sabem repetir, gramofones, que mudam o disco de acordo com as circunstâncias. E tais condições, a mente é incapaz de descobrir o novo. Só há algo novo no findar; mas você tem medo disso. Você tem medo de findar, e tudo o que você fala, toda a sua acumulação de atos constituem uma proteção, uma fuga disso. 


Você, por conseguinte, busca a continuidade, mas a continuidade nunca é nova, nela não pode dar-se renovação, nunca há um vazio onde você possa receber. Assim, a mente só pode se renovar quando está vazia, e não quando repleta de vossas ansiedades, dia por dia; e com o findar da mente, há uma criação, que é eterna.



Krishnamurti




A 'morte' é descontinuidade por isso não queremos morrer, queremos ser eternos no temporal. Como isso é possível? Se existimos em um mundo transitório - tudo que nasce morre - como podemos perpetuar os acontecimentos, nossos momentos, nossos encontros, nossas vidas? É parar o fluxo da vida e isso não é possível. A mudança é um fator constante, ela existe para nos arrebatar da inércia, pois a cada momento precisamos nos renovar, nascer de novo. Osho nos diz que "Todas as nossas misérias e sofrimentos não são nada mais do que apego. Toda a nossa ignorância e escuridão é uma estranha combinação de mil e um apegos. Nós estamos apegados a coisas que serão levadas no momento da morte, ou mesmo, talvez, antes. O amor é a única libertação do apego". Então tudo o que desejamos que continue está profundamente ligado aos apegos; somos entes apaixonados, possessivos. "Quando você ama tudo, não está preso a nada". Se não mais estamos atados a nada, nada tememos. Estamos prontos para morrer! KyraKally

Nenhum comentário:

Postar um comentário