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quarta-feira, 6 de abril de 2016

A MISTERIOSA ENERGIA 
DO AMOR II


“Tudo isso pode ser verdade”, dizem-me com frequência os amigos céticos, “mas onde estão as provas de que esta energia do amor funciona? E se funciona, como podemos aumentar sua produção, acumulação e circulação no mundo dos homens?”

Minha resposta a estas questões difíceis é a seguinte: O nosso conhecimento existente sobre esta energia é, por enquanto, quase desprezível. O nosso know-how sobre a sua produção e utilização eficientes também é muito escasso. E, no entanto, este conhecimento precário e know-how insignificantes são suficientes para justificar a hipótese de que esta “virtude do amor” seja uma das três energias superiores conhecidas pelo homem (junto com as da verdade e da beleza).

Esta energia ou força é diferente de e irredutível às quantidades mensuráveis da Física, denominadas “peso”, “trabalho”, “força” e “energia”. As suas propriedades são antes qualitativas que quantitativas. Até o momento não possuímos qualquer “unidade” desta energia (como o erg “unidade de trabalho” da Física) para medi-la com exatidão. Só conseguimos avaliar a grosso modo quando a sua (a) intensidade, (b) amplitude, (c) pureza, (d) duração e (e) adequação são “notadamente maiores ou menores”. Se estas propriedades (a, b, c, d, e) forem chamadas de “as dimensões do amor”, estas “dimensões” novamente diferem das dimensões do “peso” ou “energia” da Física, expressas nas fórmulas: (MLT2 e ML2T2). Também não sabemos se a lei da conservação da energia e outros princípios da Física são aplicáveis à energia do amor. O termo “energia” está aqui empregado em seu sentido genérico, como “capacidade de produzir trabalho ou resultado”.

Nos seres humanos esta energia opera produzindo as experiências íntimas variadas e complexas chamadas de empatia, solidariedade, delicadeza, compaixão, admiração, benevolência, respeito, afeto, amizade e amor. No mundo das relações humanas, ela aparece em todas as situações em que uma outra pessoa é tratada como um valor-em-si, não como um meio visando um objetivo qualquer. No plano social o amor atua em todas as interações entre duas ou mais pessoas onde os valiosos anseios e aspirações de uma são compartilhados e incentivados (a se realizarem) por outras. Por conseguinte, todas as atitudes e relacionamentos deste tipo podem ser considerados “operações” da energia do amor em diferentes graus de pureza, intensidade, duração e adequação.

Potencialmente a energia do amor é uma força tremendamente criativa e recreativa. Quando bem conhecida, tratada com respeito e aplicada com sabedoria, ela pode ajudar substancialmente a livrar a humanidade de seus males mais graves: a guerra, o crime, a loucura, a miséria e a perversidade.

Durante estas últimas décadas, a Biologia, a Psicologia, a Sociologia e outros ramos da ciência convergiram firmemente para este ponto de vista. Um conjunto de evidências em vertiginoso crescimento demonstra, primeiro, que a energia do amor é indispensável para a geração, a continuidade e o crescimento das formas vivas, para a sobrevivência e a multiplicação das espécies, e para a manutenção da saúde e da integridade especialmente dos indivíduos humanos. Assim, a Biologia contemporânea informa-nos que, sem um mínimo de cooperação e auxílio mútuo entre os pais e a prole, nem a multiplicação nem a sobrevivência dos organismos uni e pluricelulares é possível. Isto é particularmente real no que diz respeito aos seres humanos. O desamparo do recém-nascido leva-o à morte certa caso não seja cuidado por muitos anos durante sua infância. O papel decisivo do amor heterossexual na procriação e educação dos seres humanos normais precisa apenas ser lembrado para mostrar “as operações” da energia do amor neste assunto vital.

Os fenômenos do suicídio revelam estas “atividades” a sua própria mente. O principal fator do assim chamado suicídio “egoísta” e “anônimo” é a completa solidão de sua vítima, em especial quando for provocada pelo rompimento súbito dos seus laços sociais íntimos. Aqueles que não se sentem amados por alguém e que não amam são os primeiros candidatos à morte. A melhor prevenção para isso, portanto, é libertar-se do aprisionamento da própria “concha”, amando e sendo amado pelos demais.


O poder curativo do amor manifesta-se de muitas outras maneiras. A medicina psicossomática moderna informa-nos que a combinação da carência afetiva e do ódio em demasia na mesma pessoa é amplamente responsável por muitas doenças cardiovasculares, respiratórias, gastrointestinais, endocrinológicas,  geniturinárias e  dermatológicas, e ainda por algumas formas de epilepsia e enxaqueca. John Hunter, um grande cirurgião que sofreu um distúrbio cardíaco, bem sintetizou a sua situação ao declarar que “minha vida está à mercê de qualquer tratante que me deixe zangado”.


A rápida deterioração da saúde dos bebês privados do aconchegante amor materno foi demonstrada de maneira típica, através de um cuidadoso estudo filmado do que aconteceu a eles em um bem organizado lar nova-iorquino de crianças abandonadas. Após três meses separados de suas mães, os enjeitados começaram a perder apetite, ter insônia, e ficaram enrugados, lamurientos e trêmulos. Durante os dois meses seguintes, sua deterioração aumentou. Vinte e sete bebês morreram no primeiro ano; mais sete, no segundo. Vinte e um sobreviveram por mais tempo, mas ficaram tão alterados que, depois disso, só puderam ser classificados como idiotas. Dando-se o amor materno, esses bebês tiveram todo o carinho e a atenção necessários para o seu bem-estar. E, no entanto, a falta do amor autêntico tornou essas condições insuficientes para assegurar a sobrevivência e o crescimento saudável das crianças abandonadas.

A bênção do amor - em ambas as formas de amar e ser amado - é necessária não só à sobrevivência e à saúde física das crianças, mas também ao seu desenvolvimento como cidadãos mental e moralmente sadios. Agora sabemos bem que o bando de delinquentes e psiconeuróticos juvenis é recrutado principalmente nas fileiras das pessoas que, no início da vida, foram desprovidas de um mínimo de amor em suas famílias e em sua “vizinhança hostil”. Por outro lado, os Menonitas, os Hutteritas, os Mórmons e as comunidades dos Amigos dos Estados Unidos não apresentam quaisquer - ou os tem em menor quota - criminosos, doentes mentais, drogados, pervertidos sexuais e libertinos. O principal motivo disso é que essas comunidades fraternas não apenas pregam o amor, como o praticam firmemente não só para com os membros de suas famílias, mas para com todos os membros de sua comunidade e até para com todos os membros da raça humana.


Pitirim A. Sorokin

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