POR QUE É TÃO DIFÍCIL A SOLUÇÃO
DE NOSSOS PROBLEMAS ?
Vocês têm uma terrível preocupação em
resolver problemas, não é verdade? Eu não a tenho. Sinto muito. Logo de
início eu lhes disse que não me interessava resolver problemas, nem
seus, nem meus. Não sou protetor de vocês ou guia. Vocês são o próprio
instrutor e o próprio discípulo. Aqui estão para aprender, e não para
perguntarem a outro o que devem e o que não fazer.
Aqui não há nenhuma
questão, sobre o que se deve fazer por um inválido, ou por alguém que
não tem dinheiro suficiente, ou que é iletrado, etc, etc. Aqui estão
para aprender sobre si mesmos a respeito
dos problemas que possuem, e não para serem instruídos por mim.
Portanto, não me coloquem nessa falsa posição, porque eu não quero lhes
instruir. Se o fizesse, me tornaria um guia, um guru,
e iria aumentar as muitas inutilidades já existentes no mundo com que
se explora o próximo.
Estamos aprendendo não mediante estudo, porém nos mantendo vigilantes, despertos, totalmente conscientes de nós
mesmos; nossa relação, por conseguinte, é completamente diferente da
relação de mestre e discípulo. Este orador não está lhes instruindo, nem
lhes dizendo o que devem fazer — isso seria completa falta de
maturidade.
Não vou lhes dizer o que devem fazer em relação aos seus problemas. Vou lhes apontar como aprender, e o que é aprender;
e verão então que, quando aprendem a respeito de um problema, o
problema termina. Mas se apelam para alguém, lhe pedindo que diga o que
devem fazer a respeito de um problema, vocês se tornam como uma criança
irresponsável, cujos passos são guiados por outro, e terão mais
problemas ainda. Isto é verdadeiro e simples, e, assim sendo, peço-lhes
de uma vez por todas que o acolham na mente e no coração de vocês.
Aqui
estamos para aprender e não para ser instruídos. Ser instruído é
confiar à memória o que se ouve de outro; mas a mera repetição de
memória, não traz a solução de problemas. Só há maturidade no movimento
do aprender. O uso do conhecimento, daquilo que foi aprendido meramente
de memória, como meio de resolver os problemas humanos, procede da falta
de maturidade e só pode criar mais padrões, mais problemas.
O simples desejo de resolver um
problema é uma fuga aos problemas, não acham? Não penetrei o problema,
não o estudei, não o explorei, não o compreendi. Não conheço a beleza,
ou a feiura, ou a profundidade do problema; minha única preocupação é
resolvê-lo, afastá-lo de mim. Esta ansiedade de resolver um problema
sem o ter compreendido, é uma fuga ao problema; por conseguinte,
torna-se mais um problema. Toda fuga gera novos problemas.
Pois bem, tenho um problema que
desejo compreender completamente. Não desejo fugir dele, não desejo
"verbalizar" a respeito dele, não desejo falar para outro sobre ele; só
quero compreendê-lo. Não estou esperando que ninguém me diga o que
fazer. Sei que ninguém pode me dizer o que devo fazer; e que, se alguém o
fizesse e eu aceitasse sua instrução, isso constituiria um ato muito
fútil e absurdo. Assim, tenho de aprender sem ser instruído e
sem fazer uso da lembrança do que aprendi a respeito de anteriores
problemas para atender o problema presente. Oh, não percebem a beleza
disso!
Tenho um problema, e
desejo compreende-lo, aprender a respeito dele. Para aprender a respeito
dele não posso trazer as lembranças do passado e, com ajuda delas,
ocupar-me com o problema; porque o problema novo exige uma maneira nova
de estudá-lo, e não posso aplicar-me a ele com minhas lembranças mortas,
estúpidas. O problema é ativo, e portanto, tenho de ocupar-me dele no presente ativo; por conseguinte, o elemento tempo deve ser afastado totalmente.
Desejo descobrir como surgem os
problemas — os problemas psicológicos. Então se compreendo toda a
estrutura causadora dos problemas e fico, por conseguinte, livre de por
mim mesmo criar problemas, saberei então como agir em relação ao
dinheiro, ao sexo, ao ódio, em relação a tudo na vida; e, no lidar com
essas coisas, não irei criando novos problemas. Tenho assim, de
descobrir de que modo surge o problema psicológico, e não a maneira de
resolvê-lo. Entendem? Ninguém pode me dizer como surge o problema; eu
mesmo devo compreender isso.
Para mim, como disse, a
liberdade é da mais alta importância. Mas a liberdade de modo nenhum
pode ser compreendida, se não há inteligência; e a inteligência só pode
vir quando temos completamente compreendido, por nós mesmos, as
causas dos problemas. A mente deve estar alertada, atenta, num estado
de super sensibilidade, de modo que cada problema seja resolvido assim
que se apresenta para nós. De outro modo, não há verdadeira liberdade;
só há uma liberdade periférica, fragmentária, sem nenhum valor.
Isso é o
mesmo que um homem rico dizer que é livre. Santo Deus! Ele é um escravo
da bebida, do sexo, do conforto, de dúzias de coisas. E o homem pobre
que diz: "Sou livre, porque não tenho dinheiro" — esse tem outros
problemas. A liberdade, pois, é a manutenção dessa liberdade, não pode
ser uma mera abstração: ela deve constituir para vocês, como ente
humano, uma necessidade absoluta, porque só quando existe a liberdade é
que podem amar. Como podem amar se são gananciosos, ambiciosos,
competidores?
Eu não tenho interesse em
resolver o problema ou em procurar alguém que me diga como resolvê-lo.
Nenhum livro, nenhum guia, nenhuma igreja, nenhum sacerdote pode me
dizer. Há milênios que nos entretemos com essas coisas, e continuamos
carregados de problemas. O frequentar uma igreja, a confissão, a oração —
nada disso resolverá nossos problemas, que apenas continuam a se
multiplicar, como atualmente está acontecendo. Assim, pois, como surge
um problema?
Como disse, quando não há
contradição dentro de nós mesmos, não há problema algum. A
auto contradição implica conflito do desejo. Mas o desejo em si nunca é
contraditório. Por certo, o que cria a contradição são os objetos do
desejo. Porque pinto quadros, ou escrevo livros, ou por qualquer coisa
estúpida que faço, desejo ser famoso, aplaudido. Quando ninguém me
reconhece os méritos, há uma contradição e fico em estado lastimoso. Tenho medo da morte, que não compreendi; e nisso a que chamo "amor", há
contradição. Vejo, pois, que o desejo é o começo da contradição — não o
desejo em si, mas os objetos do desejo são contraditórios. Se tento
mudar ou negar os objetos do desejo, dizendo que me aterei a uma só
coisa e a nada mais, essa coisa, por sua vez, se torna também um
problema, porque tenho de resistir, erguer barreiras a tudo o mais.
Assim, o que devo fazer, não é meramente mudar ou reduzir os objetos de
meu desejo, porém compreender o desejo em si.
Krishnamurti
Epicuro nos legou uma citação bem interessante sobre o desejo: " A propósito de cada desejo deve-se colocar a questão: Que vantagem resultará se eu não o satisfizer? " Benjamin Franklin afirma: "Se um homem pudesse ter a metade de seus desejos realizados, teria aflições em dobro". Dalai Lama transcende o desejo mundano quando diz: "A compaixão é um profundo desejo de ver os outros aliviados do sofrimento, o amor é a outra faceta, um forte desejo de ver os outros felizes". "Cuidado com o que você deseja, pode tornar-se realidade". É... às vezes o tiro sai pela culatra... KyraKally
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