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sábado, 23 de abril de 2016

MUTAÇÃO TOTAL, INADIÁVEL, 
DO HOMEM, DA SOCIEDADE
 A revolução deve começar dentro de nós mesmos. 

Parte I

Podemos viver em extrema simplicidade e sensatez, e, consequentemente, em paz. Cada um de nós deve interessar-se com empenho na criação de uma nova sociedade ou uma nova civilização, resguardada das causas que estão destruindo e desintegrando o mundo em que vivemos. Vossa própria transformação é de extrema importância, porquanto vós sois, individualmente, a causa da confusão universal.

Sabeis que o que está acontecendo no mundo é uma projeção do que está sucedendo no interior de cada um de nós, pois o que somos o mundo é.  E é necessário criar um novo mundo que não represente continuação, em forma diferente, desta mesma sociedade corrompida. Considerai, pois, seriamente essas coisas, pois, em virtude dessa consideração, nascerá um extraordinário sentimento de alegria, de felicidade.

Sem regeneração do indivíduo, não pode haver revolução fundamental. Sem uma revolução básica dos valores, não é possível uma ordem verdadeira e duradoura. É nosso empenho promover essa revolução. Uma revolução no pensar e no sentir e, consequentemente, na ação. Essas três coisas não estão separadas, sendo, antes, um processo unitário. São relacionadas entre si e mutuamente dependentes.

Não é de grande relevância compreender cada um a si próprio antes de tudo o mais? Da compreensão e consequente transformação de si próprio resultará inevitavelmente a necessária e vital transformação do Estado e do ambiente. O mundo é a projeção de vós mesmos; vosso problema é o problema do mundo.

O mundo sois vós. Sem a transformação do indivíduo - que sois vós - não há possibilidade de uma revolução radical no mundo. Revolução na ordem social, sem a transformação do indivíduo, só pode conduzir a novos conflitos e desastres.

Interlocutor: Podeis explicar o que a mudança implica?

Krishnamurti: Tenho de ser breve. Em primeiro lugar, observa-se no mundo  uma mudança fantástica. Aí temos a mudança tecnológica. Mas há necessidade de uma revolução psicológica e, por conseguinte, social. Psicologica porque atualmente somos ávidos, invejosos, ansiosos, medrosos, aflitos. Precisamos libertar-nos de tudo isso; necessitamos de liberdade, de uma completa mudança de nosso pensar e de nosso sentir.

Nosso problema principal é este: podemos operar uma mudança imediata em nossa vida, de maneira que cada um possa sair deste salão transformado num ente humano novo, “inocente”, puro, lúcido, incontaminado pelo tempo - não na forma de uma ideia, esperança ou ideologia, porém realmente?

É isso o que está implícito na palavra “mudança”, e não apenas uma revolução econômica, social, que não leva a parte alguma. Já tivemos revoluções, comunistas e outras, e todas estão voltando ao mesmo e velho padrão.

Ora, eu não estou falando a respeito de mudança de padrão, porém  de uma profunda revolução psicológica - e isso significa libertar-se completamente da estrutura psicológica da sociedade. Mudança que se opera dentro do padrão da sociedade é um movimento do “conhecido” para o “conhecido”.

A revolução implica, por certo, num percebimento total de toda a estrutura psicológica do “eu”, consciente e inconsciente, e que se esteja totalmente livre dessa estrutura sem pensar em “tornar-se outra coisa”. Quer estejamos cônscios dela, quer não, a maioria de nós estabeleceu um padrão de pensamento e atividade.

Como estive dizendo, se não há compreensão do inconsciente, toda “mudança” psicológica é simples ajustamento a um padrão estabelecido pelo inconsciente. E a crise atual - não apenas a crise externa, mas também a crise existente na consciência - exige uma revolução.

Não me refiro à revolução social ou econômica, porém à revolução no inconsciente - a completa libertação da estrutura psicológica da sociedade, total abandono da ambição, da inveja, da avidez, do desejo de poder, posição, prestígio, etc. Esta é a única revolução, porquanto, sem ela, nada de novo pode existir.

 A realidade só pode existir quando a mente, que é produto do tempo, deixa de existir; há então o experimentar daquela realidade que não é fictícia, não é auto-hipnose. Só se extingue o processo do pensamento quando compreendeis a vós mesmos. A realidade, portanto, não está distante, a regeneração não depende do tempo. A regeneração, essa revolução interior portadora de esclarecimento, só se concretiza ao perceberdes o que é. Só quando a mente está tranquila, é que vem a regeneração.

A experiência da realidade não é questão de crença; quem crê nela, não a conhece, e quem fala a seu respeito está apenas dizendo palavras. Palavras não são experiências da realidade. A realidade é imensurável, não pode ser ensinada com palavras floridas, assim como a vida não pode ser encerrada dentro das muralhas da posse. Só quando a mente é livre, vem a criação.

Para transformar qualquer coisa, precisais primeiro compreender o que é; só então há possibilidade de renovação, regeneração, transformação. Toda reforma sem compreensão é retrocesso, porque não olhamos de frente o que é; mas se começarmos a compreender exatamente o que é, saberemos, então, como agir. Não podeis agir, sem antes observar, investigar e compreender o que é.

Nosso problema, pois, consiste em libertar a mente dessa atividade egocêntrica, não só no nível das relações sociais, mas também no nível psicológico. É essa atividade do “eu” que está causando malefícios e sofrimentos, tanto em nossas vidas individuais como em nossa existência como grupo e como nação. E só podemos pôr fim a tudo isso, se compreendermos inteiramente o processo do nosso pensar.

Se, ao contrário, estais profundamente interessados no problema da transformação radical, fundamental, reconhecereis, então, diretamente, por vós mesmos, que essa transformação é indispensável para que possa haver paz no mundo, para que não haja mais fome. Para que haja bem-estar universal do homem, faz-se necessária uma transformação, não no nível superficial, porém no centro. O centro é o “eu”, que está sempre acumulando.

Assim, há necessidade de ação completamente dissociada da sociedade, uma maneira de pensar não contaminada pela sociedade, porque só então se tornará possível a verdadeira revolução - que não é revolução superficial, num nível único, econômico, social ou de outra ordem. A revolução total tem de realizar-se no próprio homem, e só então a mente pode resolver os crescentes problemas da sociedade.

Porque as coisas não podem continuar nas condições atuais. Como pode haver ação transformadora, não no correr do tempo, mas já? Porque há tanta miséria, aqui em Bangalore e por todas as partes no mundo; há crises econômicas, há falta de higiene, pobreza, desemprego, lutas comunais, etc., e a constante ameaça de guerra.

Temos de compreender a totalidade dessa questão. Vai ser essa a nossa dificuldade porque todos os problemas humanos estão interligados. Assim, provocar uma completa revolução psicológica parece muito mais importante do que uma revolução de caráter econômico ou social - derrubar determinado sistema, quer neste país, quer na França ou na Índia - porque os problemas são muito mais vastos, muito mais profundos do que apenas tornar-se um ativista, ligar-se a um grupo, ou recolher-se a um mosteiro para meditar, aprender Zen ou Yoga.

Nessas condições, para transformar o mundo que nos circunda, com suas misérias guerras, desemprego, fome, divisões de classes, urge uma transformação em nós mesmos. (Por que não te satisfaz a Vida?)

A revolução deve começar dentro de nós mesmos, mas não de acordo com nenhuma crença ou ideologia. Para se operar uma revolução fundamental dentro em nós, precisamos compreender, integralmente, o processo de nossos pensamentos e sentimentos na vida de relação. É a única solução.


Seleta de Krishnamurti





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