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domingo, 14 de agosto de 2016

VIVENDO NO MUNDO, 
SEM NO ENTANTO, ESTAR NELE


Sabereis que, ao buscar o entendimento, encontra-se a solidão, pois que só podereis conceber a Verdade pelo vosso próprio esforço, liberto de todo desejo pelos opostos. Dessa solidão brota o êxtase natural da solitude, uma solitude na qual não há solidão. Não podereis compreender isto, se meramente o considerardes como teoria, uma hipótese plausível, um festim intelectual.

Pediram-me para explicar mais além com relação ao casamento. Não podeis compreender a Verdade, a plenitude, por meio de qualquer sistema ou circunstância. Se sois ou não casados, não é coisa de fundamental importância, desde que tenhais essa vigilância da mente, essa flexibilidade de razão que a seu tempo conduz à Sabedoria. Não julgueis, que, pelo casamento, ides necessariamente alcançar a plenitude, ou que, por estar sós, compreendereis a Vida. Embora permaneçais solteiros, sereis influenciados pelos vossos amigos, por vossos irmãos e irmãs, pela sociedade, pelos vossos vizinhos, pela opinião pública. Acontece o mesmo com o casamento: sois influenciados pela esposa, pelos filhos e pelas circunstâncias da vida matrimonial. 
 
Não se trata de apegar-se a um sistema ou método para o vosso desenvolvimento. Não importa que sejais casados ou não. O que é de máxima importância é que aprendais o verdadeiro valor de vossos pensamentos, de vossas emoções e opiniões, de vossos conflitos e lutas. Pelo exame continuo e pelo auto rememorar, vos libertareis da consciência limitada. Deveis viver afim de verificar o valor do conflito, e a iluminação é o reconhecimento dos verdadeiros valores. 
 
Se conheceis o verdadeiro valor de vossos pensamentos, vaidades, apegos, ostentações, deles vos libertareis. Ser livre é viver os justos valores na existência de cada dia; e tais valores só podem ser encontrados pelo vosso próprio esforço e entendimento e não seguindo um sistema ou método.

Pergunta: Dizeis que a natureza preenche as suas finalidades no homem... O homem, analogamente, se consuma no homem liberto ou perfeito. Mas, a libertação significa o fim da vida humana; de modo que o objetivo da humanidade é desaparecer. Se todos os homens fossem como vós, seria o fim da humanidade. É assim?

Krishnamurti: Disse que primeiro há a perfeição inconsciente, depois a imperfeição consciente, que é o homem se tornando autoconsciente e conhecendo suas limitações; e depois a libertação da eu-consciência, que é perfeição. A Vida existe em tudo e o homem pode realiza-la plenamente, mas essa realização só é possível pelo conhecimento do conflito, da tristeza e da alegria. Isto não implica o término da humanidade. Porque eu não sou casado e nem tenho filhos, não se segue que não devais vos casar nem ter filhos. Se o vosso desejo é buscar entendimento, não importa que sejais ou não casados. 
 
Algumas pessoas supõem que casar e ter filhos é anti-espiritual. Não creio. Se converteis o casamento ou os filhos no objeto mais importante da vida, sem compreenderdes o valor exato da luta, da posse, da mútua dependência que vos proporciona os justos valores, então não sereis completos em vós mesmos. Podeis não ser casado, e ser egoísta, arrogante, brutal, insensível, desprovido de consideração e afeto. 
 
O que importa não é o modo, o sistema, o método, mas a plenitude que o homem pode alcançar. Tão depressa essa consumação da liberdade da eu-consciência se torna o vosso único desejo, este desejo se converte em vossa própria lei. O vosso desejo se torna a vossa disciplina. Assim, não deis ênfase ao método, ao casamento ou não casamento, a ter filhos e não os ter. São incidentes dos quais tendes que assimilar entendimento; mas é esse entendimento que é de máxima, de final importância.

Todos desejam libertar-se da tristeza e a libertação da tristeza não se consegue movendo-se em determinada direção, por qualquer meio, método ou sistema. Consegue-se por esse intenso desejo de ser completo no presente e pelo julgar, por meio da auto-rememoração, se as vossas ações, pensamentos e sentimentos são oriundos do egoísmo. Direis: “É tudo?” Não é. Isto é apenas o começo. Como disse, dessa auto-rememoração brota a solidão, uma solidão realmente penosa, da qual surge o êxtase da solitude. Mas, não quereis estar só. Tendes medo porque não compreendeis que somente através dessa solitude, por vossa própria energia, vosso próprio esforço, se efetuará a realização dessa plenitude.

Pergunta: Estais de acordo com a velha ideia religiosa de que o asceta é realmente um mais perfeito tipo de humanidade do que o homem que casa e tem família?

Krishnamurti: Não concordo. Compreende-se ordinariamente o asceta como um homem que foge do mundo, que vive no mundo sem o compreender e, assim, não há renúncia. Quando há entendimento, não há renúncia. Tendes adorado a renúncia, não o entendimento. Olhais como um grande homem, aquele que dá mil libras por caridade, porque vós próprios estais enredados nos laços do desejo de posse. O homem que conseguiu, pelo sofrimento, pelos conflitos, pela auto-rememoração, esse êxtase interno da solitude; que não depende de coisas externas para sua felicidade; que se libertou da eu-consciência, tal homem pode ser asceta ou casado. Ele pode viver no mundo e no entanto não estar nele. Mas, para conseguir isto, deveis estar perfeitamente livres de desejos íntimos e libertos da ilusão da individualidade, que gera sutis decepções.

Assim, pois, não é uma questão de afastamento do mundo ou de tornar-se asceta, mas uma questão de compreensão da plenitude interna, de percepção íntima da Verdade que vos liberta de todo conflito, esse silêncio interno que sempre se renova.           

 
 
Krishnamurti
 
 
 
 
 
Somos, na grande maioria, tão compulsivos que não conseguimos conter ou resistir a identificação com os atrativos que o mundo nos oferece; por isso ainda vivemos nessa agitação indefinida - falamos por falar, comemos por comer, viciamo-nos por prazer e muito mais... A solidão é uma doença contagiosa; a maioria prefere agitar-se em grupos, não importa como e, nesse farfalhar, comprometemo-nos  amargamente com a percepção meramente externa; afastando-nos "da plenitude interna, de percepção íntima da Verdade que vos liberta de todo conflito, esse silêncio interno que sempre se renova".  Precisamos urgentemente refletir sobre as nossas atitudes, antes que as consequências sejam extremamente desastrosas. KyraKally

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