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quarta-feira, 31 de agosto de 2016

O DESEJO FAZ DE VÓS 
CAÇADORES DE INFINITAS ILUSÕES


Pergunta: Este sentimento, esta concentração da Vida, a qual vos referis, é uma coisa cósmica?

Krishnamurti: Sinto-me feliz por haverdes feito a pergunta; vou tentar explicar-vos. Isto é o mesmo que se esforçar por compreender o que está para além daquelas montanhas antes de haver deixado o vale. Vós estais vos esforçando por imaginar o que seja isso. Dizeis que é a consciência universal, que é Deus, que é Vida, que é o cosmos, que é isto, que é aquilo. Quereis que se vos faça uma descrição do que é isso, porém, o que é passível de descrição, já não é a Verdade. Ao passo que, se começásseis por averiguar a causa desta recorrente resistência e buscásseis vos libertar dessa escravidão, então teria lugar a realização dessa concentração, que é o êxtase da Vida. Este fluxo de pensamento reside no presente, não no futuro ou nem em outro mundo qualquer. Pretendeis averiguar o que seja a Vida, se ela é consciência cósmica, se nela há justiça, igualdade, se é unidade, se é toda integrativa, afim de adestrardes vossa mente de acordo com essa concepção, e vos poderdes tornar semelhantes a ela. Ora, isso nada mais seria que vossa própria glorificação individual, ao passo que eu vos venho falar da completa liberdade do eu-consciência.

Quando começais a pensar por vós mesmos? Quando vossos esforços se frustram; é então que, ao ficar embaraçados, vos apercebeis de vós próprios. Desse embaraço provém a divisão, que é a causa da resistência e, para vencê-la, a vós mesmos disciplinais. As ideias têm que desaparecer integralmente antes que possais chegar a discernir. Se não poderdes discernir livremente, sereis incapazes de compreender. Para a percepção, deve a mente estar despida de preconceitos; e uma das coisas mais difíceis de se levar a efeito é tornar a mente delicada, plástica, de modo que discirna instantaneamente, sendo esse discernimento, intuição.

O que é que em vós cria as ideias? O desejo. Percebeis um objeto, um escopo, uma finalidade, e então, formulais as ideias de consecução. Ouvis, por exemplo, referência à respeito do homem perfeito, e dizeis a vós mesmos: “preciso tornar-me semelhante a ele”. Esta ideia amolda vossa vida, por ela ficais escravizados e vosso desejo apenas se tornou mais sutil, não estais libertando a vossa mente das causas da limitação, que é esse mesmo desejo, mas apenas a transportais do egoísmo humano vulgar para o auto-interesse refinado, “espiritual”, que é a expansão do vosso ego. A este processo de auto-expansão denominais progresso espiritual. Gradualmente, ides abandonando o objeto de vosso desejo. Dizeis a vós mesmos: Só existe o eu. Eu próprio sou todo o universo, sou Deus”. O objeto de vossa inspiração, o vosso molde, perde para vós, seu significado, porém é ele exatamente o mesmo desejo que em vós criou a nova e gloriosa ideia de que sois o universo.

Ainda que chegueis a pensar que sois o universo, que sois seres cósmicos em vossa consciência, nem por isso deixais de ser cativos pelo vosso desejo, com todas as lutas e limitações que lhe são inerentes. Assim, sois forçados a buscar uma nova explicação, ao passo que ides retendo todas as ilusões que hão envolvido por meio de vosso desejo. Agora, dizeis a vós mesmos, “Dado existir a suprema justiça, a lei universal, o amor de Deus, aceitarei as coisas tais quais elas são”. A vós próprios colocais num estado de resignação, que nada mais é que uma forma nova de ilusão. Desta, brota uma sensação de conforto, nascida deste mesmo desejo pelo eu.

Dentro de todos estes círculos de ilusão é que passais vossos dias. Permaneceis num deles, imaginando haver atingido o ultérrimo, até que o vosso desejo vos arrasta para outro círculo. Ides criando ilusão após ilusão, oscilando de uma para a outra, sempre escravizados às sutis exigências do desejo. E, por essa maneira julgais ir evoluindo através da infinidade dos tempos. Vossa mente proporciona-vos a satisfação da diferenciação, à medida que ides vagueando por entre essas ilusões, pois que pensais estar continuamente abandonando um estado inferior de consciência para atingir outro que é superior. Ides simplesmente, por esse modo, criando cada vez maiores distinções,  ocasionando por essa maneira, uma separação e uma resistência infindáveis. A unidade nada mais é que a uniformidade, pois que por ela vos tornais o molde em que os outros são vazados. Enquanto houver resistência, haverá eu-consciência, desejo, não importando até que ponto seja glorificada essa ilusão de expansão, sem consideração pelo âmbito que abrange o círculo dessa auto-identificação.

Para mim, existe somente uma verdade, — a libertação do desejo, da eu-consciência; aí não existe distinção de dualidade. Tudo mais não passa de ilusão, infinita em sua variedade, gloria e distinção. O santo, o pecador, o escravo, o conquistador, o homem virtuoso que atingiu a consecução espiritual — todos se assemelham em sua ilusão, que estiverem enraizados no desejo. Um tempo vasto e um vasto espaço podem separar um do outro, porém o santo que evoluiu longe do pecador, somente progrediu da ilusão do inferior para a ilusão do superior.

Se considerardes que todas as ideias, todos os cativeiros são criados pelo desejo, pela eu-consciência, e se puderdes libertar a vossa mente do desejo, então não mais necessitais de passar por todas essas ilusões de ideias. Para vos libertar do desejo tendes que estar vigilantes, incessantemente alertas, jamais ociosos. É isso o verdadeiro esforço. Não há coisa que se pareça com finalidade. O que é final, o que pode ser alcançado, já está morto; portanto, na consecução, a vossa mente cava o seu próprio túmulo. Quando não mais subordinardes vosso pensamento a imagens, a ideias, porém de contínuo vos esforçardes por libertar a mente de toda a escravidão, dar-se-á o renovação da Vida, o que é perdurável.  


Krishnamurti
 
 
 
"O ego é a pessoa que consideramos ser. Na realidade, o ego é um conjunto de pensamentos, sentimentos, imagens, memórias, hábitos conscientes e inconscientes, incluindo a experiência física, emocional e mental, iluminado pela consciência.

Quando o ego se considera a pessoa real, temos então o problema que Paul Brunton chama de egoísmo. O egoísmo é o pensamento firmemente mantido do eu pessoal como o ser real, e a resultante separação entre o ego e o Eu Superior. Esta confusão de identidade não é apenas um problema de pensamento, é um profundo hábito mental mantido emocionalmente.

Pensamentos e ações repetidos tornam-se tendências, tendências tornam-se hábitos e o hábito molda a nossa experiência do mundo. Durante um longo período de tempo, os hábitos e o resíduo emocional da atividade do ego se tornam muito fortes. As energias do hábito estão abaixo do pensamento, da vontade e do sentimento conscientes".

Precisamos identificar esse criador de desejos - o ego - que nos acompanha há incontáveis encarnações. KyraKally

 

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