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domingo, 21 de agosto de 2016

NÃO BUSQUEIS CONSOLO
 EM MOMENTOS DE IMENSA TRISTEZA


Pergunta: Falais dos desejos de posse inerentes ao selvagem e do desejo que o homem culto tem pela liberdade e dizeis que entre os dois extremos estão todos os graus da evolução. Um estudante escreve a respeito de vossos ensinos dizendo que a Verdade está por toda a parte e é isenta do tempo. Em face desta concepção, nossas ideias de evolução e de desenvolvimento são varridas. Podeis explicar-nos um pouco mais este paradoxo?

Krishnamurti: Em tudo e em todos os homens existe a totalidade, a vida como um todo completo. Isto é para a mim a Verdade. Esta completude não pode progredir. É somente o incompleto que progredi. Porém, esta aquisição de qualidades, de atributos, de virtudes, não conduz à Realidade, pois a Realidade sempre está presente, plena em tudo. Por completude entendo eu o libertar-se da consciência da individualidade. Essa completude que existe em tudo que não pode progredir: ela é absoluta. É fútil o esforço para as aquisições; se, porém, puderdes perceber que a Verdade, a Felicidade existe em tudo e que a realização da Verdade somente se consegue pela eliminação, então manifestar-se-á o entendimento que é isento de tempo. Isto não é negação. A maioria das pessoas se aflige por serem como nada. Chama ser positivo quando fazem esforço e denominam esse esforço virtude. Ora, desde que haja esforço, já não há virtude. A virtude é isenta de esforço. Quando fordes como nada, então sereis tudo, não por vos engrandecerdes, não pode dar importância ao “Eu”, à personalidade, porém, pelo apagamento contínuo dessa consciência que cria força, a cobiça, a inveja, os cuidados da posse, a vaidade, o temor e a paixão. Por estardes de contínuo auto-recolhidos, vireis a tornar-vos plenamente conscientes e é então que libertareis a mente e o coração e conhecereis a harmonia que é o ser completo.

 
Pergunta: Haveis dito que uma das maneiras de alcançar o puro afeto, mediante o qual se pode aprender rapidamente através da experiência dos outros, é a aceitação da dor. Podereis, por favor, dizer-nos algo mais a cerca disto?

Krishnamurti: Encarais a alegria e a tristeza como sendo coisas diferentes. Dais particular importância a alegria porque ela vos deleita e evitais a tristeza porque vos desagrada. Porém o homem, que busca a Verdade, equilibra-se entre as duas; não pede a alegria nem evita a tristeza. A tristeza existe enquanto houver a consciência da individualidade; isto é, enquanto houver pensamento do “tu” e do “eu” e do “meu”. Por amoldar este instinto à razão, mediante a autodisciplina, é que essa consciência que cria a tristeza é transcendida.

 
Pergunta: Dizeis que a evolução, como processo de realizar a Verdade é falsa e irreal. Não haveis vós, porém, chegado à realização da Verdade por um processo de desenvolvimento, de entendimento e experiência cada vez maiores e não será isto evolução?

Krishnamurti: Por meio do acumulo de experiências é como pensais realizar a Verdade. Uma experiência criada em vossa mente, seja um grande amor, seja o desejo de compreensão, que abale as próprias bases de vossa consciência individual, é verdadeira experiência. Uma experiência assim contém o inteiro significado da vida. Uma experiência de amor ou de morte contém o conjunto da vida; porém, para compreender o pleno significado dessa experiência, tendes que estar concentrados em auto-recolhimento.

Tomai como exemplo a experiência do amor. Nesta existe o desejo de possuir, existe a inveja, o ciúme, a solidão, e também a alegria da união. Por estar concentrado, observando de contínuo, refletindo, é que podeis realizar o pleno significado dessa única experiência particular, e por esta, tereis compreendido o conjunto de toda a experiência.

Ou então tomai a morte como ponto de comparação. Na morte há tristeza, há dor, há solidão aflitiva, há o desejo de ter simpatia e amor. É esta uma das mais comuns experiências da vida. Todos a realizam. Em lugar de colher o significado dela, a plena lição que ela tem para vos dar, buscais o consolo. Buscais os guias para o plano astral, desejais estar ali juntos, com os seres amados. Tendes esperança do seu renascimento. Tudo isto não é mais que o adiamento de vossos esforços no sentido de libertar o eu-consciência. A batalha para ajustar a solidão e o amor não se ganha por nos lançarmos para o além, para outros reinos e sim pelo constante apercebimento de si próprio.

Assim, pois, uma experiência pode abrir-vos o pleno significado da completude.

Isto não é um mero raciocínio intelectual. Falo de experiências pessoais. Quando estais prisioneiros de uma grande tristeza, solitários em virtude da morte de alguém, não vos satisfazeis com os consolos transitórios, sejam eles para o futuro ou pertençam ao passado; quereis encontrar a solução imediata desse isolamento e por esse modo vencer a tristeza.

Para vencer a tristeza tendes que realizar a completude interior do ser, por estar em reflexão durante o dia inteiro e não pelo sentimentalismo nem por rechaçar todas aquelas coisas que vos causam temor para o fundo de vós mesmos. Esta completude que existe em todas as coisas torna-se então real e nela somente é que existe a felicidade, não nos prazeres transitórios.

 
Krishnamurti
 
 
 
 
 
"Não há despertar de consciência sem dor. As pessoas farão de tudo, chegando aos limites do absurdo para evitar enfrentar a sua própria alma. Ninguém se torna iluminado por imaginar figuras de luz, mas sim por tornar consciente a escuridão". (Carl Jung)


 

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