A VERDADE NÃO SE APRESENTA
À MENTE SUPERFICIAL
Pergunta: Há muitos anos o ouvimos. Entretanto,
continuamos abjetos,
ignóbeis, rancorosos.
Não raro nos sentimos como que abandonados por
você.
Sabemos que não nos quer para discípulos,
mas há necessidade de se
eximir completamente
da vossa responsabilidade perante nós?
Não deve
nos dar a mão, nos guiar?
Krishnamurti: Senhores, eis uma maneira indireta de perguntar: "Por que
você não quer ser nosso guru?" Ora, Senhores, o problema nada
tem a ver com abandoná-los ou dar-lhes a mão, porque presume-se que somos pessoas adultas.
Pelo menos fisicamente já somos adultos; mentalmente, somos crianças de
catorze e quinze anos; e queremos um ente glorificado, um Salvador, um guru,
um Mestre, que venha nos tirar de nossa desgraça, de nossa confusão;
que nos explique o presente estado de caos; que "explique", e não que
produza uma revolução em nosso pensar; e isso basta para nós.
Fazem esta pergunta com o desejo de encontrar uma saída desta confusão;
com o desejo de se libertarem do temor, do ódio, de toda mesquinhez da
vida e contam com a ajuda de alguém a esse respeito. Ou talvez, outros
gurus não conseguiram fazer com que adormecessem com uma dose de
ópio, com uma explicação; por isso se voltam para outra pessoa,
dizendo: "por favor, nos guie". É este o problema para vocês — a
substituição de um antigo guru por um novo, de um antigo mestre
por um novo, de um antigo líder por um novo? Tenham a bondade de ouvir
com toda a atenção. Pode alguém conduzi-los à Verdade, ao descobrimento
da Verdade? É possível o descobrimento, quando somos levados à fazê-lo?
Se forem conduzidos à Verdade, vocês a descobriram, vocês a
experimentaram? Pode alguém — seja qual for essa pessoa — conduzi-los à
Verdade? Quando dizem que precisam seguir alguém, não implica isso em
que a Verdade é uma coisa estacionária, que a Verdade está em algum
lugar, para serem conduzidos até lá, olhá-la, e levá-la?
A Verdade é algo que tem de ser descoberto ou algo a que somos
conduzidos? Se é algo a que somos conduzidos, então o problema se torna
muito simples: tratarão de encontrar o guru ou guia que mais lhe
agrade, e ele os levará onde a Verdade está. Mas, por certo, a Verdade
que buscam se acha acima do plano das explicações; ela não é estática,
tem de ser experimentada; tem de ser descoberta; e não pode ser
experimentada por intermédio de um guia. Como posso experimentar
espontaneamente uma coisa original, se me dizem "olhe aqui uma coisa
original — experimente-a!" O ódio, a vileza, a ambição, a frivolidade,
são os problemas de vocês, e não o descobrimento da Verdade. Não podem
achar o que é a Verdade com uma mente frívola. Uma mente superficial,
maledicente, estúpida, ambiciosa — jamais descobrirá o que é a Verdade.
Uma mente frívola não pode criar senão uma coisa frívola; não pode criar
senão um Deus frívolo. Nosso problema, por conseguinte, não é o de
achar ou descobrir o que é Deus, mas o de percebermos como somos
frívolos.
Veja, Senhor, se sei que sou frívolo, que estou desgraçado, que sou
infeliz, posso então fazer alguma coisa. Entretanto, se sou frívolo e
digo "não devo ser frívolo, quer ser um homem superior", nesse caso
estou fugindo, e isso é frivolidade. Compreenda isso, por favor. O importante é descobrir-se e compreender-se o que é, e não
transformá-lo noutra coisa final. Afinal, uma mente estúpida, mesmo
quando procura se tornar muito sagaz, muito penetrante e inteligente,
continua estúpida do mesmo modo, porque sua essência mesma é a
estupidez. Não gostamos de escutar. Queremos alguém que nos converta a frivolidade numa coisa superior e nunca aceitamos, jamais o que é, na sua realidade. O descobrimento do que é,
da realidade, é importante; é a única coisa verdadeiramente importante.
Em qualquer nível que seja — econômico, social, religioso, político,
psicológico — o que mais deve interessar é o descobrimento do que é, no seu aspecto exato — e não o que deveria ser.
Prestem atenção. Esta pergunta suscita várias questões. O interrogante
deseja alguém, para ajudá-lo a se libertar das complicações de sua vida;
está, portanto, à procura de um guia. O guia que ele busca é produto da
sua confusão, da sua atribulada condição; e por isso o guia é também
confuso. Senhor, não sabem o que ocorre pelo mundo? Um homem que se vê
confuso, no meio de tanta agitação; aparece um líder político; o homem
vota nele, por causa da confusão em que se acha; e criou, dessa maneira,
um político também confuso, que se torna seu líder, seu guia. Assim
também o guru, ou o mentor, ou o guia que escolhem; o escolhem
por causa da confusão de vocês, por causa de seus desejos de satisfação e
segurança; consequentemente, "projetam" o desejo de vocês, e o guru,
portanto, é criação de vocês. Ele vai lhes dar satisfação e por isso
aceitam o que ele oferece — o que denota que nunca enfrentam o que é, o que existe em si mesmos, o que realmente são. É só quando a mente de vocês não está fugindo, evitando o que é,
perseguindo um ideal — quando a mente não diz "não deve ser assim",
dever "ser assim", etc., é só então que se pode descobrir a maneira de
agir com relação ao que é.
Então, o problema será resolvido. Só
resolverão o problema quando, na realidade, descobrirem o que é o "eu".
Se sabem que são frívolos, que possuem uma mente superficial, que odeiam
seus semelhantes; se percebem bem esse fato, sabem então agir com
relação a ele. Podemos examinar a questão de como agir em relação ao
fato. Se afirmam, porém, "não devo odiar, devo amar", nesse caso estão penetrando num mundo ideológico — o que representa a maneira mais estúpida de fugir ao que é.
Esta pergunta denuncia a falta de interesse em compreender a verdade
relativa aos nossos problemas. Só a Verdade pode nos libertar. A
compreensão apenas pode vir quando não estamos seguindo alguém, quando
não existe autoridade de espécie alguma — se a autoridade da tradição,
seja a autoridade dos livros, do guru, da nossa própria existência. Nossa experiência é resultado de nosso condicionamento, e tal experiência não pode nos ajudar a descobrir o que é a Verdade.
Nessas condições, os que se sentem seriamente interessados, os que
desejam de fato descobrir a Verdade relativa aos seus problemas, devem,
naturalmente, colocar à margem, tudo quanto é autoridade. Isto é
dificílimo, porque quase todos nós estamos cheios de temor.
Precisamos de alguém para nos escorar, para nos dar coragem; precisamos
do "irmão mais forte" — aquele que mora na Rússia, ou na Inglaterra, ou
na América, ou do outro lado do Himalaia, ou "ali na esquina". Todos
precisamos de alguém para ajudar. Enquanto estivermos encostados em
alguém, nunca chegaremos a compreender o "processo" do nosso pensar;
negaremos assim, a nós mesmos, o descobrimento da Verdade.
Escutem o que estou dizendo; não o rejeitem, pois ainda não resolveram o problema de vocês e ainda são tão infelizes como antes. Enquanto estiverem seguindo um guru ou
seus líderes políticos, estarão confusos. Há uma única maneira de
resolver este problema, que é pela compreensão de si mesmos, nas suas
relações, de momento em momento, de dia em dia: os antagonismos, os
ódios, as paixões, o amor efêmero etc. estão embaraçados no problema, e só o resolverão quando o aceitarem, quando o virem tal qual é.
Só depois de o resolverem, terão a possibilidade de libertar do
condicionamento a mente de vocês, deixando assim a Verdade reinar.
Jiddu Krishnamurti
Eckhart Toole nos adverte: "Se nos identificamos com a mente criamos uma tela opaca de conceitos, rótulos, imagens, palavras, julgamentos e definições que bloqueia todas as relações verdadeiras. Existe
uma vasta área de inteligência além do pensamento, este é apenas um
aspecto diminuto da inteligência. Percebemos que todas as coisas
realmente importantes como a beleza, o amor, a criatividade, a alegria e
a paz interior surgem de um ponto além da mente. É quando começamos a acordar." Krishnamurti está inteiramente correto: "É
essa atividade do “eu” que está causando males e sofrimentos, tanto em
nossas vidas individuais como em nossa existência como grupo e como
nação. E só podemos pôr fim a tudo isso se compreendermos inteiramente
os processos de nossa mente." Quando Leonardo da Vinci diz que "aprender é a única coisa de que a mente nunca se cansa, nunca tem medo e nunca se arrepende"; entendo que ela é apenas um meio para um fim maior, uma ferramenta de grande importância para nos movimentarmos através do mundo material, apenas isso; precisamos ir mais e mais longe, penetrar as dimensões do amor, da beleza, da criatividade, da alegria... para tanto urge prosseguirmos adiante, além da mente... é uma viagem solitária que ninguém pode realizar por nós... KyraKally
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