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sexta-feira, 29 de junho de 2018

SOBRE A DISCIPLINA


Disciplina é uma bela palavra, mas assim como no passado foram todas as belas palavras, ela tem sido mal empregada. A palavra disciplina tem a mesma raiz da palavra discípulo - o significado da raiz é “processo de aprendizagem”. Aquele que se mostra disposto a aprender é um discípulo, e a atitude de estar disposto a aprender é disciplina.
 
A pessoa douta nunca está disposta a aprender, pois acha que já sabe muito; ela se mantém muito centrada no que chama de conhecimento. Seu conhecimento não é nada senão alimento para o ego. Ela não é capaz de ser um discípulo, de se manter sob verdadeira disciplina.

Sócrates disse: “Só sei que nada sei” — esse é o princípio da disciplina. Quando você não sabe nada, claro, claro que lhe sobrevém o desejo intenso de inquirir, explorar, investigar. E, assim que começa a aprender, surge inevitavelmente outro fator: qualquer coisa que você tenha aprendido tem que ser abandonada sempre; caso contrário, ela se tornará conhecimento, e conhecimento impede a aprendizagem de outras coisas.

O homem realmente disciplinado jamais se prende a nada; a cada momento, ele morre para qualquer coisa que tenha vindo a saber e volta a ser ignorante. Essa ignorância é verdadeiramente luminosa.

Concordo com Dionísio quando ele afirma que a ignorância é luminosa. Uma das experiências mais belas da existência é estar num estado de luminosa ignorância. Quando está nesse estado de luminosa ignorância, você está aberto, não há barreira em seu ser, você está disposto a investigar.

A disciplina tem sido mal interpretada. As pessoas têm dito às outras que disciplinem sua vida, que façam isso, que não façam aquilo. Têm sido imposto ao homem milhares de deves e não deves. E, quando o homem vive com inúmeros deves e não deves, ele não consegue ser criativo. Ele se torna prisioneiro; em toda parte se deparará com uma barreira.

A pessoa criativa tem que eliminar todos os deves e não deves. Ela precisa de liberdade e de espaço, muito espaço; ela precisa do céu inteiro e de todas as estrelas que existem nele. Só assim sua espontaneidade pode começar a florescer.

Portanto, lembre-se: minha ideia de disciplina não envolve nenhum dos dez mandamentos; não estou impondo-lhes nenhum tipo de disciplina; estou simplesmente tentando fazê-lo discernir a ideia de como continuar a aprender e jamais arvorar-se em douto.

Sua disciplina tem que vir de seu próprio coração; ela tem que ser inteiramente sua - e há uma grande diferença nisso. Quando alguém lhe impõe algum tipo de disciplina, talvez ela jamais lhe sirva; será como vestir as roupas de outrem. Ou elas ficarão grandes demais ou muito apertadas, e você sempre se sentirá um tanto idiota nelas.

Maomé legou um corpo de disciplina aos muçulmanos; talvez isso tenha sido bom para ele, mas não pode ser bom para todos. Buda legou um corpo de disciplina a milhões de budistas; talvez isso tenha sido bom para ele, mas não pode ser bom para todos.

A disciplina é um fenômeno que se dá no âmbito da individualidade; toda vez que você a adota de outrem, começa a viver de acordo com princípios pré estabelecidos, preceitos mortos. E a vida jamais é morte; a vida é transformação incessante. A vida é movimento.

Heráclito está certo: você não pode entrar no mesmo rio duas vezes. Aliás, gostaria de dizer-lhe que você não pode entrar no mesmo rio uma única vez sequer, pois ele se move muito rapidamente! A pessoa tem que estar atenta a cada situação e suas nuanças, observando-a e, é necessário que a pessoa reaja à situação de acordo com o momento, e não conforme algum tipo de respostas prontas, fornecidas por outrem.

Você percebe a estupidez da humanidade? Há cinco mil anos, Manu transmitiu um corpo de disciplina aos hindus e até hoje eles o seguem. Três mil anos atrás Moisés deixou um corpo de disciplina aos judeus e ainda hoje eles o seguem. Há cinco mil anos, Rsabhanatha transmitiu seu corpo de disciplina aos jainistas e eles ainda o seguem.

O mundo está sendo levado à loucura com essas doutrinas! Elas são ultrapassadas; elas deveriam ter sido enterradas há muito, muito tempo. Vocês estão carregando defuntos nas costas e esses defuntos fedem. E quando você vive cercado por defuntos, que tipo de vida você pode levar?

Eu lhes ensino o momento, a liberdade do momento e a responsabilidade do momento. Algo pode ser correto neste momento e pode tornar-se errado no momento seguinte.

Não tente ser imutável, pois você estará morto. Só os mortos são imutáveis. Procure estar vivo com todas as suas inconstâncias e viva cada momento sem nenhuma ligação com o passado nem com o futuro. Viva o momento e suas reações serão plenas.

Essa plenitude é sublime, essa plenitude é criatividade. Com isso tudo que você fizer terá beleza própria.

 
Osho, em Criatividade : Libertando Sua Força Interior 
http://www.marcelodalla.com 


Tudo o que foi dito pelos grandes sábios foi destinado a orientar quem os acompanhou naquela época, para os episódios que estavam se desenrolando naquele tempo... Entretanto, alguns ensinamentos excederam a barreira do tempo e continuam a iluminar o caminho daqueles que se desapegam das palavras e detém-se no conteúdo das mensagens... O que foi dito foi para abrir 'fronteiras'... Quantos de nós ainda precisam dessas instruções, não como doutrina, mas como orientação, pois até agora não ultrapassamos essa ponte...


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