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domingo, 14 de janeiro de 2018

VÓS SOIS A LUZ DO MUNDO


Segunda Parte

Em suas relações com Deus é todo homem profundamente só e solitário; ninguém o pode acompanhar a essas alturas e profundezas, envoltas em eterno silêncio. Ninguém poderá saber jamais o que se passou entre a alma e Deus, nas silenciosas alturas do Himalaia ou na taciturna vastidão do Saara onde se dá esse encontro entre Deus e a alma humana. A experiência mística se dá para além das barreiras do tempo e do espaço, no anonimato do “terceiro céu”, e por isso é essencialmente intransferível e incomunicável; o que é dito à alma, nessa luminosa escuridão, são “ditos indizíveis”.
 
Essa solidão vertical é necessária e não pode jamais ser substituída pela sociedade horizontal. Esse santuário íntimo do homem é indevassável; nem as relações mais íntimas, de pai a filho, de mãe e filha, de esposo a esposa, de amigo a amigo, podem desvendar esse mistério. Onde não existe e persiste essa solidão cósmica, esse profundo silêncio metafísico, esse indevassável anonimato místico entre a alma e Deus, toda a publicidade é um perigo e uma profanação, é uma apostasia e uma infidelidade cometida contra a sacralidade do Eu divino. O homem que não possua suficiente fidelidade ao seu Eu divino não deve arriscar-se à publicidade; não deve colocar-se no alto do candelabro ou no cume do monte; é preferível que fique debaixo do alqueire ou no fundo do vale, onde não há perigo de quedas catastróficas.
 
Quanto mais alto o homem está, mais profundamente poderá cair, se essa altura lhe der vertigens.  O perigo da vertigem vem da ilusão de que essa sublime posição seja obra do seu ego personal, vem do erro fatal de que a pessoa humana tenha criado essa glória no alto do candelabro ou no cume do monte.
 
Duas vezes, diz um grande iniciado oriental, Brahman se sorri do homem, da primeira vez quando o homem afirma: “Eu faço isto, eu faço aquilo”, e da segunda vez quando o homem diz: “Eu vou morrer.
 
Ambas às vezes o homem confunde o seu verdadeiro Eu com o seu pseudo-eu. Quando o homem pensa que é ele — seu ego personal — que fez isto ou aquilo, e não o “pai dos céus” — o seu Eu divino; quando o homem pensa que o seu eterno e imortal Eu divino vai morrer — então se revela totalmente analfabeto no conhecimento de si mesmo.
 
Onde há ilusão há possibilidade de queda. Só quando a totalidade da ilusão cedeu à totalidade da verdade é que há segurança absoluta.
 
Tem-se dito que a experiência mística torna o homem orgulhoso e desprezador de seus semelhantes, os “profanos” lá embaixo. Quem assim pensa e fala não sabe o que quer dizer experiência mística. Esse orgulho é possível no caso da pseudo-mística, quando o homem atribui a sua espiritualidade ao mérito de seu ego personal, ignorando que “todo o dom perfeito vem de cima, do Pai das luzes”, e que a iluminação espiritual é obra da graça divina. Mas, ninguém pode orgulhar-se daquilo que é de Deus, só se pode envaidecer de algo que seja do seu ego.
 
Um jovem ocultista britânico perguntou a um grande místico da Índia se achava que ele, o ocultista, poderia, um dia, chegar a fazer as “obras de poder”, chamadas “milagres”, que Jesus fazia; ao que o iniciado lhe respondeu calmamente: “Pode, sim, contanto que você não creia que é você que fez essas obras.”
 
Quem atribui a seu pequeno ego humano qualquer obra espiritual está no erro; o erro gera o orgulho, e o orgulho prepara a queda. Mas quem compreendeu definitivamente que nenhum efeito espiritual pode provir de uma causa material ou mental, esse está na verdade, e a verdade o libertará de qualquer ilusão e perigo de queda.
 
Quando Jesus diz a seus discípulos que devem colocar a sua luz no candelabro ou no alto do monte supõe ele que esses homens possam ultrapassar o estágio da Ilusão sobre si mesmos e adquirir plena clareza e certeza sobre a causa real de todos os efeitos espirituais.
 
Neste sentido, acrescenta ele: “assim brilhe a Vossa luz perante os homens para que vejam as Vossas boas obras e glorifiquem a VOSSO Pai que está nos céus” — que vejam os efeitos visíveis e glorifiquem a causa invisível O ego humano, sendo apenas uma função do Eu divino, nada fez por si mesmo, assim Como uma ferramenta não produz nada se não for usada pelo homem.
 
Não existe, no mundo físico, nenhum elemento incontaminável exceto a luz. Todas as outras coisas aceitam impureza. Quando, por exemplo, lavamos com água pura um objeto impuro, a água se torna impura na mesma razão em que purifica o objeto impuro; não pode neutralizar senão apenas transferir para si as impurezas do Outro. A água é sumamente contaminável, ou “vulnerável” Só a luz é incontaminável invulnerável; pode penetrar em todas as impurezas do mundo sem se tornar impura.
É esta, sem dúvida a mais pura glória do homem crístíco, poder ser puro no meio dos impuros e das impurezas em derredor; purificar as impurezas sem se contaminar com essas impurezas É o máximo de invulnerabilidade.
 
Essa invulnerabilidade interior é pureza, pureza de coração.  Essa pureza da invulnerabilidade nasce unicamente da experiência clara e nítida da verdadeira natureza humana, que é essencialmente divina, e, como Deus é puro e invulnerável, deve também a essência divina do homem participar dessa pureza e invulnerabilidade.
 
A impureza consiste na ilusão de que o pequeno ego humano realize coisas espirituais e possa produzir a redenção do homem, como pensava aquele ego luciférico que tentou ao Cristo, no deserto. Egoísmo é impureza, e tanto mais vulnerável é o homem quanto mais impuro, e tanto menos vulnerável quanto mais puro de coração. Essa pureza do coração nasce do conhecimento da verdade, ao passo que a impureza nasce da ilusão.
 
Nenhum homem purificado pelo conhecimento da verdade sobre si mesmo se orgulha da sua espiritualidade, mas agradece humildemente a Deus por essa dádiva, porque sabe que não foi ele, seu ego físico-mental, que produziu esse efeito, mas que foi a graça de Deus. Nenhum homem purificado pelo conhecimento da verdade sobre si mesmo não se sente ofendido por atos, palavras ou opiniões injustas dos outros, porque sabe que essas ofensas não atingem o seu verdadeiro Eu divino, senão apenas o seu falso eu humano. Sabe que nenhum mal que outros lhe fazem lhe faz mal, porque não o faz mau.
 
 

Huberto Rohden 

http://antonioramosalves.blogspot.com.br 

 

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