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sexta-feira, 26 de janeiro de 2018

O PODER DO AGORA



Obedece a vida a uma lei qualquer? A vida que é absolutamente livre e incondicionada, não possui lei em si mesma. Na manifestação, que pode ser chamada a expressão da vida, deve existir lei, porem não pode existir lei nenhuma para aquilo que a si mesmo se manifesta, que a si mesmo se expressa.

E, assim como toda a lei é imitação, sustento que a vida em liberdade, que é espiritualidade em consumação, está por cima de qualquer limitação. Ao que é livre não vos podereis dirigir levando as mãos atadas. Não vos é dado atingir a vida espiritual mediante sistemas ou regulamentos. Ela representa uma experiência interna que não pode traduzir-se em termos daquilo que é finito. É tão vasta, tão imensa que, a não ser que a experimenteis vós mesmos, ficará como um mistério, um segredo oculto.
 
Como poderia haver leis para a espiritualidade? Para a Verdade não existem em absoluto caminhos nenhuns, a despeito da ideia bem firmada de haver um Guru, um mediador, que vos ensina, que vos leva, de estágio em estágio, cada vez mais superiores, que vos anima e vos proporciona essa qualidade interna de força, de dignidade e de equilíbrio que são requeridas. Se não existir um mediador, se não existir Guru algum, nem sistema, nem religião, então preciso é que haja um constante apercebimento de si mesmo, uma auto-recordação continua, com o fim de estabelecer a distinção entre aquilo que é real e o que é irreal. Toda a ignorância representa uma mescla do real e do irreal. A ignorância não teve princípio, porém tem fim. Finaliza a ignorância quando por meio do acautelamento, do constante auto-recolhimento, por vós próprios chegardes a saber o que é o real e o que é falso, o que é essencial e o que não é. Isto depende de vós mesmos e não de coisas externas, não de exteriores circunstâncias, sejam elas quais forem — quer sejais vós milionários, quer sejais pobres — o mundo objetivo dos sentidos não existirá para o homem que procura a absoluta, a incondicionada Verdade. Ele não é guiado a partir do exterior, não é dominado, animado ou deprimido pelas circunstâncias externas.
 
Para chegar a este reino que é libertação e para o qual caminho não existe, nem tão pouco lei nem Guru, tendes, necessariamente, que romper com todas as velhas tradições amadurecidas pelo tempo, relativas a mediadores e à salvação vinda do exterior. Este rompimento com a tradição significa também que deveis libertar-vos do bem e do mal, do bem e do mal relativos, da dor, do prazer e das convenções mundanas. Não significa que vos caiba o destruir todos os padrões de outrem.
 
Como anteriormente vos tinha dito, isto é puramente uma realização individual e, para a ela chegardes por vosso próprio esforço, necessitais que em vós se produza um afastamento do bem e do mal externos, da dor e do prazer, e das 'convencionalidades' estabelecidas pela sociedade. A Verdade é um país para o qual não existe, traçados caminhos e, para a ela chegardes não podem existir regulamentos. Isto, porém, não deve significar a licenciosidade pela vossa parte — isto é, que deveis utilizar-vos de vossa liberdade para fazerdes exatamente aquilo que vos apraz. A libertação não é isto. Para que os padrões externos de que vos falo não mais existam, tendes que substitui-los por um outro padrão fundado sobre os valores externos, coisa muito mais difícil de conseguir. Esse padrão verdadeiro, infalível, não poderá ser contestado nem julgado; nem tão pouco pode ser posto na mesma balança em que haja para sopesá-lo qualquer padrão estabelecido do exterior. Um tal padrão será dinâmico, e, por ser dinâmico será verdadeiramente criativo, pois que estará continuamente variando com a própria vida, por ser essa vida mesma, ao passo que todos os outros padrões seriam estáticos. Quando houverdes formado um tal padrão em vós próprios, sereis livres — estareis libertos de todos os vossos Gurus, de todos os vossos sistemas, de todos os vossos ritos, de todas as vossas leis. Esse padrão não variará de acordo com os vossos anseios pessoais, de acordo com os vossos gostos e desgostos, de acordo com os vossos hábitos adquiridos, será uma medida que há de levar todo o indivíduo para a libertação que é harmonia, que é verdadeira criação.
 
A libertação não se encontra nem no futuro nem no passado, não é algo que para ser atingido em um futuro longínquo nem tampouco se encontra no passado sob o controle daqueles que já a atingiram. Sustento eu que o agora, o imediato agora contém a verdade integral. O passado é o sempre mutante presente, ao passado pertencem o nascimento, a renúncia, a aquisição de todas as qualidades que houverdes já realizado.
 
O passado não virá solver vossos problemas nem restabelecer a harmonia em vosso interior; assim, voltai-vos para o futuro que, para vós, se torna um grande mistério. O futuro é o mistério do "Eu", do "Eu" ainda não solvido, porque, o quer que já tenhais solvidos do "Eu", do ser, está já no passado e, assim, o que ainda não tiverdes solvido será o futuro e, portanto, um mistério. O futuro há de ser sempre um mistério, porque, quanto mais penetrardes pelo futuro, mais misterioso ele se tornará, mais colhidos sereis por ele.
 
O estabelecimento da harmonia interna não é para conseguir-se nem no passado nem no futuro, porém no ponto em que passado e futuro se encontram, isto é, no agora. Quando houverdes atingido esse ponto, nem futuro, nem passado, nem nascimento, nem morte, nem espaço para vós mais existirão. É a esse "Agora" que é libertação, que é harmonia perfeita, que os homens do passado e os homens do futuro têm de chegar. Vós, que tendes em vista produzir esta harmonia no porvir, necessitais aperceber-vos deste momento eterno.
 
Para mim, o futuro, absolutamente não é de importância e nem também o é o passado. O que para mim é de máxima importância é aquilo que vós sois agora. Vossas ideias, vosso amor, vosso ser integral, deve viver no imediato agora, o que significa que necessitais de trazer vossas teorias para a pratica agora. Importa o que agora sois, a maneira pela qual viveis e tratais as outras pessoas e não aquilo que de futuro haveis de vir a ser. Quem se preocupa com aquilo que haveis de vir a ser? A semente que em si mesma contém a vida, necessita de sol e de chuva e os quer imediatamente, não no futuro, pois que, então, a semente, pode já estar morta.
 
Este momento eterno é criação. Desagrada-me usar de termos tais como "ativo" e "inativo", "dinâmico" e "estático" — passai, porém, para além dessas palavras e vede através delas algo de potente. Se não viverdes nesse momento que é eterno, estareis mortos para o "Eu", para a imensidade da vida. A não ser que vos liberteis de todas as atividades externas, convencionalismos, bens e males, filosofias e religiões, jamais podereis chegar a esse agora imediato que é criação.
 
O nos libertarmos, o vivermos no reino do eterno, o sermos conscientes dessa Verdade, significará o havermos sobrepujado o nascimento e a morte, pois que o nascimento pertence ao passado e a morte ao futuro, significará o termos ultrapassado o espaço, o estarmos para além do passado, do presente e da ilusão do tempo. O homem que atingiu uma libertação tal, conhece a perfeita harmonia que está constante e eternamente presente, vive incondicionalmente nessa eternidade que é o agora.

 
Krishnamurti
pensarcompulsivo

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