EU NÃO QUERO AJUDAR O MUNDO:
ISSO É SERVIÇO
Para ajudar verdadeiramente as pessoas
têm que ir à causa fundamental
das coisas.
Têm que descobrir a causa do sofrimento,
e só podem fazer
se houver reflexão profunda.
Pergunta: Alguns dos meus
amigos notaram que embora achem os seus ditos intensamente
interessantes, preferem o serviço a demasiada reflexão sobre as questões
da verdade. Quais são as suas observações sobre esta opinião?
Krishnamurti: Senhor, o que quer dizer com serviço? Toda a gente
quer ajudar. É esse o grito daquelas pessoas que pensam que estão a
servir o mundo. Estão sempre a falar sobre ajudar o mundo, especialmente
aquelas pessoas que pertencem a seitas. É a sua forma particular de
doença, porque pensam que fazendo alguma coisa, não importa o quê, vão
ajudar, que servindo as pessoas ajudarão. Quem pode dizer o que é o
serviço? Um homem que pertence ao exército, preparado para matar o
bárbaro que entre no seu país, diz que está a servir o país. O homem que
mata, o carniceiro, diz que está a servir a comunidade. O explorador
que tem os meios de produção nas mãos, monopolizados, diz que está a
servir a comunidade. O homem que explora as crenças, o sacerdote, diz
que está a servir o país, a comunidade. A quem cabe decidir?
Ou então olhemos a questão de uma forma bastante diferente. Acham que
uma flor, uma rosa, está sempre a ter em consideração de que está a
servir a humanidade, que está a ajudar o mundo pela sua existência
porque é bonita? Pelo contrário, porque é bonita, extremamente bela,
inconsciente da sua magnificência, é que está a ajudar. Não como um
homem que anda de um lado para o outro a gritar que está a servir o
mundo. Isto é, cada um quer usar os seus meios, ou as suas ideias, para
explorar o mundo, não para libertar o mundo. Pessoalmente, se não me
interpretarem mal, esse não é de modo nenhum o meu ponto de vista. Eu não quero ajudar o mundo,
como vocês lhe chamariam. Eu não posso ajudar, isso acontece
naturalmente. Isso é serviço. Não desejo fazer com que os outros se
aproximem da minha forma específica de crença ou pedir-lhes que venham
para a minha gaiola particular de pensamento, porque eu afirmo que ter
uma crença é uma limitação.
Para servir realmente, tem que se ser extremamente livre da consciência
limitada a que chamamos o “eu”, o ego, a consciência egocêntrica; e
enquanto isso existir, não estão realmente a servir o mundo. A menos que
realmente pensem, não podem descobrir se estão verdadeiramente a ajudar
o mundo. Portanto não consideremos em primeiro lugar se estamos a
ajudar o mundo, mas antes descubramos se temos a capacidade de pensar e
de sentir. Para pensar realmente, a mente não pode estar amarrada a uma
crença. Isso é muito simples, não é? Para realmente pensar
profundamente, francamente, completamente, a vossa mente não deve estar
limitada pelo preconceito ou restringida a uma determinada crença, ou
pelo medo, ou por ideias preconcebidas. Para pensar, a mente deve
começar outra vez, de novo, e não com um pano de fundo de tradição.
Afinal, a tradição só é valiosa quando os ajuda a pensar, não quando os
subjuga pelo seu peso.
Deixem-me colocar a questão de maneira diferente. Todos queremos ajudar.
Quando veem sofrimento no mundo há um intenso desejo de ajudar; mas
para ajudar verdadeiramente as pessoas têm que ir à causa fundamental
das coisas. Têm que descobrir a causa do sofrimento, e só o podem fazer
se houver reflexão profunda. E esta reflexão não é mero prazer
intelectual, mas só pode ter lugar, esta reflexão, na ação.
Jiddu Krishnamurti
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