DA NECESSIDADE DE AFASTAMENTO
DO QUE É FAMILIAR
Uma pessoa em emergência espiritual pode parecer "diferente" por uns
tempos. Numa cultura de padrões estabelecidos e frequentes expectativas
rigorosas, alguém que comece a mudar internamente pode não parecer
ajustado. Talvez um dia suba na mesa do trabalho ou na mesa de jantar e
queira falar sobre novas ideias ou descobertas como, por exemplo,
sentimentos sobre a morte, questões a respeito do nascimento, lembranças
da velha e obscura história da família, perspectivas incomuns para os
problemas mundiais ou sobre a natureza básica do universo.
A estranha qualidade desses conceitos e a intensidade com que uma pessoa
os apresenta pode induzir colegas, amigos e membros da família e se
afastarem, e a sensação de solidão, já presente, aumenta. Seus
interesses e valores podem mudar, e a pessoa talvez não queira
participar de certas atividades. Beber com os amigos ao entardecer não é
mais tão interessante quanto costumava ser; pode parecer até
repugnante.
As pessoas nessa situação podem sentir-se muito diferentes por causa da
natureza das experiências que estão vivendo. Elas percebem que estão
crescendo e mudando — enquanto o resto do mundo continua parado — e que
ninguém pode segui-las. Podem ser induzidas a atividades que as pessoas
do seu convívio não entendem ou não apoiem. Seu súbito interesse por
orar, cantar, meditar ou por qualquer sistema esotérico, tais como a
Astrologia ou a Alquimia, parecerá estranho para a família e para os
amigos, podendo aumentar sua necessidade de afastamento.
Se uma pessoa nesse estágio é classificada como um paciente
psiquiátrico, os rótulos e tratamentos que lhe são dados combinarão com
sua sensação de isolamento. Os sentimentos de separação são reforçados
cada vez que lhe é passada a mensagem verbal ou não verbal: "Você está
doente. Você é diferente".
As pessoas em processo de transformação podem mudar também sua
aparência. Elas cortam ou deixam crescer os cabelos ou são atraídas por
roupas que refletem um desvio do padrão. Os exemplos são encontrados na
cultura psicodélica dos anos 60 e 70, quando muitas pessoas tiveram
revelações espirituais e, em vez de expressá-las de modo aceitáveis pela
sociedade, sentiram-se impulsionadas a transferi-las, formando uma
cultura à parte ou "do contra", caracterizada pelas roupas expressivas,
jóias, corte de cabelo e até mesmo carros pintados com cores brilhantes.
Outros exemplos são encontrados em vários grupos espirituais. Pode-se
esperar que os iniciados no zen-budismo raspem suas cabeças e tenham uma
vida de simplicidade exterior. Os seguidores do guru Osho não só se
vestiam com roupas de uma certa cor como também usavam um MALA, ou
rosário, contendo uma imagem do mestre, e mudavam seus nomes para nomes
indianos. Como parte do judaísmo ortodoxo, os homens apresentam
frequentemente yarmulkes e barbas, seguindo um severo estilo de vida
religioso. Uma comunidade que acolhe pessoas que são praticantes
espirituais tolerará ou até encorajará esse tipo de comportamento. No
entanto, alguém que decida de repente adotar esses comportamentos que
saltam aos olhos enquanto estiver vivendo fora de uma situação de apoio
pode passar por um isolamento ainda maior.
Para muitas pessoas em emergência espiritual a transformação acontece
sem esses tipos de manifestações de alienação exterior. Em outras
palavras, porém, mais mudanças aparentes ocorrem na conduta. Para
alguns, esses novos modos de comportamento são fases passageiras do
desenvolvimento espiritual, enquanto que, para outros, podem tornar-se
parte permanente de um novo estilo de vida.
Christina Grof
A tempestuosa busca do ser
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