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terça-feira, 10 de novembro de 2015

DA NECESSIDADE DE AFASTAMENTO
 DO QUE É FAMILIAR
 
Uma pessoa em emergência espiritual pode parecer "diferente" por uns tempos. Numa cultura de padrões estabelecidos e frequentes expectativas rigorosas, alguém que comece a mudar internamente pode não parecer ajustado. Talvez um dia suba na mesa do trabalho ou na mesa de jantar e queira falar sobre novas ideias ou descobertas como, por exemplo, sentimentos sobre a morte, questões a respeito do nascimento, lembranças da velha e obscura história da família, perspectivas incomuns para os problemas mundiais ou sobre a natureza básica do universo.

A estranha qualidade desses conceitos e a intensidade com que uma pessoa os apresenta pode induzir colegas, amigos e membros da família e se afastarem, e a sensação de solidão, já presente, aumenta. Seus interesses e valores podem mudar, e a pessoa talvez não queira participar de certas atividades. Beber com os amigos ao entardecer não é mais tão interessante quanto costumava ser; pode parecer até repugnante.

As pessoas nessa situação podem sentir-se muito diferentes por causa da natureza das experiências que estão vivendo. Elas percebem que estão crescendo e mudando — enquanto o resto do mundo continua parado — e que ninguém pode segui-las. Podem ser induzidas a atividades que as pessoas do seu convívio não entendem ou não apoiem. Seu súbito interesse por orar, cantar, meditar ou por qualquer sistema esotérico, tais como a Astrologia ou a Alquimia, parecerá estranho para a família e para os amigos, podendo aumentar sua necessidade de afastamento.

Se uma pessoa nesse estágio é classificada como um paciente psiquiátrico, os rótulos e tratamentos que lhe são dados combinarão com sua sensação de isolamento. Os sentimentos de separação são reforçados cada vez que lhe é passada a mensagem verbal ou não verbal: "Você está doente. Você é diferente".

As pessoas em processo de transformação podem mudar também sua aparência. Elas cortam ou deixam crescer os cabelos ou são atraídas por roupas que refletem um desvio do padrão. Os exemplos são encontrados na cultura psicodélica dos anos 60 e 70, quando muitas pessoas tiveram revelações espirituais e, em vez de expressá-las de modo aceitáveis pela sociedade, sentiram-se impulsionadas a transferi-las, formando uma cultura à parte ou "do contra", caracterizada pelas roupas expressivas, jóias, corte de cabelo e até mesmo carros pintados com cores brilhantes.

Outros exemplos são encontrados em vários grupos espirituais. Pode-se esperar que os iniciados no zen-budismo raspem suas cabeças e tenham uma vida de simplicidade exterior. Os seguidores do guru Osho não só se vestiam com roupas de uma certa cor como também usavam um MALA, ou rosário, contendo uma imagem do mestre, e mudavam seus nomes para nomes indianos. Como parte do judaísmo ortodoxo, os homens apresentam frequentemente yarmulkes e barbas, seguindo um severo estilo de vida religioso. Uma comunidade que acolhe pessoas que são praticantes espirituais tolerará ou até encorajará esse tipo de comportamento. No entanto, alguém que decida de repente adotar esses comportamentos que saltam aos olhos enquanto estiver vivendo fora de uma situação de apoio pode passar por um isolamento ainda maior.

Para muitas pessoas em emergência espiritual a transformação acontece sem esses tipos de manifestações de alienação exterior. Em outras palavras, porém, mais mudanças aparentes ocorrem na conduta. Para alguns, esses novos modos de comportamento são fases passageiras do desenvolvimento espiritual, enquanto que, para outros, podem tornar-se parte permanente de um novo estilo de vida.

 
 
 
Christina Grof 
A tempestuosa busca do ser

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