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quarta-feira, 5 de setembro de 2018

MAHAMUDRA
 A EXPERIÊNCIA DEFINITIVA
 
 
Terceira Parte
 
Diz Tilopa:

"Mas para ti, Naropa, sério e leal, isto deve ser dito" - Aquilo que não pode ser dito deve ser dito ao discípulo. Aquilo que não pode ser dito, aquilo que é absolutamente invisível deve se tornar visível para o discípulo. Isso depende, não apenas do Mestre, mas, e ainda mais, do discípulo.
 
Tilopa foi afortunado, encontrando Naropa. Tem havido alguns desafortunados mestres que jamais encontraram um discípulo como Naropa. Assim, o que quer que tenham ganho desaparece com eles, porque não há ninguém para receber.

Às vezes, os mestres viajam milhares de milhas para encontrar um discípulo. O próprio Tilopa foi da Índia para o Tibete para encontrar Naropa, para encontrar um discípulo. Tilopa vagueou por toda a índia e não pôde encontrar um homem daquela qualidade, um homem que recebesse a dádiva, que a apreciasse, que estivesse em condições de absorvê-la, de renascer através dela. E, desde que a dádiva foi concedida a Naropa, ele se transformou totalmente. Conta-se que Tilopa disse a Naropa: "Agora vai e procura o teu Naropa."

Naropa também foi afortunado, pôde encontrar um discípulo cujo nome era Marpa. Marpa também teve muita sorte: encontrou um discípulo cujo nome era Milarepa. E então a tradição desapareceu, não houve mais discípulos daquele grande calibre que fossem encontrados. Por muitas vezes surgiram e desapareceram religiões; por muito tempo aparecerão e desaparecerão. Uma religião não se pode tornar uma seita, uma religião depende de comunicação pessoal, de comunhão pessoal. A religião de Tilopa existiu apenas durante quatro gerações - de Naropa a Milarepa -, depois desapareceu.

A religião é como um oásis; o deserto é vasto, mas, às vezes, em minúsculas partes do deserto aparece um oásis. Enquanto dura, procura-o. Enquanto ele ali estiver, bebe da sua água - ele é muito raro.

Jesus disse muitas vezes aos seus discípulos: "Um pouco mais permanecerei aqui. E, enquanto eu estiver aqui, comam da minha carne, bebam do meu sangue. Não percam essa oportunidade" - por milhares de anos, um homem como Jesus pode não aparecer aqui. O deserto é vasto. O oásis, às vezes, aparece e desaparece, porque o oásis vêm do desconhecido e precisa de uma âncora sobre esta terra. Se não houver âncora, ele não poderá permanecer. Um Naropa é uma âncora.

Se te embriagares de Jesus ou Naropa, serás totalmente transformado. A transformação é muito fácil e simples; é um processo natural. Só precisa tornar-te solo e receber a semente; tornar-te útero e receber a semente.

Mahamudra está para além das palavras e símbolos, mas para ti, Naropa, sério e leal, isto deve ser dito...

Isso não pode ser expresso - é inexprimível -, mas tem de ser dito a um Naropa. Assim que o discípulo esteja pronto, o Mestre aparecerá, terá de aparecer. Onde quer que exista uma profunda necessidade, ela deve ser satisfeita. A completa existência responde à tua necessidade mais profunda, mas deves sentir a necessidade. De outra maneira, poderás passar por um Tilopa, por um Buda, por um Jesus, e não serás capaz nem mesmo de ver que passaste por Jesus.

Tilopa viveu neste país. Ninguém o ouviu, mas ele estava pronto para conceder a dádiva do Definitivo. Que aconteceu? E isso aconteceu neste país muitas vezes; deve haver algo por trás disso. E isto aconteceu neste país mais do que em qualquer outro lugar, porque mais Tilopas foram nascidos aqui. Mas por que acontece que um Tilopa tenha de ir ao Tibet? Por que acontece que um Bodidarma tenha de ir à China?

Este país sabe demais, este país têm se tornado demasiadamente preso à cabeça. Eis por que é difícil encontrar um coração - o país dos brâmanes e pundites, o país dos grandes conhecedores, dos filósofos. Eles conhecem todos os Vedas, todos os Upanixades; podem dizer de memória todas as escrituras: um país da cabeça. Por isso é que aquilo tem acontecido muitas vezes.

Mesmo eu sinto, tantas e tantas vezes senti, que onde chega um brâmane é difícil haver comunicação. Um homem que sabe demais torna-se quase impossível, porque ele sabe sem saber. Reuniu muitos conceitos, teorias, doutrinas, escrituras. Apenas sobrecarregou sua percepção, não a fez florescer. Nada do que sabe aconteceu a ele, tudo é emprestado; e tudo o que é emprestado não passa de entulho, podridão. Deita isto fora, assim que o puderes fazer.

 
Só o que acontece contigo é verdadeiro.
Só o que em ti floresce é verdadeiro.
Só o que em ti cresce é verdadeiro e vivo.


 
Lembra-te sempre disso: evita conhecimentos emprestados.

O conhecimento emprestado torna-se um artifício da mente; esconde a ignorância, jamais a destrói. E, quanto mais estiveres rodeado de conhecimentos, bem profundamente, no centro, na própria raiz do teu ser, haverá mais ignorância e obscuridade. E um homem de conhecimento, de conhecimento emprestado, está quase que completamente fechado dentro de seu próprio conhecimento. E é difícil penetrá-lo, é difícil encontrar-lhe o coração, pois ele próprio perdeu o contato com o seu coração. Assim, não foi incidentalmente que Tilopa teve que ir ao Tibete, e Bodidarma à China: a semente teve de viajar para muito distante, não encontrando solo aqui.

Lembra-te disso, porque é muito fácil alguém tornar-se fortemente apegado ao conhecimento: é uma paixão, uma droga. O LSD não é tão perigoso, a maconha não é tão perigosa. De certa forma, são similares, porque a maconha dá um vislumbre de algo que ali não existe, dá-te um sonho de algo que é inteiramente subjetivo, dá-te uma alucinação. O conhecimento também: dá-te a alucinação de conhecer. Começas por sentir que sabes, porque podes declamar os vedas; sabes, porque podes argumentar; sabes porque tens a mente muito lógica e aguda. Não sejas tolo! A lógica nunca levou ninguém à Verdade. E uma mente racional é apenas um jogo. Todos os seus argumentos são pueris.

A vida existe sem argumento algum e a Verdade não necessita de provas - necessita apenas do teu coração. Não de argumentos, mas do teu amor, da tua confiança, da tua disponibilidade para receber.

 
"O Vácuo não precisa de confiança,
Mahamudra repousa sobre nada.
sem fazer esforço,
mas permanecendo desprendido e natural,
é possível quebrar o jugo,
ganhando assim, a libertação."


 
Se há alguma coisa, ela necessita de apoio, necessita de confiança. Mas se nada há, se apenas o vazio existe, não há necessidade de apoio nenhum. E esta é a compreensão mais profunda de todos os conhecedores: que o seu ser é um não-ser. Dizer-se que é um ser está errado, porque isso não é nada, não se parece com coisa alguma. Parece-se a coisa alguma: um vasto vazio, sem fronteiras. É apenas um anatma, um não-eu; não é um eu dentro de ti.

Todos os sentimentos do eu são falsos. Todas as identificações com "sou isto ou aquilo" são falsas.

Quando chegas ao Definitivo, quando chegas ao teu âmago mais profundo, sabes, subitamente, que não és isto, nem aquilo; que não és ninguém. Não és um ego; és apenas um vasto vazio. E, algumas vezes, se te sentares, fecha os olhos e procuras sentir o que és, para onde vais. Desce mais profundamente e poderás ter medo, porque quanto mais profundamente desceres, mais profundamente sentirás que és ninguém, que és um nada. Por isso é que as pessoas temem a meditação: ela é a morte, é a morte do ego; e o ego é apenas um falso conceito.

Agora os físicos chegaram a esta mesma verdade, através de sua pesquisa científica, aprofundando-se no terreno da matéria. O que Buda, Tilopa e Bodidarma encontraram mediante a visão interior, a Ciência tem estado a descobrir também no mundo exterior. Dizem, agora, que não há substância - e substância é um conceito paralelo do ego.

Uma pedra existe e sentes que ela é bem substancial. Podes atirá-la à cabeça de alguém e ela produzirá sangue; a pessoa atingida poderá até morrer. A pedra é muito substancial. Mas indaga dos físicos, e eles dirão que ela é não substância, que nada existe nela. Dirão que é apenas um fenômeno de energia. Muitas correntes de energia cruzando-se sobre aquela pedra dão uma sensação de substância, tal como tu, quando riscas muitas linhas cruzadas sobre um pedaço de papel: onde muitas linhas se cruzam, surge um ponto. O ponto não estava ali. Duas linhas se cruzam e o ponto surge; muitas linhas e se cruzam e um grande ponto surge. Aquele ponto está, realmente ali? Ou apenas as linhas, ao se cruzarem, é que dão a ilusão de que ali há um ponto?

Os físicos dizem que correntes de energia, cruzando-se, criam matéria. E, se perguntares o que são essas correntes de energia, dirão que não são materiais, que não têm peso, que são não materiais. Linhas não materiais cruzando-se dão a ilusão de coisa material, substancial, como a pedra.

Buda chegou a essa iluminação 2500 anos antes de Einstein. Dentro não existe ninguém; apenas as linhas de energia cruzando-se é que te proporcionam a sensação do eu. Buda costumava dizer que o eu é como uma cebola: tu a descascas, jogas fora a casca, mas uma outra surge. Se continuares descascando, camada por camada, o que permanecerá, afinal? A cebola será inteiramente descascada e nada encontrarás dentro dela.

O homem é tal como uma cebola. Descasca-se a camada de pensamentos, de sentimentos, e, finalmente, o que encontramos? Um nada.

Esse nada não precisa de apoio.

Esse nada existe por si mesmo.

Eis por que Buda disse que não existe Deus: Não há necessidade de Deus, porque Deus é um apoio. E diz que não há criador, porque não há necessidade de criar um nada. Este é um dos conceitos mais difíceis de entender - a não ser que o compreendas.

Por isso é que Tilopa diz: "Mahamudra está para além de todas as palavras e símbolos."
Mahamudra é uma experiência do nada - simplesmente, tu não és.

E, se não és, quem está aí para sofrer?

Quem está aí, em dor e angústia?

E, quem está aí para estar feliz e bem aventurado?

Buda diz que, se sentires que estás bem aventurado, tornarás a ser vítima do sofrimento, porque ainda estás ali. Quando não estiveres, então não haverá sofrimento, nem bem-aventurança; e essa será a verdadeira bem-aventurança. Então, não poderás recuar. Atingir o nada é atingir tudo.

Todo o meu esforço em relação a ti também é para conduzir-te ao nada, levar-te ao vácuo total.
 
Osho
https://redemetamorfose.org 
 

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