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quarta-feira, 5 de setembro de 2018

MAHAMUDRA
 A EXPERIÊNCIA DEFINITIVA

 

Primeira Parte
 
A experiência do definitivo não é, absolutamente, uma experiência, porque quem experimenta está perdido. E onde há aquele que experimenta, o que se pode dizer da experiência - Quem o dirá? Quem relatará a experiência? Quando não há sujeito, o objeto também desaparece: as margens desaparecem, apenas o rio da experiência permanece. O conhecimento ali está, mas o conhecedor está ausente.

Este tem sido o problema dos místicos. Alcançam o Definitivo, mas não podem relatar aos que lhes vêm após. Não podem relatá-lo a outros, que gostariam d ter essa compreensão intelectual. Tornaram-se um com o Definitivo. Todo o seu ser o relata, mas a comunicação intelectual é impossível. Poderão dá-lo a ti, se estiveres pronto para recebê-lo, poderão permitir que o alcances, se também o permitires, se fores receptivo e aberto. Mas as palavras não farão isso, os símbolos não ajudarão, teorias e doutrinas não serão de uso algum.

A experiência é tal que mais se assemelha a um experimentar, do que a uma experiência. É um processo: começa, mas jamais termina. Tu entras nele, mas jamais o possuis. É como uma gota caindo no oceano, ou o próprio oceano caindo na gota. É uma fusão profunda, uma unidade: tu simplesmente te dissolves nela. Nada fica para trás, sequer um traço; assim, como te comunicarás? Voltarás para o mundo do vale? Quem voltará daquela negra noite para te dizer?

Todos os místicos, em todo o mundo, sempre se sentiram impotentes no que se refere à comunicação. A comunhão é possível, mas a comunicação não o é. Isso deve ser entendido desde o princípio. A comunhão possui uma dimensão totalmente diferente; dois corações se encontram, e dá-se um caso de amor. A comunicação se faz de cabeça para cabeça. A comunhão se faz de coração para coração; a comunhão é um sentimento. Comunicação é conhecimento: só palavras são dadas, só palavras são ditas e só palavras recebidas e compreendidas. E as palavras são tais, a própria natureza das palavras é tão morta, que nada do que é vivo pode se relacionar através delas. Mesmo na vida comum - deixando de lado o Definitivo - mesmo um momento estático, quando realmente sentes algo e tornas-te algo, é impossível dizê-lo através de palavras.

Na minha infância eu costumava ir ao rio, logo ao amanhecer. A povoação é pequena. O rio é muitíssimo preguiçoso, parece mesmo que nem flui. Pela manhã, quando o sol ainda não se levantou, não se pode ver se corre, tão lento e silencioso ele se mostra. E pela manhã, quando não há ninguém ali, antes de os banhistas chegarem, o silêncio do rio é espantoso. Nem mesmo os pássaros cantam ainda, pela manhã; é muito cedo e não há som algum, apenas uma insondabilidade penetra tudo. E o cheiro das mangueiras suspende-se ao longo de todo o rio.

Eu costumava ir até lá, para o mais recuado canto do rio, só para me sentar ali, só para estar ali. Não havia necessidade de fazer nada; só o estar ali já era suficiente, tão bela era a experiência. Tomava banho, nadava e, quando o sol se erguia, ia para a outra margem, para a vasta extensão de areia, enxugava-me sob o sol, deitando-me ali, e, às vezes, adormecendo.

Quando voltava, minha mãe costumava perguntar: "Que estiveste fazendo durante toda a manhã?" E eu respondia: "Nada." Porque, realmente, eu nada estava fazendo. Ela retornava: "Como é possível? Que não tenhas feito nada? Deves ter estado a fazer alguma coisa." Ela tinha razão, mas eu também não estava errado.

Eu não tinha estado a fazer coisa alguma. Estivera apenas ali, com o rio, sem nada fazer, deixando que as coisas acontecessem. Se sentia vontade de nadar - preste atenção -, se sentia vontade de nadar, nadava; mas não era um ato de minha parte, eu não estava forçando nada. Se sentia vontade de dormir, dormia. As coisas aconteciam, mas não havia o que as fazia acontecer. E minha primeira experiência de satori iniciou-se junto àquele rio: nada fazer, estar ali, simplesmente, e milhões de coisas acontecendo.

Minha mãe, entretanto, insistia em que alguma coisa eu estivera fazendo; então eu dizia: "Está bem, tomei um banho e enxuguei meu corpo ao sol." Ela, então, se mostrava satisfeita. Eu, porém, não o estava, porque o que se passava no rio não podia ser expressado por palavras. "Tomei um banho" parece algo tão falho e descorado! Brincar no rio, boiar, nadar no rio eram experiências de tal modo profundas, que não fazia sentido algum dizer simplesmente: "Tomei um banho." Ou dizer apenas: "Eu estive ali, caminhei pela margem, sentei-me ali" - palavras que nada transmitiram.

Mesmo na vida cotidiana sentimos a inutilidade das palavras. E se ainda não sentiste a inutilidade das palavras, é porque não estiveste vivo, viveste apenas superficialmente. Se o que viveste, seja lá o que for, pode ser transmitido através de palavras, isso significa que absolutamente não viveste.

Quando, pela primeira vez, algo para além das palavras começa a acontecer, então a vida acontece para ti, a vida bate à tua porta. E quando o definitivo bate à tua porta, tu simplesmente te vês para além das palavras - tornas-te mudo, não podes falar. Nem mesmo uma só palavra se delineará em teu interior. E o que for que possas dizer parecerá tão descorado, tão morto, tão sem sentido, tão destituído de qualquer significação, que pensarás estar sendo injusto para com a experiência que te aconteceu. Lembra-te disto, porque Mahamudra é a última, a Definitiva experiência.

Mahamudra significa um orgasmo total com o Universo. Se tiveres amado alguém, algumas vezes sentiste uma fusão, uma submersão - os dois já não são dois. Os corpos permanecem separados, mas há algo entre esses corpos, algo como uma ponte, uma ponte de ouro, e a duplicidade interior desaparece. Uma vida-energia vibra em ambos os pólos. Se isso já aconteceu contigo, poderás compreender o que é Mahamudra.


Osho
https://redemetamorfose.org

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