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quarta-feira, 7 de junho de 2017

A FORMAÇÃO DO CARÁTER



O caráter pode ser modificado, mudado e, às vezes, totalmente transformado por meio de uma inteligente aplicação das faculdades mentais subconscientes. A prática yogue de formação do caráter baseia-se no conhecimento das admiráveis forças do plano mental subconsciente.

A extirpação dos traços característicos inconvenientes realiza-se quando o discípulo cultiva os traços que lhe são opostos. Por exemplo, se o discípulo quer vencer o medo, não se lhe ensina a concentrar-se sobre o medo com a ideia de o destruir, mas em vez disso é ensinado que deve mentalmente negar que tem medo e, depois, concentrar a sua atenção sobre o ideal de coragem. Quando estiver desenvolvida a coragem, o medo desaparece. O positivo vence sempre o negativo.

O caráter de uma pessoa é grandemente o resultado da qualidade dos pensamentos tidos na mente e dos ideais ou imagens mentais que a pessoa traz consigo.

Quem se vê e imagina sempre como infeliz e vencido, é muito capaz de aumentar as ideias das formas de pensamento destas coisas até que toda a sua natureza venha a ser dominada por elas, e todos os seus atos objetivam esses pensamentos, tomando-o realmente infeliz e fraco. Pelo contrário, o homem que nutre um ideal de sucesso e bom êxito, achará que a sua natureza mental inteira parece colaborar para a objetivação do seu ideal, tornando-o feliz e forte. E assim em relação a qualquer outro ideal.

A pessoa que forma e alimenta em si uma ideia de ciúme, facilmente poderá objetivar e criar inconscientemente as condições que darão ao ciúme o alimento para se nutrir. A mente é elástica, para quem conhece o segredo de sua manipulação.

Cada um faz-se a si mesmo positiva ou negativamente. Negativamente, se se deixa modelar pelo pensamento e ideais de outros; e positivamente, se se modela a si mesmo. O homem fraco é aquele que se deixa modelar por outros: o forte é aquele que tem o processo da sua formação nas próprias mãos.

O princípio que serve de base a toda teoria yogue da formação do caráter pelo intelecto subconsciente é que o Eu é o Senhor da mente, e que a mente é plástica para as ordens do Eu. O «Eu» do indivíduo é o seu único princípio real, permanente, imutável; a mente, como o corpo, está constantemente em mudança e movimento, cresce e morre. Da mesma maneira como o corpo pode ser desenvolvido e educado por meio de exercícios inteligentes, assim também a mente pode ser desenvolvida e educada pelo Eu, se se aplicarem métodos inteligentes.

As causas do caráter são: 1) Resultado de experiências feitas nas vidas passadas; 2) Hereditariedade; 3) Ambiente; 4) Sugestão dada por outros; 5) Auto-sugestão.

Porém, de qualquer modo que tenha sido formado o nosso caráter, ele pode ser modificado, modelado, mudado e melhorado.

A ideia básica da auto-sugestão é o «querer» do indivíduo que se façam as mudanças na sua mente, sendo esta volição ajudada pelos métodos inteligentes e experimentados de criar o novo ideal ou forma de pensamento. A primeira condição necessária para realizar as mudanças é o «desejo» da mudança. Enquanto não desejarmos realmente que haja tal mudança, não poderemos levar a vontade à, tarefa. Há uma estreita conexão entre o desejo e a vontade. A vontade não costuma ser induzida a um objeto, senão quando é inspirada pelo desejo. Algumas pessoas ligam a palavra desejo com as inclinações baixas, mas ela é igualmente aplicável às superiores. Se alguém combate uma inclinação ou um desejo inferior, faz isso também porque tem uma inclinação ou possui desejo superior.

O desejo pode ser formado quando se permite à mente ocupar-se com o objeto até que comece a desejá-lo. Esta regra rege ambos os caminhos, como muitos acharam à sua tristeza e miséria. Pode-se tornar assim não só um desejo recomendável, como também repreensível. Um pouco de reflexão vos convence da verdade disto. Um jovem não tem desejo de se entregar aos excessos de uma vida «leviana». Algum tempo depois, porém, ouve ou lê alguma coisa sobre outros que levam a vida assim e começa a permitir à sua mente ocupar-se do assunto, pensando nele, examinando-o mentalmente e saturando com ele a sua imaginação.

Depois de algum tempo começa a sentir um desejo que se enraíza e desenvolve gradualmente. E, se continuar a nutrir o objeto na sua imaginação, chega, por fim, a sentir em si uma inclinação nascente, que tentará com insistência exprimir-se em ação.

Há muita verdade nas palavras do poeta:
 
«O vício é tão feio que, visto à luz,
Só nojo e ódio ao homem bom produz.
Mas se o vê frequentemente, o nojo passa,
o homem aceita-o e, por fim o abraça».

E as loucuras e crimes de muitos homens devem-se ao crescimento de um desejo na sua mente; eles plantaram a semente, regaram-na e cuidaram dela, para que crescesse: — o desejo cresceu. Lembremo-nos sempre, porém, de que a força que conduz para baixo pode ser transmutada e usada para conduzir para cima.

É tão fácil plantar e fazer crescer desejos úteis como maus. Se temos a consciência de certos defeitos e deficiências no nosso caráter (e quem não os tem?) e achamos que não possuímos ainda o desejo bastante forte para fazermos a necessária mudança, devemos começar por plantar a semente do desejo e deixá-la crescer sob nosso cuidado e constante atenção. Devemos fazer-nos à imagem das vantagens da aquisição dos traços de caráter que desejamos ter. Devemos frequentemente pensar neles, imaginando que já os possuímos. Assim acharemos que o desejo crescente aumenta e que,  pouco e pouco sentiremos cada vez mais a necessidade de possuir aqueles traços de caráter. E quando começarmos a sentir esta necessidade com bastante força acharemos que também experimentamos na nossa consciência um sentimento de possuir força de vontade suficiente para realizar o desejo: a vontade segue depois do desejo. Cultivemos um desejo e acharemos depois a vontade para o realizar. Sob a pressão de um fortíssimo desejo praticaram, alguns homens, atos semelhantes a milagres.

Se  possuímos desejos que nos são prejudiciais, poderemos livrar-vos deles deixando-os morrer por falta de alimento e, ao mesmo tempo, fazendo crescer desejos opostos. Recusando-nos a pensar nos desejos inconvenientes, tiramos-lhes o alimento mental necessário à sua existência. Da mesma forma que morrerá uma planta que a tiramos do solo e a água que a nutre, assim também morrerá um desejo inconveniente, se nos recusamos a dar-lhe alimento mental. Não permitamos à mente ocupar-se de tais desejos, e desviemos resolutamente a atenção e sobretudo a imaginação do objeto.

E enquanto nos recusamos a entreter o hóspede desagradável, haveremos de fazer crescer com firmeza um desejo de natureza totalmente oposta — um desejo diretamente oposto ao que estamos a eliminar. Façamos a imagem do desejo oposto e pensemos nela amiúde. Façamos com que a vossa mente pouse nela com agrado e que a imaginação ajude a dar-lhe forma. Pensemos nas vantagens que nos trará a sua plena possessão e projetemos na nossa imaginação um quadro em que nos vejamos possuidor da qualidade almejada e como esta nos dá nova força vital e novo vigor.

Tudo isto nos levará gradualmente ao ponto em que deliberamos «querer» possuir tal força. Em seguida, preparamo-nos para dar o primeiro passo para diante, que é a «fé» ou «expectação confiante».

Muitas pessoas são incapazes de ter fé ou esperar com confiança quando precisam; em tais casos, devem adquirir a fé gradualmente. Quanto mais fé ou confiança tivermos no bom êxito do trabalho da formação do caráter, tanto maior será o nosso sucesso. Desejo forte e fé ou expectativa: eis os primeiros dois passos. O terceiro é a força de vontade.

Com a palavra «força de vontade» não pensamos naquela coisa que cerra os punhos e franze as sobrancelhas — a que alguns dão, falsamente, o nome de «vontade». A vontade não se manifesta deste modo. A verdadeira vontade aparece quando reconhecemos o nosso «Eu» e pronunciamos a palavra de mando daquele centro de poder e força. É a voz do «Eu». E é necessária, nesta operação de formação de caráter.

Agora estais, pois, pronto para operar, possuindo: 1) um desejo forte; 2) fé ou expectativa confiante; e 3) a força de vontade. Com esta tríplice arma, alcançaremos o sucesso.

Em seguida, vem o trabalho mesmo. Os nossos caracteres são formados de hábitos que herdamos ou que adquirimos. Reflitamos sobre isto e acharemos que é assim. Façamos certas coisas sem nelas pensar, porque adquiriremos o hábito de as fazer. Ajamos em certas direções, porque constituiremos o hábito. Estejamos habituados a ser fiéis, verdadeiros, honestos, virtuosos, porque adquiriremos e firmaremos o hábito de sê-lo. A formação do caráter é formação de hábitos. E mudar o caráter é mudar os hábitos.

E lembremo-nos que o hábito pertence quase inteiramente à mentalidade subconsciente. É verdade que os hábitos se originam na mente consciente, mas quando estão estabelecidos, caem nas profundidades da mentalidade subconsciente e transformam-se na «segunda natureza» que, muitas vezes, é mais poderosa que a natureza original da pessoa.

A impressão dada à mentalidade subconsciente aprofunda e alarga-se durante o intervalo de descanso. O melhor método é fazer frequentes e fortes impressões e, depois, dar razoáveis períodos de descanso para que a mentalidade subconsciente possa fazer o seu trabalho. Com o termo «fortes impressões», pensamos impressões dadas sob forte atenção.

Um escritor disse, com toda a razão: «Semeai um ato, colhereis um hábito; semeai um hábito, colhereis um caráter; semeai um caráter, colhereis um destino», reconhecendo, assim, que o hábito é a fonte do caráter.

Assim, vemos que a modelação, modificação, e formação do caráter dependem, em grande parte, da criação de hábito. Qual o melhor método de criar hábitos, será a questão mais próxima. A resposta do yogue é: «Formai uma imagem mental e depois assentai o vosso hábito em torno dela». E nesta sentença condensou um sistema inteiro.

Tudo que vemos que tem forma, é construído sobre a base de uma imagem mental. Esta é a regra do universo e, na formação de um caráter, seguindo simplesmente uma casa, pensamos primeiro na «casa» de um modo geral. Depois começaremos a pensar na «espécie» de casa. Em seguida, vamos aos pormenores. Depois consultamos um arquiteto e ele faz-nos um plano; este plano é sua imagem, sugestionada por nossa imagem mental. Em seguida, aceito o plano, consultamos o construtor e, por fim, a casa está construída, — uma imagem mental objetivada. E assim é com todos os objetos criados ou produzidos — tudo é manifestação de uma imagem mental.

E assim, quando desejamos criar um traço de caráter, havemos de formar uma clara e distinta imagem mental do que queremos. Formemos uma imagem clara e distinta e a seguremos na nossa mente. Depois comecemos a construir em torno dela. Deixemos os nossos pensamentos pousarem nessa imagem mental. Façamos com que a nossa imaginação nos veja como possuindo o referido traço de caráter e o coloquemos em ação. Coloquemo-lo em ação na nossa imaginação repetidas vezes, tantas quantas forem possíveis, perseverando e continuamente vendo-os manifestar o dito característico numa variedade de circunstâncias e condições. A medida que formos fazendo assim, acharemos que, gradualmente, começamos a exprimir o pensamento em ação — objetivar a imagem mental subjetiva. Tornar-se-á «natural» agirmos de acordo com a nossa imagem mental, até que, por fim, o novo hábito estará firmemente fixo no nosso ânimo e virá a ser o nosso natural modo de ação e expressão.

Desta maneira, não só podemos elevar o nosso caráter moral, como também modelar o nosso eu inferior para se conformar melhor às necessidades do ambiente e da ocupação. Se alguém tem falta de perseverança, pode-a adquirir; se está cheio de medo, pode substituí-lo por coragem; se lhe falta a confiança em si mesmo, pode obtê-la. Com efeito, não há traço que não possa ser desenvolvido desta maneira. Há pessoas que se transformaram totalmente, seguindo este método de formação do caráter.

Há pessoas com falta de confiança em si próprio — incapacidade de conservar o próprio valor na presença de outras pessoas —incapacidade de dizer «Não» — sentimento de inferioridade com aqueles que tinha contacto.

Pensamento preliminar: Devemos fixar firmemente na nossa mente o fato de que somos iguais a qualquer pessoa. Viemos da mesma fonte. Somos uma expressão da mesma Vida Una. Aos olhos do Absoluto, somos iguais a qualquer pessoa, ainda que seja a que ocupa a mais alta posição do país.

A verdade é: «As coisas como Deus as vê» — e, em verdade, nós e qualquer homem (ou mulher) somos iguais e, enfim, somos Um. Todos os sentimentos de inferioridade são ilusões, erros e mentiras, e não têm existência verdadeira.

Quando estivermos em companhia de outros, lembremo-nos deste fato e reconheçamos que o Princípio da Vida em nós fala ao Principio de Vida neles. Deixemos o Princípio de Vida fluir através de nós, e esforcemo-nos por ver o mesmo Principio de Vida atrás e além da personalidade da pessoa em cuja presença estamos. Ela (esta pessoa) oculta sob o véu da personalidade o Principio de Vida, da mesma forma que nós o fazemos. Nada mais, nada menos! Ambos somos Um na verdade. Deixemos irradiar a consciência do «Eu» e sentiremos enlevo e coragem, e o outro sentirá a mesma coisa. Temos em nós mesmos a fonte da coragem moral e física e não temos nada a temer; intrepidez é a nossa herança divina; apossemo-nos dela.

Temos a consciência de nós mesmo; o nosso «Eu» não é limitado à mesquinha personalidade; tenhamos confiança nesse «Eu» real. Penetremos no nosso interior, até sentirmos a presença do «Eu», e então teremos uma confiança em nós mesmos que nada pode abalar nem perturbar.

E quando tivermos atingido a consciência permanente do «Eu», estaremos em equilíbrio. Uma vez que tenhamos reconhecido que somos um centro de poder, não nos será difícil dizer: «Não!» quando convier dizê-lo. Uma vez que tenhamos reconhecido a nossa verdadeira natureza — o nosso «Eu» Real — perderemos todo o sentimento de inferioridade e saberemos que somos uma manifestação da Vida Una e que temos por nós a força, o poder e a grandeza do Cosmos.

Eis algumas palavras que cristalizam a ideia principal e que devemos segurar na mente. Estas palavras são: «Eu Sou», coragem, confiança, equilíbrio, firmeza, igualdade. Gravemo-las na memória e depois esforcemo-nos por fixar na nossa mente uma clara concepção do significado de cada uma dessas palavras, de maneira que cada uma represente uma ideia viva, quando as pronunciarmos. Tenhamos cuidado em não as repetir sem pensar, como papagaios. O significado de cada palavra deve estar claro diante de nós para o sentirmos, quando dissermos a palavra. Repitamos essas palavras frequentemente, quando se apresentar a oportunidade, e, em breve, começaremos a observar que agem sobre nós como um forte tônico mental, produzindo um efeito revigorante. E todas as vezes que repetirmos essas palavras, com entendimento, teremos feito alguma coisa para clarificar o caminho mental pelo qual desejamos viajar.

Prática — Quando não tiverdes o que fazer e nos pudermos entregar aos «sonhos de dia», sem prejuízo dos nossos negócios e deveres, evoquemos a nossa imaginação e esforcemo-nos por fazer uma imagem de nós mesmo como possuindo as qualidades indicadas pelas palavras acima dadas. Imaginemos que estamos em circunstâncias muito tentadoras e fazemos uso das qualidades desejadas e que as manifestais plenamente. Esforcemo-nos por fazer uma imagem mental de nós mesmos desempenhando bem o nosso papel e exibindo as qualidades desejadas. Escolhamos bem o papel que devemos representar — o caráter que desejamos possuir — e, depois, fixando-o bem na nossa mente, pratiquemos, pratiquemos, pratiquemos. Conservemos o nosso ideal sempre diante de nós e esforcemo-nos por crescer até ele. Se nos exercitarmos em paciência e perseverança, teremos bom êxito.

Não limitemos a nossa prática apenas a ensaios particulares. Precisaremos de ensaiar também em público. Por isso, quando sentirmos que já estamos preparado, passemos a exercitar os nossos crescentes hábitos, destinados a formar o nosso caráter, na nossa vida quotidiana. Escolhamos primeiro os casos mais fáceis e façamos a experiência. Então, sentiremo-nos capazes de nos tornar senhores de condições que outrora nos causavam grandes dificuldades. Tornar-nos-emos conscientes de uma força e de um poder que vêm do nosso interior, e reconheceremos que realmente somos uma pessoa transformada.

Permitamos que o nosso pensamento se expresse em ação sempre que for conveniente. Mas não tentemos forçar o sucesso para experimentar a nossa força. Não obriguemos, por exemplo, as pessoas a pedir-nos favores, para podermos dizer: «Não!» Encontraremos muitíssimos casos e ocasiões próprias sem as provocar. Acostumemo-nos a olhar as pessoas nos olhos e a sentir o poder que está detrás e dentro de nós. Em breve, poderemos ver através das personalidades e reconhecer que não são senão uma parte da Vida Una, olhando outra parte e que não há motivo de se assustar.

O reconhecimento do nosso «Eu» real tornar-nos-á capazes de manter o equilíbrio em qualquer circunstância, por mais tentadora que seja, se abandonarmos a falsa ideia a respeito da nossa personalidade. Tudo o que nos tem afligido não é mais que pequenos acidentes da vida pessoal que são reconhecidos como ilusões, do ponto de vista da Vida Universal.

Ocupemos a nossa
alma com o forte desejo de cultivar aqueles hábitos mentais que nos tornam fortes. É plano da natureza produzir fortes expressões individuais de si mesma, e com gosto nos ajudará para fazermo-nos fortes. O homem que deseja fortificar-se encontrará sempre grandes forças a seu lado que o auxiliarão, porque está realizando um plano favorito da natureza, que ela vem elaborando há séculos. Tudo o que nos leva a reconhecer e manifestar o nosso poder, tende a fortalecer-nos e põe à nossa disposição o auxílio da natureza.

Poderemos testemunhá-lo todos os dias: a natureza parece gostar de indivíduos fortes e deleita-se em ajudá-los a avançar. 




Ramacháraka 

Fonte: yogaensinamentos 

 

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