A VIDA TODA É BELA - II
Todas as Fases da Lua são Boas
Quando
se trata de saber o que é realmente bom, pode haver várias formas de
ilusão. Um exemplo disso é o hábito - frequente em meios esotéricos - de
considerar “boa” a quinzena anterior ao momento da Lua Cheia, que
começa com a Lua Nova. O motivo para a crença está no fato de que
durante este período a luz física da Lua aumenta a cada noite. O mesmo
ponto de vista considera “má” aquela parte do ciclo da Lua que vai desde
a Lua Cheia até o final da Lua Minguante, porque nesta época a luz da
Lua é decrescente.
Não há dúvida de que no mundo externo
a energia vital se expande durante a quinzena “luminosa”, e perde
intensidade na outra metade do ciclo. Este é um reflexo, em pequena
escala, do ciclo dos períodos de manifestação e repouso do universo, o manvântara e o pralaya.
Por outro lado, o ciclo lunar é uma versão maior das fases alternadas
de luz e escuridão que fazem o dia e a noite, a cada período de 24
horas.
Não
há coisas “ruins”, nem qualquer “maldade”, neste processo natural. As
duas semanas do ciclo lunar em que a luz é decrescente são boas para
conseguir o término de assuntos pendentes. É o tempo mais indicado para
renunciar, para abrir mão, e para desapegar-se daquilo que é inútil ou
prejudicial. Também é uma boa época para perseverar naquilo que é
fundamental, essencial, invisível, duradouro, e incondicionalmente bom. A
Lua Minguante tem relação com Nivritti Marga, o caminho místico
“de volta para casa”. Ela nos convida para valorizar o mundo espiritual,
enquanto que as duas semanas “luminosas” expandem os assuntos materiais
e astrais, aumentando a importância de ações físicas e voltadas para o
eu inferior.
Na
tradição budista e teosófica, a Lua Cheia está associada à Iluminação.
Isso não significa que todo o ciclo preparatório da Lua Cheia é
necessariamente bom para o Espírito, o Eu Superior. O crescimento físico
da Lua expande também o apego ao mundo, enquanto que a Lua Minguante
ensina modéstia, humildade, ação silenciosa, transcendência - e o
plantio de bom carma.
O
ciclo de 24 horas inspira o mesmo respeito inclusivo pela vida em seu
conjunto. A noite constitui um período necessário de descanso. Ela é o
Pralaya que prepara um novo Manvântara, na manhã seguinte, assim como o
período maior da Lua Minguante prepara uma outra expansão a partir do
momento da Lua Nova.
É
impossível, e indesejável, remover os fatores divisivos da vida. Assim
como a unidade, a separação é parte da existência. Devemos evitar a
criação de desarmonia desnecessária, mas a perda e a desarmonia são
fatores naturais do aprendizado. O conflito é frequentemente a
manifestação de uma forma particular de ignorância, que deve ser
removida pela compreensão, e pela ação correta. Ele não é mau em si
mesmo, portanto, e o poeta inglês Alexander Pope escreveu:
“Toda a natureza é apenas arte, desconhecida por ti;
Todo acaso, apenas direção, que tu não podes ver;
Cada discórdia, uma harmonia não compreendida;
Todo mal parcial, bem universal:
E apesar do orgulho, e da razão que falha,
Uma verdade é clara: tudo o que é, é correto.”
A
concepção teosófica de fraternidade universal transcende, e não
elimina, os fatores divisivos e separativos da vida. Tanto a separação
como a união podem criar sofrimento: tudo depende do carma. A aflição ou
Dukkha é parte da existência, segundo explica a primeira nobre
verdade do budismo. A filosofia torna possível eliminar as causas do
sofrimento desnecessário. Ela nos ensina a ser maiores do que a dor, mas
não estimula a pretensão de removê-la artificialmente.
O carma futuro depende sobretudo da motivação, ou intenção, interna.
Enquanto alguém estiver buscando a iluminação pessoal, o prestígio, o
conhecimento para si mesmo, a eficácia política e outras
superficialidades, é a personalidade que estará definindo o nível em que
o carma é acumulado e o mundo em que a pessoa vive. Esse nível de
realidade ocorre independentemente das palavras ditas e das intenções
proclamadas, que podem ser extremamente nobres.
Quando
alguém começa a viver para a humanidade e coloca todo o resto em um
segundo plano, a personalidade passa a ser reconhecida como mero
instrumento. É o principal objetivo em nossa vida - mais do que a boa
intenção ao fazer esta ou aquela tarefa isolada - que cria bom carma no
conjunto da vida e define as situações decisivas de nossa trajetória no
Caminho. Este é o fator central. Os esforços menores se adaptam a ele
assim como as abóboras se acomodam entre si em uma carreta que avança
por uma estrada de barro.
Carlos Cardoso Aveline
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