SOBRE A URGÊNCIA DE UMA TRANSFORMAÇÃO PROFUNDA
Parte I
Nós, geralmente falando, não queremos a revolução central e, sim,
apenas, mudanças exteriores — queremos uma situação econômica melhor,
mais riqueza, mais conforto, mais prosperidade, mais luxo, e uma maior
variedade de entretenimento e distrações.
É isso o que interessa para a maioria de nós. Ou trocamos uma
especialidade por outra, uma religião por outra, um dogma por outro; o
que significa, simplesmente, passar de uma gaiola velha para uma gaiola
nova.
E se temos disposição séria, falamos sobre a necessidade de abolir a
guerra — o que, mais uma vez, significa cogitar sobre a maneira de
produzir modificações no exterior.
As pesquisas científicas, as reformas sociais, os ajustamentos
políticos, tudo isso — assim como as várias religiões e sociedades
sectárias — só diz respeito a modificações exteriores.
Ora como produzir uma transformação no centro? Este é o problema da
maioria de nós, não acham? Se estamos seriamente intencionados e
reconhecemos o quanto é superficial andarmos só em busca de um emprego
melhor ou de uma solução imediata para os nossos problemas econômicos,
políticos, ou religiosos, desejaremos naturalmente saber se é possível
efetuar-se uma transformação no centro, a qual por sua vez, produza uma
transformação em nossas relações com a família, com os companheiros,
enfim, com a sociedade.
Temos tentado durante anos reformarmo-nos exteriormente, procuramos
transformar as nossas maneiras, pensamentos, conduta, nossa sociedade, e
daí não resultou nenhuma mudança radical, nenhuma libertação de forças
criadoras; e assim me parece que, sem essa profunda revolução interior,
central, será vão todo esforço que empregarmos para modificar as coisas
exteriores.
Nossos esforços poderão produzir modificações momentaneamente
satisfatórias; entretanto, se a revolução não for efetuada no centro, a
mera alteração da circunferência, da parte externa, é muito pouco
significativa e poderá, eventualmente, conduzir a malefícios maiores
ainda.
Compreendendo isso, averiguemos como se pode efetuar essa transformação, essa revolução no centro.
O que é esse centro? Ora, é a mente; e nós vamos averiguar se a mente
pode modificar-se, se pode produzir em si mesma uma revolução interior.
A mente, como ó óbvio, é constituída de níveis conscientes e níveis
inconscientes; e todo esforço da mente consciente para se modificar está
sempre compreendido na esfera exterior.
Geralmente a maioria conhece o esforço consciente de modificar, de
disciplinar a mente, e, por esse motivo, o que chamamos modificação
representa uma operação parcial e não uma revolução total. E eu estou
me referindo à revolução total, integral, e não à ação parcial, de
superfície; e essa revolução total não pode verificar-se por meio de
nenhum esforço consciente de nossa parte.
Sabemos o que é a consciência, estamos bem familiarizados com a mente
consciente que pensa e deseja, movida pelo impulso, pela intenção, e
determina o ajustamento. A mente consciente está sempre forcejando em
determinado sentido, ou para ajustar-se pelo temor, ou ainda pelo temor,
transforma-se, a fim de adaptar-se a outro padrão de ação.
Por conseguinte, todo esforço visando uma modificação é um ajustamento
sob a influência do temor, do desejo de termos bom êxito ou do desejo
de nos tornarmos melhores, para alcançarmos um certo resultado, seja
neste mundo, seja no mundo da santidade.
É urgentemente necessária uma revolução profunda, mas, é óbvio, essa
revolução deve ser inconsciente; pois, se produzo deliberadamente uma
revolução em mim mesmo, será resultado do desejo. Desejo
tornar-me melhor, conseguir um resultado, descobrir o que é Deus, o que é
a Verdade, ser mais feliz; por isso digo que há necessidade de
transformação.
O esforço positivo ou negativo, o esforço para ser ou para não ser, se
baseia no temor, na ânsia de ganho, de conforto, de paz, segurança;
assim, pois, toda modificação operada por esforço consciente não é
verdadeira transformação, e, sim, puro ajustamento a um padrão
diferente. A esse respeito, temos de perceber a verdade completamente.
Como todas as revoluções econômicas, quer da direita, quer da esquerda, o
esforço consciente não produz nenhuma transformação no centro. Ambas as
coisas só produzem tiranias. O sábio, portanto, não se preocupa
essencialmente com modificações periféricas: interessa-lhe só a
revolução interior, a revolução que opera no centro. E como iremos,
vocês e eu, produzir essa transformação? Como então efetuar essa
revolução no centro? Vemos que o esforço deliberado e consciente do
nosso pensamento ordinário não pode realizá-la. E pode o inconsciente
fazê-la? O inconsciente é o resíduo do passado, não é exato? É o
resultado dos instintos raciais, das impressões culturais, de tudo o que
fomos no passado, de toda a luta do homem contra seus ocultos intentos,
compulsões e ímpetos.
Pode esse inconsciente ajudar-nos a operar uma modificação, uma
revolução no centro? E existe alguma diferença, algum intervalo ou hiato
entre o inconsciente e o consciente?
Krishnamurti
Nenhum comentário:
Postar um comentário