VELHAS ÁRVORES MORTAS ESTUPIDAMENTE
A Relação Interna Entre a Alma Humana
e a Alma das Árvores
Henrique Luiz Roessler
No rancho junto ao grande pinhal da Fazenda, morava há muitos anos o velho posteiro Francisco.
Várias
vezes ele viu chegarem os doutores filhos do patrão, que moravam longe,
na capital, acompanhados duns homens estranhos, os quais queriam
comprar os pinheiros que o pai queria conservar, porque neles via uma
imensa fortuna.
O posteiro ficava apreensivo com as insistências dos madeireiros, porque
amava a floresta, que lhe dava todo o conforto – caça, lenha para os
frios invernos, a água límpida da fonte, sombra e proteção dos ventos, o
cantar dos passarinhos.
O patrão, muito bondoso, o tranquilizava, dizendo:
“Nunca os pinheiros serão cortados e tu serás guarda deles para sempre.”
Mas inesperadamente o fazendeiro faleceu e logo a desgraça caiu sobre o pinhal.
Os
herdeiros materialistas, loucos por dinheiro para continuar com sua
vida de luxo, venderam as árvores por cem cruzeiros cada, preço em 1942.
Hoje [1962] valeriam dez mil cruzeiros. Casos dessa natureza
acontecem frequentemente em muitas famílias cujos filhos só esperam a
morte do pai para avançar nos seus bens.
Quando
foram marcados os 8 mil pinheiros, destinados à morte, o velho posteiro
se tomou de coragem e pediu aos herdeiros que deixassem a ponta do
capão junto ao seu rancho, lembrando-os da promessa do seu pai.
A resposta chocante foi esta:
“Você
está louco, homem, nada temos com promessas feitas pelo falecido. Em
todo caso vamos deixar fora de venda aquele grande pinheiro que faz
sombra ao seu rancho.”
Iniciou-se
a derrubada. Ouvia-se incessante bater dos machados, o sibilar das
serras mecânicas, o roncar dos tratores e de vez em quando o fragoroso
estraçalhar das grandes copas batendo no chão, seguidos dos gritos
vitoriosos dos cortadores. Tudo devastado e o mato baixo todo quebrado e
recortado de picadas dos arrastos, a turma cercou o último pinheiro, o
reservado para o posteiro.
Ao primeiro golpe de machado, este se lançou de joelhos na frente dos homens e suplicou-lhes com lágrimas nos olhos:
“Pelo amor de Deus, não matem o ‘meu’ pinheiro.”
Veio
o capataz, enfurecido e insensível por terem os cortadores,
penalizados, atendido a desesperada súplica, agarrou o velho Chico e
dando-lhe um empurrão, gritou: “Afaste-se, seu velho bobo caduco”, e aos
homens ordenou: “Continuem”.
O
posteiro, estarrecido, se encostou no seu rancho e assistiu o
assassinato da árvore amiga de longos anos, sem poder salvá-la. Depois
viu seguirem os brancos cadáveres florestais com destino à Serraria.
Chico não falava mais com ninguém e mal se alimentava. Foi visto sentado
no banco do rancho, com a cabeça apoiada nas mãos, muito triste. Certa
manhã o encontraram morto, deitado do lado do cepo do “seu” pinheiro. O
fato não impressionou ninguém, nem sequer comoveu os diretamente
responsáveis. Dizem que o velho Chico morreu de saudades, de coração
partido. Que estranho sentimento de amor pela natureza num homem simples
e incompreendido.
Esta história não é ficção. Aqui a registramos como uma homenagem.
Nota Editorial de 2021:
A Teosofia ensina que o espírito da vida universal está presente em todos os reinos da natureza, unindo por exemplo a pedra, a árvore, o animal, o homem e as inteligências divinas. No texto acima, um dos grandes pioneiros da ecologia no Brasil conta fatos que ilustram esta relação de almas entre bosques e humanos.
Cabe lembrar que um posteiro é um empregado que mora junto ao limite de uma fazenda. Sua função é cuidar das cercas, para que não haja invasão das terras da fazenda por gado dos vizinhos.
Carlos Cardoso Aveline
Velhas Árvores
Um Poema Para Meditar e Refletir
Olha estas árvores, mais belas
Do que as árvores novas, mais amigas:
Tanto mais belas, quanto mais antigas,
Vencedoras da idade e das procelas… [tempestades]
O homem, a fera, e o inseto, à sombra delas
Vivem, livres de fomes e fadigas;
E em seus galhos abrigam-se as cantigas
E os amores das aves tagarelas.
Não choremos, amigo, a mocidade!
Envelheçamos rindo! envelheçamos
Como as árvores fortes envelhecem:
Na glória da alegria e da bondade,
Agasalhando os pássaros nos ramos,
Dando sombra e consolo aos que padecem!
Olavo Bilac
Nenhum comentário:
Postar um comentário