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segunda-feira, 25 de janeiro de 2021

MÍSTICA DOS DOZE PASSOS

Os doze Passos sugeridos de Neuróticos Anônimos | O Jornalzinho 

OITAVO PASSO - Fizemos uma relação de todas as instituições e pessoas pelas quais fomos condicionados e das quais abrigávamos qualquer espécie de ressentimento.


A mente é um macaco pulando de galho em galho, em busca do fruto, na selva do condicionamento humano. Discutir sobre a libertação dos condicionamentos, sem a devida atenção, pode gerar até mais condicionamento. Temos sido condicionados desde a mais tenra idade, por pais, professores, escola, faculdade, universidade, local de trabalho, religião, amigos e vizinhos. Todos têm tentando fazer de nós uma outra pessoa, alguém que não podemos ser e por isso, muitos de nós chegamos a ficar emocional e mentalmente doentes. O fato de negarmos as nossas mais profundas necessidades interiores em favor de seguir as expectativas descabidas de terceiros é que nos deixou emocionalmente desequilibrados. As pessoas que detém algum poder sobre nós, não querem de modo algum que sejamos um individuo integro, centrado, autônomo e psicologicamente independente, porque um homem centrado em si mesmo não pode ser explorado, não pode ser escravizado, não pode ser manipulado. A família e a sociedade não têm permitido o florescimento de um estado de excelência humana, ao contrário, condenam todo aquele que estiver tentando levantar-se sobre os próprios pés, e aprecia tão somente o homem que se torna apenas um imitador. Eles não querem um ser humano pleno, mas sim, um ser humano condicionado, robotizado, onde naturalmente, sua inteligência criativa, sua potencialidade, jamais tenha a chance de ser despertada, pois desse modo garantem a continuidade de suas zonas de conforto.
 
Se quisermos ser pessoas realmente livres precisamos estar cientes de que o condicionamento é a própria raiz do medo; e onde existe medo, aí não há inteligência criativa. Precisamos inventariar o modo pelo qual fomos "programados" biologicamente, fisicamente, e, também, "programados" mentalmente, intelectualmente. Precisamos estar cientes de que fomos programados como um computador. Os computadores são programados por especialistas para produzirem os resultados que eles desejam. Muitos de nós fomos programados para seguir uma determinada religião, para defender uma nacionalidade, para seguir determinada profissão e assim por diante. Durante anos temos sido programados - para acreditar para ter fé, para seguir certos rituais, certos dogmas; programado para ser um homem de sucesso. Desse modo, nosso cérebro se tornou tal como um computador, embora não tão capaz, porque nosso pensamento é limitado e isso significa que não somos mais um indivíduo autônomo, psicologicamente auto suficiente, não necessitando de doações de fora.
 
Nunca investigamos a profundidade do condicionamento do pensamento coletivo, bem como, do nosso próprio pensamento: e porque nunca o questionamos, ele assumiu o governo da nossa vida. Ele é o tirano da nossa vida e os tiranos raramente são desafiados. O autoconhecimento brota quando observamos e compreendemos todos os nossos sentimentos e pensamentos, momento por momento, dia a dia. A totalidade dessa compreensão resolve os problemas da vida. O pensamento, sem dúvida nenhuma, é a reação daquilo que conhecemos. O conhecimento reage, e damos a isso o nome de pensamento. Se ficarmos alertas, conscientes do nosso próprio processo de pensamento, nos daremos conta de que o que quer que pensemos molda a mente; e uma mente moldada pelo pensamento deixa de ser livre, e por isso não é uma mente individual. O autoconhecimento não é um processo de continuidade do pensamento, mas de redução, de cessação do pensamento. O pensamento só pode terminar quando conhecemos o conteúdo total da pessoa que pensa; e assim começamos a ver como é importante ter autoconhecimento. A maioria de nós se contenta com o autoconhecimento superficial, com arranhar a superfície, com o bê-á-bá psicológico. Não adianta ler alguns livros de psicologia, arranhar um pouco a superfície e dizer que sabe. Isso é mera aplicação à mente daquilo que se aprendeu. Uma mente que acumula não pode aprender sobre si mesma e, portanto, nunca pode ser uma mente livre. Autoconhecimento não significa conhecer-se, mas conhecer a atividade do pensamento. Porque o ego é pensamento, a ideia. Portanto, é preciso observar cada movimento do pensamento, não deixando nunca que um pensamento passe sem se certificar do que ele é. Isso revigora o cérebro. O pensamento é medo, o pensamento é prazer, o pensamento é tristeza. E o pensamento não é amor. O pensamento não é compaixão. O pensamento é limitado porque o conhecimento é limitado e qualquer que seja a atuação do pensamento, o que quer que ele crie, tem de ser limitado.
 
Precisamos perceber através da meditação a totalidade de cada movimento do pensamento, sem jamais negá-lo ou tentar reprimi-lo; isto quer dizer, deixar cada pensamento "florescer" livremente: pois só em liberdade pode o pensamento "florescer" e terminar. A mente precisa estar quieta, saber o que realmente significa "estar quieta", estar verdadeiramente tranquila. E, nessa tranquilidade, existem várias outras formas de movimento que, para quem nunca refletiu a esse respeito, só verbalmente se podem descrever.
 
A menos que descubramos a natureza exata do pensamento, nos veremos sempre de novo enredados num sistema de vida que levará finalmente ao conflito, uma maneira de vida que é violência. A natureza exata precisa ser descoberta. Enquanto existir observador e coisa observada, haverá contradição, distância, intervalo de tempo, separação entre ambos, e o pensamento tem de existir. Enquanto houver observador e coisa observada, e, entre ambos, intervalo de tempo, distância, espaço - essa separação dará origem ao pensamento. Só quando o observador é o objeto observado, e não há observador nenhum, não há pensar, não há fragmentação, há então, tão somente, unidade.
 
Precisamos estar cientes de que o pensamento não é inteligência. A inteligência pode fazer uso do pensamento, mas quando o pensamento tenta apoderar-se dessa inteligência para uso próprio, ele se torna sagaz, danoso, destrutivo. A inteligência, pois, não é nossa. Não é mensurável. Ela é, com efeito, um estado de "não-existência". Inteligência é pensamento e sentimento em perfeita harmonia, e, portanto, a inteligência é a própria beleza, inerentemente, e não uma coisa para ser procurada. O que nos cabe fazer é, apenas, observar, estar cônscios de nossos atos, pensamentos, e "motivos", e descobrir se existe alguma possibilidade de transformarmos totalmente nossas tendências humanas, crenças e desesperos. Quando um problema se apresenta – se não há seriedade – a mente hesita, porque não percebe o pleno alcance desse problema. Ir de encontro ao verdadeiro problema que causa a preocupação, conhecer de onde se originou este problema, quais pensamentos fazem parte deste problema, permitir que a plena percepção do problema seja a solução do problema. Nessa meditação encontra-se o despertar da inteligência com seu estado de unidade e bem-estar comum, que é eterno e não um paliativo para situações momentâneas.
 
Para meditar, no sentido mais profundo da palavra, temos de ser íntegros, morais. Não se trata da moralidade de um padrão, de uma prática, ou da ordem social, mas sim da moralidade que brota naturalmente, inevitavelmente, suavemente, quando começamos a nos compreender a nós próprios, quando estamos atentos aos nossos pensamentos e sentimentos, às nossas atividades, desejos, ambições, etc. — atentos sem qualquer escolha, observando apenas. Dessa observação nasce a ação correta, que não tem nada a ver com conformismo ou com uma ação de acordo com um ideal. Então, quando isso existe profundamente em nós, com a sua beleza e austeridade na qual não há nenhuma rigidez — rigidez só existe quando há esforço — quando tivermos inventariado todos os sistemas, todos os métodos, todas as promessas e olhado para eles objetivamente, sem gostar ou não-gostar, então podemos nos abster de tudo isso completamente, para que a mente fique livre do passado; então podemos prosseguir na descoberta do que é meditação. A meditação exige a mais alta disciplina — não a da repressão e do conformismo — mas a que surge quando observamos o nosso pensamento. Essa mesma observação tem a sua própria disciplina, de uma sutileza extraordinária. E podemos fazê-lo em qualquer momento. A meditação consiste em observar, estar atento a tudo, ao que está acontecendo à nossa volta e ao que está acontecendo em nós mesmos – é estar consciente de todo o processo, do movimento total.
 
Ser inteligente é estar livre da ação do pensamento condicionado. O pensamento condicionado não pode resolver os nossos problemas, porque eles foram criados pela atividade do pensamento. E o nosso principal problema é produzir uma mudança fundamental, radical, revolucionária, psicológica. Sem essa revolução, torna-se impossível uma nova maneira de viver. Essa revolução vem com o cessar do pensamento. Para fazer cessar o pensamento é indispensável entender inicialmente o mecanismo do pensar. É preciso ir até o mais profundo do ser, compreender o pensamento como um todo. É preciso examinar cada pensamento; não deixar que algum deles escape sem ser plenamente compreendido; desse modo, o cérebro, a mente, todo o ser fica bastante atentos. E quando então se persegue todo e qualquer pensamento até o fim, até a extremidade de sua raiz, até a sua natureza exata, desse momento em diante, vemos que o pensamento cessa por si mesmo. Não é preciso fazer nada a respeito porque o pensamento é memória. A memória é a marca deixada pela experiência e, enquanto a memória não for compreendida de forma plena e total, continuará a deixar marcas. A partir do momento em que tivermos vivenciado completamente a experiência, esta não deixará marcas. Desse modo, se examinarmos cada pensamento e descobrirmos onde se situa a marca, e se permanecermos com essa marca, aceitando-a como um fato, esse fato irá desnudar-se e fará cessar esse processo particular de pensar, de maneira que cada pensamento, cada sentimento será compreendido. Então o cérebro e a mente se libertarão de um acúmulo enorme de recordações. Isso requer tremenda atenção interior, para cuidar que cada pensamento seja compreendido. Todos os problemas que enfrentamos hoje, tanto psicologicamente, como nas outras esferas, são o resultado do pensamento. E nós estamos alimentando o mesmo padrão de pensamento, e o pensamento nunca solucionará nenhum desses problemas. Há, contudo outro tipo de instrumento que precisa ser despertado: a inteligência criativa integrativa.
 
Infelizmente, para a maioria de nós, o pensamento se tornou demasiadamente importante. Para a maioria das pessoas, ter a mente vazia equivale a ficar em estado de estupor, de idiotia, ou coisa parecida, e nossa reação instintiva é de rejeitar tal estado. Mas, sem dúvida, a mente que é muito tranquila, a mente que não está sendo distraída pelo próprio pensamento, a mente que é aberta, pode encarar o problema de maneira muito direta e muito simples. É essa capacidade de olharmos nossos problemas sem nenhuma distração, que representa a única solução. Para tanto, é preciso que a mente seja muito tranquila, muito serena. Essa mente não é resultado, não é produto do exercício, de meditação organizada, de controle. Ela não nasce de qualquer espécie de disciplina, constrangimento ou sublimação; nasce sem esforço algum por parte do "eu", do pensamento; nasce quando compreendemos o processo total do pensar, quando podemos ver um fato sem distração alguma. Nesse estado de tranquilidade, da mente que se acha verdadeiramente silenciosa, existe inteligência. E só a inteligência pode resolver todos os nossos problemas. Somente a inteligência pode nos levar à um estado de bem-estar comum e de unidade interna e à descoberta do significado dos nossos conflitos. A inteligência começa a funcionar no momento em que se dá a agudez do sofrimento, quando a mente e o coração não mais procuram por mecanismos de fugas. Se cuidadosamente observamos, sem preconceito, vemos que enquanto existir uma fuga, não teremos solucionado, não teremos defrontado face a face o conflito e, portanto, o nosso sofrimento é mero acumulo de ignorância. Isto quer dizer que, quando cessamos de fugir pelos canais já bem conhecidos, então, ao se dar a agudez do sofrimento, principia o despertar da inteligência. E é somente quando a inteligência está funcionando plenamente que pode ter lugar a completa dissolução da causa dos nossos conflitos. Enquanto estivermos buscando soluções, enquanto buscarmos substituições, por causa e para alivio do conflito, tem que haver a identificação da mente com o passado. Se a mente estiver nesse estado de intenso sofrimento no qual todas as vias de fuga ficam bloqueadas, então a inteligência despertará, funcionando natural e espontaneamente. O despertar da inteligência acontece através do constante inventário do pleno valor de qualquer ambiente no qual nossa mente esteja presa.
 
É através desse inventário constante da validade dos ambientes que podemos nos tornar livres de todo o ambiente particularizado, uma vez que, desse modo, estamos funcionando de modo inteligente, o que impede de sermos condicionados, pervertidos e modelados pelo ambiente. A inteligência desperta pela ação do constante inventariar do ambiente e pela descoberta do verdadeiro significado desse ambiente. Para que ocorra o despertar da inteligência, nossa mente precisa estar livre de toda a espécie de tradição; caso contrário, ficamos completamente privados da verdadeira inteligência. A inteligência é um estado em que todo o nosso ser, a totalidade da nossa mente e das nossas emoções, estão integrados num só todo. Esse ente humano integrado é um ente humano inteligente, e não a pessoa que é "talentosa”. Para que possamos ser um ente humano inteligente, é preciso que ocorra uma completa revolução em nosso pensar. Ser um ente humano inteligente significa ser um ente humano sem medo, não limitado pela tradição, o que não implica que deva ser amoral.

É o inventariar constante e a autêntica insatisfação que fazem nascer a inteligência criadora; mas é extremamente difícil manter acesos a investigação e o descontentamento; a maioria das pessoas não querem que sejamos pessoas portadoras dessa espécie de inteligência, porque é muito desagradável conviver com alguém que está sempre pondo em dúvida os valores convencionais.

http://pensarcompulsivo.blogspot.com

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