Tenho estado a cogitar sobre o porquê a ideia da verdade se apresenta tão complicada à mente da maioria das pessoas. A verdade, em si mesma, é a essência da simplicidade. Porém, dá-se que cada qual se aproxima da Verdade a partir do ponto de vista de seus próprios gostos e desgostos, a partir de seu ponto de vista pessoal, e por essa maneira, atribui à verdade certas qualidades definidas que foi a própria pessoa quem desenvolveu. O místico atribui à verdade as qualidades místicas que alcançou e o ocultista vê a verdade somente em coisas não visíveis para os olhos físicos. Se, porém, tiverdes a verdade como não possuindo qualquer das qualidades definidas da mente humana, verificareis que ela, em absoluto, não pode ter facetas. É semelhante a uma joia. A beleza da joia reside nela mesma e não nas facetas que nela recortais. Podem elas adornar a joia, porém a beleza da joia está na joia, não nas facetas.
Assim, pois, se encarardes a verdade, a vida, deste ponto de vista, assimilareis todas as expressões dela por meio de experiência e assim chegareis a essa simplicidade que é a espiritualidade verdadeira. Por simplicidade não entendo eu a simplicidade da rudeza, da vulgaridade, porém, a simplicidade que é a quintessência de todo o pensamento, de toda a emoção — que brota da origem de todas as coisas. Quando tocais essa origem, sois essa simplicidade, sois essa vida. A simplicidade é beleza e grandeza. Todas as coisas grandes possuem essa qualidade da simplicidade, a qual é apenas um processo de assimilação contínua e de contínua eliminação, até que tenhais chegado à plena realização dessa verdade que é vida, na qual não há divisão de partes múltiplas, nem distinção de muitas facetas. Estas são apenas ilusões da mente ignorante. Assim, pois, tendes que vir à Verdade com plena simplicidade da grande experiência, e então podeis discernir as qualidades refinadoras da verdade por todo o mundo, seja qual for a maneira pela qual ela se expresse. Vós sereis parte dessa Verdade. Então, não dividireis a vida em misticismo ou ocultismo, em Puritanismo ou Catolicismo Romano, em beleza e feiura. A Verdade está no conjunto e o reconhecimento disso exige completa naturalidade, essa naturalidade que se acha desprovida de todas as qualidades sub-humanas, na qual existe espontaneidade de ação, de pensamento e emoção, pelo fato de haverdes tocado a pura fonte das coisas todas. Se assim encarardes a verdade e por ela tiverdes amor em si mesma, por ser ela simplicidade, então estabelecereis dentro de vosso coração e mente essa realidade que é a resultante do ser positivo, desprovido de todo apego, de toda dúvida, de toda a incerteza, de todo o argumentar sobre o que é bem e, o que é mal. Quando houverdes tocado essa fonte da realidade, sereis semelhantes ao deserto — vasto, ilimitado e indiviso.
Como disse outro dia, é pelo perquirir, pela vigilância continuada, pelo observar, que chegais à plena realização daquilo de que falo. Assim, pois, necessitais perguntar, precisais reduzir a pedaços as coisas, a fim de lhes encontrardes o significado e não meramente viver sentimentalmente em uma crença vaga. Chega-se à verdade mediante um processo de exame contínuo, de contínuo ajuste e seleção. A verdade é muito dura se ser abordada; porém uma mente determinada e um coração positivo, cheios de grande afeto, podem assimilá-la e podem atingir a tranquilidade perdurável e a serenidade do ser.
Krishnamurti
http://pensarcompulsivo.blogspot.com
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