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domingo, 10 de maio de 2020

D   E   U   S

O Canto do Bardo: Maio 2013 

– Você crê na existência de Deus?
 

– Talvez não dum Deus a que você se refere.
 

– Que é que você entende por Deus?

– Por Deus entendo a Realidade absoluta, eterna, infinita, universal, a Causa- prima de todas as coisas; a Consciência Cósmica; a Alma do Universo; ou, no dizer de Einstein, a grande Lei que estabeleceu e mantém a harmonia do Universo. O que admito é a Vida Universal, que em todos os seres vivos se reflete como vida individual. Estou com Paulo de Tarso, que disse aos filósofos de Atenas: “Deus é aquele Ser no qual vivemos, nos movemos e temos anossa existência”.
 

– Quer dizer que você não admite um Deus pessoal?
 

– Se por “pessoal” você entende um Deus “individual”, limitado, finito, é claro que não admito semelhante pseudo-deus, porque seria a negação radical do Deus verdadeiro, que não tem limitação no tempo e no espaço.
 

– Você tem certeza da existência desse Deus universal?
 

– Certeza absoluta, embora a palavra “existência” não seja muito exata. Deus não “existe”, Deus “é”. Existir, em sentido próprio, só se pode dizer de creaturas individuais, finitas, limitadas, Existir (de ex-sistir, de ser colocado fora) só se diz de um efeito, mas não da Causa; aquele ex-siste é “colocado fora” ou produzido; a Causa, porém, siste ou simplesmente É. Deus, o Universal, é – nós, os individuais, existimos.
 

– Quer dizer que você pode provar a realidade de Deus?
 

– Provar, não; ter certeza, sim.
 

– Como? Se não a pode provar, donde lhe vem a certeza da realidade de Deus? A certeza não vem das provas?
 

– Nas coisas objetivas, individuais, a chamada certeza vem das provas, como todo cientista sabe; mas, não sendo Deus um objeto ou indivíduo, a certeza que dele temos não pode vir das provas científicas, analíticas.
 

– Donde lhe vem, pois, essa certeza?

– Brota das profundezas da experiência íntima. É o resultado de uma intuição espiritual, que não pode ser explicada a quem não a teve. Quem nunca teve amor ou alegria nunca saberá o que essas coisas são, por mais que alguém lhas defina e descreva e analise teoricamente. Quem nunca viveu a Deus nas profundezas do seu ser central, esse não tem certeza da sua realidade, por mais que estude e analise os chamados argumentos pela existência de Deus. Esses argumentos servem apenas para remover obstáculos, abrir caminho, desobstruir canais – mas nenhum deles pode dar certeza real e cabal sobre Deus. Para que essa certeza brote das divinas profundezas da alma humana deve o homem levar uma vida ética compatível com a santidade de Deus e deve também abismar-se, de vez em quando, num profundo silêncio, a sós com sua alma. Então ouvirá os “ditos indizíveis”, de que fala Paulo de Tarso, quando foi arrebatado ao “terceiro céu”.
 

Quem admite um Deus pessoal cientificamente provado, é ateu – e quem adora esse Deus demonstrado é idólatra.
 

– Você crê que há três pessoas em Deus?
 

– Se não há em Deus nenhuma pessoa, como é que haveria três?
 

– Mas a teologia fala de três pessoas, da santíssima Trindade...
 

– Talvez para sua grande surpresa, lhe devo dizer que a trindade divina não é admitida apenas pela teologia cristã; todas as grandes filosofias da antiguidade reconhecem em Deus três pessoas.
 

– Então?
 
– Resta saber o que essas filosofias entendem por “pessoa” ou persona. A palavra latina persona, de que fizemos “pessoa”, quer dizer literalmente “máscara”. Persona vem de per-sonare (soar, falar através), e significa aquela máscara ou fantasia que o ator, no tempo do Império Romano, adaptava ao rosto, quando representava no palco, e através de cuja boca aberta falava. Terminada a peça teatral, o ator tirava a persona, e, em outro drama, aparecia com outra persona. A persona ou pessoa significava, pois, a função, o papel do ator, mas não era a sua verdadeira natureza.
 
Deste modo, o Deus Universal se revela em diversas personas ou funções; e as funções fundamentais são três: a função ou persona do pai, do filho e do espírito universal (santo quer dizer universal). Na filosofia oriental, Brahman, o Deus Universal, funciona, no mundo individual, como Brahma (pai), Vishnu (filho) e Shiva (espírito universal); ele é o início (pai), a continuação (filho) e a consumação (espírito) de todas as coisas.
 
– Mas Jesus não fala de três indivíduos distintos, quando se refere à trindade?

– Jesus se serve de linguagem simbólica. Mas não deixa de afirmar “Eu e o Pai somos um”. “O Espírito Santo tomará do que é meu e vô-lo anunciará”. “O Espírito da Verdade ficará convosco para sempre – eu estarei convosco todos os dias até a consumação dos séculos”.
 
Tomás de Aquino, filósofo e teólogo, escreveu volumes repletos de erudição. Pelo fim da vida, ele teve uma visão da Verdade – e nunca mais escreveu um livro erudito. Perguntado pelo motivo dessa renúncia, o grande teólogo respondeu: “Tudo que escrevi é palha”.
 
Tomás de Aquino chama “palha”, sobretudo, os cinco argumentos eruditos com que ele tentara demonstrar, cientificamente, a existência de Deus.
 
Ninguém pode demonstrar ou provar analiticamente, intelectualmente, a realidade de Deus; mas pode ter plena certeza disto por meio de uma intuição espiritual, que é racional, mas não intelectual.
 
Einstein afirma até que as leis fundamentais não podem ser conhecidas por análise lógica, mas somente por intuição. E acrescenta: “A certeza intuitiva não pode ser alcançada por análise intelectual”.

Huberto Rohden - Orientando para a Auto-Realização
http://universalismoesoterico.blogspot.com

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