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domingo, 29 de janeiro de 2017

TANTRA - A SUPREMA COMPREENSÃO


Quarta Parte

Há pessoas que me procuram e perguntam: - “Acreditas em Deus?” - Eu respondo: - “Sim, porque tudo é tão extraordinário que como poderia ser sem que em tudo houvesse uma profunda consciência?” 

Pequenas coisas com o caminhar sobre a grama quando as gotas de orvalho ainda não se evaporaram, e sentindo totalmente a textura, o toque da grama, a frescura das gotas de orvalho, o vento da manhã, o nascer do sol. Que mais precisas tu para ser feliz? Que mais é necessário para ser feliz?
 
Apenas deitar-te à noite em teu leito, sentindo-lhe a textura, sentindo que ele se vai tornando aquecido, que estás envolvido pela escuridão, pelo silêncio da noite. Com os olhos fechados, tu simplesmente sentes a ti mesmo. De que mais precisas? Isso é demais e uma profunda gratidão surge: isso é relaxamento.
 
O relaxamento significa que o momento é mais do que suficiente, mais do que se pode solicitar ou desejar - e, então, a energia não se desloca para parte alguma.
 
Ela se torna uma plácida concentração.
Em tua própria energia tu te dissolves.
Esse momento é o do relaxamento.
O relaxamento não é do corpo nem da mente,
o relaxamento é do total.
 
Por isso é que os Budas diziam: - “Faze-te sem desejos.” Sabiam que, quando há desejo, não há relaxamento. E mandavam que se enterrassem os mortos, porque, se te preocupares demais com o passado, não poderás relaxar. E ainda diziam mais: - “Goza cada momento.”
 
Jesus disse: - “Olhai os lírios do campo, que não trabalham e são mais belos; seu esplendor é maior do que o do rei Salomão. Estão envolvidos por um aroma mais belo do que aquele de que jamais o Rei Salomão fez uso. Olha, considera os lírios!”
 
Que queria dizer com isso? Queria dizer: - “Relaxa! Não precisas labutar na verdade, está provido de tudo.” Jesus disse: - “Se Ele cuida das aves do espaço, dos animais, das feras, das árvores e das plantas, por que então, te preocupas? Ele não irá cuidar de ti?” Isso é relaxamento. Por que te preocupas tanto com o futuro? Considera os lírios, observa os lírios, sê como os lírios - e então relaxarás. O relaxamento não é uma postura, o relaxamento é a transformação total da tua energia.
 
A energia tem duas dimensões. Uma delas é motivada, vai a algum lugar, a um objetivo que está algures. O momento é apenas um meio; o objetivo tem de ser alcançado em outro lugar. Essa é uma das dimensões da tua energia, essa é a dimensão da atividade orientada para um objetivo - neste caso, tudo é um meio. Farás o que for que tenhas de fazer para alcançar o objetivo: então, relaxarás. Entretanto, o objetivo jamais é alcançado, porque essa energia se modifica a cada momento, tornando-se um meio para alguma outra coisa, situada no futuro. O objetivo permanece sempre no horizonte. Tu continuas correndo, mas a distância permanece a mesma.
 
Existe uma outra dimensão da energia: é uma celebração não motivada. O objetivo está presente agora; o objetivo não é uma outra coisa. Na verdade, não há outra realização a não ser essa, deste momento; considera os lírios. Quando és tu o objetivo e quando o objetivo não está no futuro, nada há a ser alcançado e tu estarás, então, celebrando-o; já o alcançaste, ele está ali. Isso é relaxamento, energia não motivada.
 
Por isso, para mim, há dois tipos de energia: a dos buscadores de objetivos e a dos realizadores. Os que são orientados para o objetivo são os loucos, enlouquecem aos poucos e criam suas próprias loucuras. As loucuras têm seu próprio impulso; aprofundam-se os buscadores de objetivos cada vez mais nelas e, então, ficam completamente perdidos. O outro tipo de pessoa não é um buscador de objetivos, não é absolutamente um buscador, é realizador.
 
E isto eu te ensino: sê um realizador, realiza! Já existe demais o que celebrar: as flores desabrocharam, os pássaros estão cantando, o sol ali está, no céu - celebra isso! Tu respiras, estás vivo, tens que te libertar da tensão; assim, não existirá angústia. Toda a energia transformada em angústia torna-se, então, gratidão: teu coração continua batendo com agradecida potência - isso é uma oração. Isto é o que significa toda oração: um coração que bate, profundamente agradecido.
 
Nada faças com o corpo, a não ser relaxar.
 
Não há necessidade de fazer coisa alguma para isso. Compreende, apenas, o movimento da energia, do não motivado movimento da energia. Ele flui, mas não para um objetivo; flui para uma celebração. Move-se, não para um alvo, move-se por causa de sua própria e transbordante energia.
 
Uma criança está dançando, saltando e correndo, e tu perguntas: - “Para onde vais?” - Ela não vai a parte alguma e parecerás um tolo para aquela criança. As crianças sempre acham que os adultos são tolos. Que pergunta disparatada - “Para onde vais?” Há, por acaso, necessidade de ir a algum lugar? A criança não pode responder tua pergunta, simplesmente porque ela é despropositada. Ela não está indo a parte alguma. Simplesmente encolherá os ombros, e dirá: - “A nenhum lugar.” - E daí, a mente, orientada para o objetivo, pergunta: - “Então, por que estás correndo?” Para nós uma atividade é relevante quando leva a algum lugar.
 
 
E eu te digo
que não há para onde ir,
aqui está tudo;
toda a existência culmina neste momento,
converge para este momento.
 

Toda a existência já se está derramando neste momento; tudo quanto nela existe já está se derramando para este momento - está aqui, agora.
 
Uma criança está, simplesmente, gozando a energia. Ela a tem demais. Está correndo, não porque tenha de chegar a algum lugar, mas porque tem energia demais; precisa correr.
 
Age sem motivação, apenas como um transbordamento da tua energia. Compartilha, mas não comercies, não faças barganhas. Dá porque tens; não dês para receber em troca, porque senão cairás em desgraça. Todos os comerciantes vão para o inferno. Se quiseres encontrar os maiores negocistas e barganhadores, vai ao inferno que ali os encontrarás. O céu não é para comerciantes; o céu é para os que celebram.
 
Sempre, na teologia cristã, durante séculos, foi feita uma pergunta: que fazem os anjos no céu? Eis uma pergunta apropriada para os que são orientados para um objetivo. Que fazem os anjos no céu? Nada parece que se faça lá; nada há de fazer no céu. Alguém perguntou a Meister Eckhard: - “Que fazem os anjos no céu?” E ele respondeu: - “Que espécie de tolo és tu? O céu é um lugar para celebração. Eles não fazem coisa alguma. Simplesmente, celebram aquela glória, aquela magnificência, aquela poesia, aquele florescimento - celebram, apenas. Cantam, dançam, celebram.” Não penso, contudo, que aquela pessoa tivesse ficado satisfeita com a resposta de Meister Eckhard, porque, para nós, uma atividade só tem propósito quando leva a alguma coisa, quando há um objetivo.
 
Lembra-te, a atividade é orientada para um objetivo; a ação não é. A ação é um transbordamento de energia, a ação existe neste momento; é uma resposta não preparada, não ensaiada. Toda a existência vem ao teu encontro, enfrenta-te, e tua resposta sai naturalmente. Os pássaros estão cantando e tu começas a cantar - isso não é atividade. Subitamente acontece. Subitamente, vês que está acontecendo; vês que começaste a cantarolar - isso é ação.
 
E, se te tornares cada vez mais envolvido na ação e cada vez menos ocupado com a atividade, tua vida se modificará e se tornará um profundo relaxamento. Então, tu “ages”, mas permaneces relaxado. Um Buda jamais está cansado. Por quê? Porque é uma pessoa de ação. O que quer que tenha, ele dá, ele transborda.
 
Nada faças com o corpo, a não ser relaxar;
Fecha tua boca com firmeza, e permanece silente.
 
A boca é, realmente, muito, muito significativa, porque é ela que exerce a primeira atividade; teus lábios iniciam sua primeira atividade. A partir da região da boca inicia-se toda a atividade: tu respiraste, tu choraste, tu começaste a procurar o seio de tua mãe. E tua boca permaneceu, sempre, em franca atividade. Por isso é que Tilopa sugere: “Compreende a atividade, compreende a ação, relaxa, e... fecha com firmeza tua boca.”
 
Quando quer que te sentes para meditar, quando quer que desejes permanecer em silêncio, a primeira coisa a fazer é fechar completamente a boca. Se fechares completamente a boca, tua língua tocará o palato e ambos os lábios permanecerão completamente fechados. Fecha-a completamente - mas isso só poderá ser feito se estiveres seguindo as coisas que te tenho estado a dizer, e não antes.
 
És capaz disso! Fechar a boca não requer um esforço muito grande. Podes permanecer sentado como uma estátua, com a boca inteiramente fechada, mas isso não deterá a atividade. Bem lá na profundidade, o pensamento continuará e, se o pensamento continua, tu podes sentir a sutil vibração dos lábios. Outros podem não ser capazes de observá-la, porque ela é muito sutil, mas, sempre que estás pensando, teus lábios fremem um pouquinho, um frêmito muitíssimo sutil.
 
Quando realmente relaxas, o frêmito cessa. Não estás falando, não estás tendo nenhuma atividade interior. “Fecha com firmeza tua boca e permanece silente.” E, então, não penses.
 
Que farás? Os pensamentos vêm e vão. Deixa que venham e vão, pois esse não é o problema. Não te envolvas; conserva-te distante, desligado. Observa-os, simplesmente, conforme vêm e vão. Nada tens com eles. Fecha tua boca e permanece silente. Aos poucos e automaticamente os pensamentos cessarão - eles precisam da tua cooperação para se apresentarem. Se cooperares, estarão ali; se os combateres, também estarão ali - porque ambas as coisas são formas de cooperação: uma pró, outra contra, mas ambas são uma espécie de atividade. Tu deves apenas observar.
 
Fechar a boca, entretanto, ajuda muito. Assim, em primeiro lugar, conforme tenho observado em muitas pessoas, sugiro que primeiro bocejes: abre tua boca tão amplamente quanto possível, estira tua boca tão amplamente quanto possível, boceja completamente, a ponto de sentires alguma dor; e faze isso por duas ou três vezes. Isso te ajudará a manter a boca fechada por mais tempo. E então, durante dois ou três minutos, fala em voz alta uma algaravia qualquer, uma tolice qualquer. Tudo quanto te vier à mente, dize em voz alta, gozando aquilo. Então, fecha tua boca.
 
É sempre mais fácil partir do lado oposto. Quando quiseres relaxar tua mão, é melhor fazê-la, antes, o mais tensa possível. Fecha os punhos o mais tensamente possível - faze o oposto - e, então, relaxa. Assim conseguirás um relaxamento mais profundo do sistema nervoso. Faze gestos, caretas, movimentos do rosto, distorções, bocejos, fala tolices durante dois ou três minutos e, então, fecha tua boca. Essa tensão irá dar-te uma possibilidade mais profunda de relaxar os lábios e a boca. Fecha a boca e passa a ser apenas um observador. Depressa o silêncio descerá sobre ti.
 
Há dois tipos de silêncio. Um é o silêncio que forças a descer sobre ti. Não é muito benéfico; é uma violência, uma espécie de estupro da mente, é agressivo. E há outra espécie de silêncio, que desce sobre ti como a noite. Vem e te envolve. Tu apenas crias a possibilidade de ele acontecer (é a receptividade), e ele vem. Fecha a boca, observa e não tentes permanecer silencioso. Se tentares, poderás forçar alguns minutos de silêncio, mas não terão valor algum, pois, dentro de ti, continuas fervendo. Portanto, não tentes ficar silencioso. Cria, simplesmente a situação - o solo; planta a semente e espera.
 
Esvazia tua mente e não penses em nada.
 
Como farás para esvaziar a mente? Quando os pensamentos vierem, observa. A observação tem de ser feita com uma precaução: deve ser passiva, e não ativa. Há mecanismos sutis que deves compreender, senão poderás falhar em algum ponto. E, se falhares numa pequena coisa, tudo mudará de qualidade. Observa: observa passivamente, não ativamente.
 
Qual é a diferença? Quando estás esperando por tua namorada, ou por teu apaixonado, observas ativamente. Alguém passa pela porta e tu saltas, para ver se ela chegou. Depois, apenas ouves folhas sacudidas pelo vento e pensas que talvez ela tenha chegado. Estás sobressaltado; tua mente mostra-se muito inquieta, muito ativa. Não; isso não adiantará. Se estiveres demasiado inquieto e demasiado ativo, não te chegarás ao silêncio de Tilopa, ou ao meu silêncio. Sê passivo como quando te sentas à margem de um rio, enquanto ele flui; simplesmente observa. Não há aflição, não há urgência, não há emergência. Ninguém te está forçando. Mesmo que deixes passar, nada estará perdido. Tu, simplesmente, observas, olhas apenas. Mesmo a palavra observa não é boa, porque traz, em si, um elemento de atividade. Tu, simplesmente, olhas e nada tens a fazer. Senta-te, simplesmente, à margem do rio, olha enquanto o rio flui. Ou olha para o céu enquanto as nuvens flutuam; olha passivamente.
 
É muito, mas muito essencial que essa passividade seja compreendida, porque a tua obsessão pela atividade pode tornar-se inquietação, pode fazer-se uma espera ative e, então, podes pôr tudo a perder. A atividade pode tornar a entrar pela porta dos fundos. Sê um observador passivo.

                                                  

Osho

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