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sexta-feira, 27 de janeiro de 2017

TANTRA - A SUPREMA COMPREENSÃO


Primeira Parte


Antes de mais nada, a natureza da atividade e as correntes nela ocultas têm de ser entendidas,  pois se não for o repouso será impossível. Mesmo que desejes, relaxar te será impossível se não tiveres observado, contemplado, compreendido a natureza da tua atividade; e a atividade não é um fenômeno simples.

Muitas pessoas gostariam de relaxar, mas não conseguem. O repouso é como um florescer: não o podes forçar. Deves compreender todo o fenômeno: por que és tão ativo, por que tanta ocupação com atividade? Porque estás obcecado por ela.

Lembra-te de duas palavras: ação e atividade. A ação não é atividade e a atividade não é ação. Suas naturezas são diametralmente opostas. A ação existe quando a situação a solicita: tu ages, tu respondes. A atividade existe não importa quando, pois não é uma resposta. És tão inquieto interiormente que a situação é apenas uma desculpa para tua atividade.

A ação advém de uma mente silenciosa e é a coisa mais bela do mundo. A atividade advém de uma mente inquieta e é a mais feia. A ação existe quando há um propósito. A atividade é inconveniente. A ação existe de momento para momento, é espontânea. A atividade está carregada do passado. Não é uma resposta ao momento presente, é, antes, o derramar-se da inquietação que vens trazendo do passado, para o presente. A ação é criativa. A atividade é muito, muito destrutiva - destrói-te, destrói os outros.

Tenta perceber a delicada distinção. Por exemplo: se tens fome e, então, comes, trata-se de uma ação. Mas se não tens fome, não sentes a menor fome e, ainda assim, comes, trata-se de uma atividade. Este último ato de comer é uma violência: destróis o alimento, moves os dentes, uns contra os outros, e destróis o alimento. Isto te proporciona um pequeno desafogo em relação à tua inquietação interior. Estás comendo, não porque tenhas fome. Estás comendo simplesmente por causa de uma necessidade interior, num impulso de violência.

No mundo animal, a violência está associada à boca, às mãos, às unhas e aos dentes. Esses elementos são violentos no reino animal. Ao alimentar-se, quando comes, elas se reúnem. Com a mão tomas o alimento, com a boca, o comer - a violência se desafoga. Mas, quando não há fome, isso não é uma ação, é uma doença. A atividade é uma obsessão. Não podes, naturalmente, continuar a comer desmesuradamente, porque senão estourarias. Por isso, as pessoas inventam estratagemas: mastigam pan, goma, ou fumam cigarros - são falsos alimentos, sem qualquer capacidade nutritiva, mas funcionam bem no que se refere à violência.

Um homem, que masca pan, o que está fazendo? Está matando alguém. Na mente, se ele se tornar consciente, poderá surgir uma fantasia sobre assassinato, morte. Ele está mascando pan, uma atividade muito inocente em si mesma, que não prejudica ninguém, mas muito perigosa para ti, porque pareces estar completamente inconsciente sobre o que estás fazendo. Um homem que está fumando, o que faz? Algo muito inocente, sob certo aspecto: apenas suga a fumaça e a lança fora, inalando e exalando; uma espécie de doentio pranayama e uma espécie de secular Meditação Transcendental. Ele está criando uma mandala: suga a fumaça, lança-a fora, toma-a, lança-a - cria uma mandala, um círculo. Através do fumo, ele faz uma espécie de cantochão, um cantochão rítmico. Aquilo o acalma; sua inquietação interior é um tanto aliviada.

Se estiveres falando com alguém, lembra-te, sempre - e isso é quase cem por cento correto - de que, se essa pessoa começa a procurar seus cigarros, ela está entediada e deves, então, deixá-la. Ela gostaria de mandar-te embora, mas não pode fazer isso, pois seria demasiadamente indelicado. Em lugar disso, ela procura seus cigarros. É como se estivesse dizendo: - “Bem, agora chega! Estou farto!” No reino animal, ela teria saltado sobre ti; mas, no caso, não pode saltar, pois trata-se de um ser humano, civilizado. Salta, então, sobre o cigarro, e começa a fumar. Agora já não se preocupa contigo - encerrou-se em seu próprio cantochão de fumaça. Isso a acalma.

Essa atividade, entretanto, revela que estás obcecado. Não podes permanecer tu mesmo, não podes permanecer silencioso, não podes permanecer inativo. Através da atividade lanças tua loucura, tua insanidade. A ação é bela, pois surge como resposta espontânea: a vida necessita de respostas. A cada momento tens de agir, mas a ação surge a partir do momento presente. Tens fome, buscas alimento! Tens sede, buscas a fonte! Estás te sentindo sonolento, vais dormir! É através da situação total que tu te movimentas. A ação é espontânea e total.

A atividade nunca é espontânea; ela surge do passado. Podes ter acumulado atividade durante muitos anos e, então, ela explode no presente - e isso não é conveniente. A mente é esperta e sempre encontrará justificativas para a atividade. A mente sempre tentará provar que não se trata de atividade, mas de ação: era necessária. Subitamente, encolerizas-te. Todas as pessoas, em torno de ti, estão conscientes de que aquilo não era necessário, de que a situação não pedia tal coisa, de que tua cólera era simplesmente inconveniente - só tu não o vês. Todo mundo pensa: - “Que estás fazendo? Não há necessidade disso. Por que estás tão encolerizado?” Mas tu encontrarás justificativas, justificarás, e dirás que era necessário.

As justificativas ajudam-te a permanecer inconsciente da tua loucura. Gurdjieff costumava chamá-las “amortecedores”. Crias amortecedores de justificativas em torno de ti, de movo a não compreender qual é a situação. Amortecedores são usados em trens: entre dois truques, dois compartimentos, usam-se amortecedores, para o caso de haver parada súbita, evitando-se, assim, um choque demasiado forte para os passageiros; os amortecedores absorvem o choque. Tua atividade é continuadamente inconveniente, mas os amortecedores das justificativas não permitem que vejas a situação. Os amortecedores cegam-te - e a atividade continua.

Se a atividade está em ti, não podes relaxar. Como poderias relaxar? A atividade é uma necessidade obsessiva: queres fazer alguma coisa, seja lá o que for.


Há loucos neste mundo que saem por aí dizendo: - “Faze alguma coisa, é melhor do que nada fazer.” E há tolos perfeitos que criaram um provérbio corrente em todo o mundo: Mente vazia é oficina do diabo.” Não é verdade. Uma mente vazia é oficina de Deus. Uma mente vazia é a coisa mais bela do mundo, a mais pura. Como poderia uma mente vazia ser uma oficina do diabo? O diabo não pode entrar numa mente vazia, é impossível! O diabo só pode entrar numa mente obcecada pela atividade: neste caso, sim, o diabo toma conta de ti e pode mostrar-te meios, modos e métodos de seres mais ativo. O diabo nunca diz: - “Relaxa!” Ele diz: - “Por que estás perdendo teu tempo? Faça alguma coisa, homem! Move-te! A vida está correndo, faze alguma coisa!” E todos os grandes professores, professores que acordaram para a verdade da vida, chegaram a compreender que uma mente vazia é um espaço onde o Divino penetra.

A atividade pode ser usada pelo diabo, mas não a mente vazia. Como pode o diabo usar uma mente vazia? Ele não se atreverá a aproximar-se, porque o vazio simplesmente o mataria. Mas, se estás repleto de profundos anseios quanto a ser ativo, então o Diabo tomará conta de ti, guiar-te-á - então será o único a guiar-te.

Gostaria de dizer-te que aquele provérbio é inteiramente errado. Só o próprio Diabo o poderia tê-lo sugerido.

Essa obsessão deve ser observada. E deves observá-la em tua própria vida, porque, seja o que for que eu ou Tilopa digamos, nada terá muita significação, a não ser que tu próprio a vejas, que a sintas como inconveniente e desnecessária. Por que tanta atividade em ti?

Viajando, tenho visto pessoas, constantemente, fazendo a mesma coisa, muitas e muitas vezes. Durante vinte e quatro horas estive com um passageiro, num trem. Nada encontrando para fazer ele leu o mesmo jornal várias vezes. Fechada no compartimento de um trem, uma pessoa não tem muitas oportunidades para ser ativa; por isso ele lia e relia o jornal. Que estava fazendo aquele homem?

Um jornal não é o Gita ou a Bíblia. Podes ler o Gita muitas vezes, porque, a cada vez, encontras nova significação. Mas um jornal não é o Gita: desde que o leste, acabou-se! Não vale a pena lê-lo nem mesmo uma vez mais e, contudo, as pessoas lêem, relêem e continuam a ler. Qual é o problema? É uma necessidade isso? Não. - Essas pessoas estão obcecadas, não podem permanecer em silêncio, inativas. É impossível para elas; consideram que a inatividade se parece à morte. Têm de ser ativas.



Osho
 

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