REPARANDO NOSSAS RELAÇÕES
Que se entende por relações? Que
significa “estar em relação”? Relações significam contato, estar
junto - estar relacionado, em contato direto com outro ente humano,
conhecer-lhe as dificuldades, seus problemas, sua aflição, sua
ansiedade, que é também nossa. E, compreendendo a si mesmo, compreende o
ente humano e, consequentemente, pode operar uma transformação radical
na sociedade.
Assim, torna-se de essencial
necessidade a radical transformação do ente humano. Porque quase todos
nós ainda somos animais. Se observar os animais, verá que somos parentes
muito próximos. Observe um cachorro, um animal de estimação! Como são
ciumentos! Como gostam de adulação, de afagos, etc., exatamente como os
entes humanos A menos que seja totalmente transformado o animal em
nós existente, por mais que nos esforcemos, ainda que nos liguemos às
mais extravagantes ideologia - nunca resolveremos esse problema.
Para a maioria de nós, “relações” é um termo que significa conforto,
satisfação, segurança; e nessas relações servimo-nos da propriedade, das ideias e das pessoas para nossa própria satisfação. Quando nos
servimos de outras pessoas, exigimos a posse, física ou psicológica; e,
ao possuirmos alguém, criamos todos os problemas do ciúme, da inveja, da
solidão e do conflito.
Assim, nossa dificuldade e nosso
crescente problema decorrem da falta de compreensão das nossas relações,
compreensão que, essencialmente, é autoconhecimento. É importante que compreenda fundamentalmente as suas
relações com sua esposa, seu marido, seu vizinho; porque as relações são
uma porta através da qual podemos descobrir a nós mesmos, e compreender
o que é o pensar correto.
Nossas relações atuais são realmente muito confusas, desditosas,
contraditórias, isoladas; nelas, cada um trata de estabelecer para si,
em torno de si, e dentro de si, uma muralha inacessível. Examinem-se -
não o que você deveriam ser, mas o que realmente são. Como são
inacessíveis, cada um de vocês! - pois vocês têm tantas barreiras, ideias, temperamentos, experiências, aflições, cuidados, preocupações! E
atividade de vocês de cada dia está sempre a lhes isolar; ainda que
casado, com filhos, estão sempre a funcionar, a atuar egocentricamente
Apresenta-se, assim, o problema: Como posso eu, que vivo em relação,
operar uma mutação radical nas minhas relações? Eu não posso fugir das
relações. Viver é estar em relação. Assim, tenho de compreender e de
alterar as relações. Tenho de descobrir um meio de operar uma
transformação total de minhas relações; porque, afinal de contas, elas
estão produzindo guerras.
Que é então a relação? A mim me parece
que esta é uma das coisas mais importantes na vida, porque o viver é
relação. Se não há relação, o viver não existe em absoluto; a vida se
converte então em mera série de conflitos que termina em separação,
solidão com seus temores, ansiedades, problemas de apego, e todas as
coisas envolvidas nesse sentimento de achar-se completamente isolado.
Assim, se examinarmos a
nossa vida e observarmos as nossas relações, vemos que elas constituem
um processo em que levantamos resistência uns contra os outros, em que
erguemos uma muralha, por cima da qual olhamos e observamos os outros;
mas conservamos sempre a muralha e permanecemos atrás dela, quer seja
uma muralha psicológica, quer uma muralha material, econômica, nacional.
Quando um homem está interessado só
em si mesmo e no prolongamento de si mesmo, como pode ele ter amor no
coração, como pode ter boa vontade? O homem que não pensa em si
criará por certo um mundo novo, uma nova ordem, e é para esse homem que
devemos volver os olhos. A boa vontade, a felicidade, a
bem-aventurança, só virá quando houver a busca do real. O real está
perto, não distante.
Sois responsáveis pelas
misérias e pelos desastres que ocorrem no mundo, pois na vossa vida
diária sois cruéis, opressores, ávidos e ambiciosos. Abrigai em
vossos corações a paz e a compaixão, e aclarar-se-ão as vossas dúvidas. Se não extirpais de vós mesmos as causas da inimizade, da ambição, da
avidez, são falsos os vossos deuses e vos conduzirão à desgraça. Só a
benevolência e a compaixão são capazes de promover a ordem e a paz no
mundo.
Perdemos o sentimento de humanidade;
reconhecemo-nos responsáveis somente perante a classe ou grupo a que
pertencemos; perante um nome, um rótulo. Perdemos a compaixão, o
amor ao todo, e, sem essa vivificante chama da vida, volvemo-nos para
os políticos, os sacerdotes, Em nada disso há esperança. Só no
interior de cada um de nós reside a compreensão criadora, a compaixão,
tão necessária para o bem-estar do homem. Os meios criam os fins
justos.
Estamos tentando descobrir se é
possível viver neste mundo sem nenhum medo, conflito, com um enorme
senso de compaixão, o que exige grande soma de inteligência. Você não
pode ter compaixão sem inteligência. E essa inteligência não é
atividade do pensamento. Você não pode ser compassivo se está ligado a
determinada ideologia, a um particular tribalismo estreito, ou a algum
conceito religioso, porque tudo isso é limitação. A compaixão só pode
surgir, despertar, quando há o fim do ressentimento, o que representa o
fim do movimento egocêntrico.
Quando compreendo a mim mesmo,
compreendo a vós, e dessa compreensão nasce o amor. O amor é o fator
que está faltando - há falta de afeição, de cordialidade, nas relações;
e porque falta esse amor, essa ternura, essa generosidade, essa
compaixão, em nossas relações, escapamo-nos para a ação em massa, que
produz maior confusão e maior miséria.
Não sei se você penetrou nessa
questão com profundeza e por si próprio descobriu se pode viver
com outra pessoa em total harmonia, em completo acordo, de forma que não
haja barreira, divisão, mas um sentimento de completa unidade. Porque
relação significa estar em relacionamento, não em ação, não com algum
projeto, não com uma ideologia - mas estar totalmente unido no sentido
de que a divisão, fragmentação entre indivíduos, dois seres humanos, não
mais exista em nenhum nível.
Krishnamurti
Está faltando a essência básica, fundamental, o fermento - AMOR - para sermos completos, inteiros, inteligentes. Sem ele nada seremos, nada construiremos, nada permanece. Seremos como fumaça... inconsistentes... "Ame e compreenderás". KyraKally
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