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sábado, 1 de agosto de 2020

HINO  AO  UNIVERSOUma nova estrela nasce: como suportar a dor da perda
Hino à Matéria Bendita sejas tu, áspera Matéria, gleba estéril,
duro rochedo, tu que não cedes a não ser pela violência,
e nos forças a trabalhar se quisermos comer.

Bendita sejas tu, poderosa Matéria,
mar violento, paixão indomável,
tu que nos devoras, caso não te acorrentemos.

Bendita sejas tu, poderosa Matéria,
Evolução irresistível, Realidade sempre nascente,
tu que a cada momento fazes explodir as nossas molduras,
obrigando-nos a perseguir sempre mais longe a Verdade.

Bendita sejas tu, Matéria universal, Duração sem limites,
Éter sem margens – Tríplice abismo das estrelas,
dos átomos e das gerações-, tu que transbordas e dissolves
nossas estreitas medidas, revelando-nos as dimensões de Deus.

Bendita sejas tu, Matéria impenetrável,
tu que, estendida em todo lugar entre nossas almas
e o Mundo das essências, nos deixas lânguidos
com o desejo de penetrar o véu sem costura dos fenômenos.

Bendita sejas tu, Matéria mortal,
tu que, ao te dissociares um dia em nós nos introduzirás,
forçosamente, no próprio coração daquilo que existe.
Sem ti, Matéria, sem os teus ataques,
sem as tuas arrancadas viveríamos inertes,
estagnados, pueris, ignorando a nós mesmos e a Deus.
Tu feres e curas, resistes e dobras,
arruínas e constróis, acorrentas e libertas,
- Seiva de nossas almas, Mãos de Deus, Carne de Cristo,

Matéria, eu te bendigo. - Eu te bendigo, Matéria,
e te saúdo, não como te descrevem, reduzida ou desfigurada,
os pontífices da ciência e os pregadores da virtude
– um monte, dizem eles, de forças brutais ou de apetites baixos -,
mas tal como me apareces hoje, em tua totalidade em tua verdade.

Eu te saúdo, inesgotável capacidade de ser e de Transformação,
onde germina e cresce a Substância eleita.
Eu te saúdo, potência universal de aproximação e de união,
através da qual se liga a multidão das mônadas
e na qual convergem todas sobre a rota do Espírito.
Eu te saúdo, fonte harmoniosa das almas, cristal límpido
de onde é tirada a nova Jerusalém.

Eu te saúdo, Meio Divino, carregado de Potência Criadora,
Oceano agitado pelo Espírito, Argila amassada e animada
pelo Verbo encarnado. - Crendo obedecer ao teu irresistível apelo,
os homens, muitas vezes por amor a ti,
se precipitam no abismo exterior dos gozos egoístas.
Um reflexo os engana, ou um eco.

Agora vejo bem. Para te alcançar, Matéria, é preciso que,
partindo do contato universal com tudo o que se move cá embaixo,
sintamos pouco a pouco desvanecer entre nossas mãos
as formas particulares de tudo o que seguramos,
até que permaneçamos às voltas com a única essência
de todas as circunstâncias e de todas as uniões.
Se quisermos ter a ti, é preciso que te sublimemos na dor,
depois de te haver vuluptuosamente agarrado em nossos braços.

Tu reinas, Matéria, nas alturas serenas onde os Santos
imaginam te evitar – Carne tão transparente e tão móvel
que não te distinguimos mais de um espírito.

Eleva-me para o alto, Matéria, pelo esforço,
pela separação e pela morte– eleva-me lá onde, enfim,
será possível abraçar castamente o Universo.
Embaixo, sobre o deserto que voltara à tranquilidade,
alguém chorava:“Meu Pai, meu Pai! Que vento louco o arrebatou!”
E por terra jazia um manto.

Teilhar de Chardin, Pierre
http://osgrandeshomensdahitoria.blogspot.com

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