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sexta-feira, 2 de dezembro de 2016

PARA REALIZAR A VERDADE
TENDES QUE ESTAR DESAPEGADOS


Pergunta: Dizeis que a completude existe, não no presente como tempo, mas no presente como ação. Por favor, explicai.

Krishnamurti: O tempo só existe quando houver incompletude. Quando vos apegais à vossa personalidade, aos vossos instintos limitados, aos vossos pensamentos e emoções, então conheceis o tempo sob a forma de passado, presente e futuro: na completude não existe tempo. O tempo é a continuidade da individualidade. Se estiverdes completamente livres da eu-consciência, com suas complicações, desejos, temores, então existirá esse apercebimento que não é, que não pertence ao tempo e aos opostos.

Este apercebimento é a resultante da completa ausência de morada, da solidão. O isolamento é a flama da eu-consciência, a intensidade do sentimento e pensamento. Quando houver esse auto-recolhimento, há também o alvorecer da intuição, o qual não conhece tempo nem limitação. A intuição é ação pura, é a própria Vida, não possui qualidades nem atributos; é amor no qual não existe objeto, é sua própria eternidade, completa em si mesma. Somente a mente na qual não mais existe a ideia ou vontade pode compreender essa harmonia introspectiva da completude. Nisto não pode haver tempo e, portanto, a ideia de direção, de progresso, desaparece inteiramente.

A intuição somente pode ser traduzida sob a forma de ação. Eu não me sirvo da palavra “ação” como o oposto da estagnação. Haveis de pensar que, quando a mente não tem mais ideia nem vontade e quando o coração não mais conhece “tu” e “eu”, deve existir completa negação. Do ponto de vista do tempo, é aniquilamento, isto é, quando encarais a vida sob a forma de opostos. É esse estado sem lar, essa completude na qual cessou todo o tempo e que sempre se renova a si própria.

Não entreis em discussões metafísicas a este respeito. Se tal puder ser discutido, não é real. Eu conheço aquilo que é eterno, porém, não vos posso provar; não vos posso dar. Nesta realização não há progresso, não há evolução, tomada como tempo. Presentemente conhecei-vos como seres separados e, portanto, pensais acerca da Verdade como estando afastada de vós. A completude é profunda contemplação, livre do eu-consciência. É um êxtase no qual não existe começo nem fim. Enquanto estiverdes no cativeiro da tristeza, o qual é o conflito dos opostos, jamais podereis compreender. Podeis compreender intelectualmente, porém eu não vos estou falando de nada intelectual, de metafísico; estou falando da Verdade, a qual somente pode ser realizada no presente, por meio de vossas ações e da vossa maneira de viver.

Pergunta: Que entendeis ao dizer “Não transijais?” Por favor, dai um exemplo.

Krishnamurti: A maioria de vós acredita que com o tempo podem se tornar maiores, mais nobres e mais perfeitos. Para mim é isto uma ilusão nascida do desejo pela continuidade da individualidade. Não podeis transigir entre tais crenças e o que eu vos digo. Tendes a ideia de que, para realizar a Verdade, precisais vos tornar discípulos. Eu digo que não precisais seguir a ninguém, inclusive a mim próprio. Eu digo que para realizar a Verdade, tendes que estar inteiramente desapegados, sem repouso. Não abandoneis vossos lares; não é isto que quero dizer. Para realizardes a Verdade, tendes que conhecer a solidão. Não podeis adorar, não podeis repousar em outrem, portanto, não pode haver transigência neste assunto.

Tenho falado a respeito disto por todos estes últimos quatro ou cinco anos, porém talvez de forma mais delicada e gentilmente. Alguns de vós sois Budistas, outros Cristãos, alguns ainda Teosofistas e outros ainda Hindus. Não pretendo que me sigais. Porém, se quiserdes realizar a completude, a Verdade, não vos podeis apegar a qualquer sistema ou a qualquer ilusão. Deveis vos despojar de todas as crenças e permanecer na solidão de vosso próprio pensamento criativo. Para ficar assim desapegado, isento de morada, sozinho, tendes que ter grande sofrimento e grandes alegrias. Muitas pessoas não querem sofrer grandemente ou fazer o esforço que proporciona grande êxtase. Se sofrem, suportam e não buscam compreender o sofrimento. Intelectualizam-no; encontram teorias para o acobertarem, para o enfeitarem; ocultam-no e expelem-no, porém ele brota de outra forma. Se desejardes compreender a Verdade, então, tendes que vos tornar apercebidos da causa da tristeza; precisais conhecer a vós próprios e às vossas limitações. Tornando-vos assim conscientes, libertai-vos da eu-consciência.       
   

 
Krishnamurti
 

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