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quarta-feira, 21 de dezembro de 2016

OS SETE PRINCÍPIOS DA CONSCIÊNCIA
 
Última Parte
 
H.P.B. dividiu os sete princípios em dois grupos, simbolizados por duas figuras geométricas: o quaternário inferior e a tríade superior. Vejamos a seguir alguns poucos dados sobre cada um deles.

1) O primeiro princípio, Sthula-Sharira ou Rupa em sânscrito, é o corpo físico. Durante a vida, ele recebe os efeitos do tipo de funcionamento de todos os outros princípios, e é o veículo e instrumento deles. A regra geral é que quanto mais ativos os princípios superiores, mais saúde e mais longevidade terá o corpo físico. As numerosas exceções correm por conta dos desafios cármicos (individuais ou coletivos) que são enfrentados no discipulado. Temos numerosos exemplos disso na vida de místicos e pensadores de todas as eras, incluindo a vida de H.P.B. (cujo trabalho nos planos internos causava limitações fisiológicas) e a curta existência de Subba Row, um discípulo avançado dos Mahatmas. Uma vida abstrata, dedicada aos níveis elevados de consciência, também pode causar uma vida biologicamente curta através do autossacrifício ou de uma forte indiferença pelas coisas do mundo externo, como foi o caso do filósofo Baruch Spinoza. De um modo geral, porém, a boa saúde da alma é um fator que tende a criar uma boa saúde do corpo. Os gregos tinham como lema: “Mente saudável em corpo saudável”. [8]

O Sthula-sharira também pode ser visto como uma página, na qual vão sendo impressos ao longo da vida as ações dos seis princípios superiores a ele, de um lado, e as influências do meio externo, de outro lado.

Sthula-Sharira é o ponto de encontro do meio físico com o meio sutil, e recebe as influências de ambos. Por meio dele, as influências externas alcançam os princípios sutis da consciência, e, por outro lado, as ações sutis do indivíduo alcançam o meio externo.

Não é Sthula-Sharira, pois, o princípio que luta de fato contra as influências benéficas da tríade superior ou alma imortal. É Kama que divide e disputa com a tríade superior, Atma-Buddhi-Manas, a influência sobre Sthula-Sharira. O corpo físico em si é um templo; mas a ignorância atrai mercadores para o templo, segundo a imagem do Novo Testamento, e eles devem ser expulsados. Os mercadores simbolizam a preguiça, os desejos egocêntricos e as indulgências criadas pelo quarto princípio, Kama, enquanto este princípio não é libertado dos efeitos da ignorância espiritual.

2) O segundo princípio é Prana, o princípio vital. Ele é a força vital indispensável para os quatro princípios inferiores. Ao longo da aprendizagem da alma, a crescente pureza de Kama, o quarto princípio, é essencial para que as energias vitais de Prana, o segundo, sejam usadas corretamente.

3) O terceiro princípio, Linga-Sharira, é o modelo ou a forma astral. O Linga-Sharira, segundo Helena Blavatsky escreveu em “A Chave Para a Teosofia” e outras obras, é o modelo, o duplo, o fantasma, o aspecto forma. Quando Blavatsky usa o termo astral, está pensando nestes termos. Linga-Sharira é o reservatório de vida para o corpo, é o meio concreto pelo qual Prana vitaliza o corpo físico. É a estrutura sutil, carmicamente determinada, que capta Prana e o conduz para o corpo físico. Um dos seus aspectos é o moderno “patrimônio genético”. Mas ele é também os skandhas, os registros cármicos de vidas passadas e de etapas anteriores da vida atual.

4) O quarto princípio, Kama, é a sede das emoções, desejos e paixões. É o centro do homem animal. No quarto e no quinto princípios está a linha de demarcação entre o homem mortal e o homem imortal. Em “A Chave Para a Teosofia”, HPB qualifica o quarto princípio como Kama-Rupa. Rupa significa corpo, forma. Mas HPB usou este termo apenas em relação à situação posterior à morte física, quando, de fato, Kama adota uma forma. Seria um erro chamar o quarto princípio humano de Kama-Rupa. Ele só se torna Rupa, corpo ou forma, depois da morte. Ele representa, isto sim, os elementos cármicos do ser humano; as emoções de ordem pessoal.

O quarto princípio torna-se puro através da lealdade à alma imortal.

5) O quinto princípio, Manas, é a mente, a inteligência, um princípio dual em suas funções. H.P.B. afirma que a luz da mente liga a mônada imortal (Atma-Buddhi) ao homem mortal. Ela acrescenta:

“O estado futuro e o destino cármico do homem dependem de se Manas gravita mais para baixo, em direção a Kama-Rupa, o lugar das paixões animais, ou para cima em direção a Buddhi, o Ego espiritual. No último caso, a consciência superior das aspirações espirituais individuais da mente (Manas), assimilando Buddhi, é por este absorvida formando o Ego que entra na bem-aventurança devachânica”.[9]

Neste trecho H.P.B. menciona o fato de que, no pós-morte, há o surgimento de um novo “eu” ou ego, depois que a consciência superior vence a consciência inferior e se capacita para entrar no local bem-aventurado que é o Devachan (literalmente, “local divino”).

Este processo é descrito na carta 68 de “Cartas dos Mahatmas” [10]. A carta aborda o Devachan, o estágio abençoado que existe no longo intervalo entre duas vidas físicas.

Porém, o fato de Manas gravitar mais em função de Buddhi ou de Kama não é decisivo apenas para o que ocorrerá depois da morte física. Ele é decisivo, também, para a qualidade da vida de cada cidadão, e cada coletividade, aqui e agora.

O que fazer, então, para que nossa vida possa gravitar em torno do eu superior e da consciência búdica?

H.P.B. considerava que a opção consciente entre a vontade nobre e firme e o desejo pessoal e oscilante é um fator decisivo para a vida de Manas, e também para a formação do carma presente e futuro de todo indivíduo.

6) O sexto princípio, Buddhi, é a alma espiritual. É o veículo ou instrumento de Atma, o espírito universal puro. Buddhi é o sentimento de que estamos em unidade interior com o Universo. É a fonte da intuição espiritual. Um detalhe: em uma das cartas dos Mahatmas [11], um Mestre estabelece uma relação entre o sentimento de remorso e o princípio búdico. Buddhi está ligado, portanto, à nossa “voz da consciência”, que às vezes aprova, e outras vezes reprova o que fazemos durante o uso do nosso livre arbítrio. Ouvir esta consciência é um exercício possível e útil para todos.

O despertar de Buddhi exige coerência crescente entre o que se sente, o que se pensa, se fala e se faz. Esta coerência fundamental (que nem sempre é óbvia) purifica o quaternário e faz com que a luz de Atma-Buddhi possa brilhar verticalmente com menos distorção, à medida que desce do nível superior para os níveis densos da vida.

7) O sétimo princípio, Atma, é o espírito. É o verdadeiro eu. É uno com o absoluto, e por isso não é exatamente um princípio humano, exceto quando projetado por Buddhi, seu veículo, em direção a dimensões mais limitadas. Vale a pena registrar que nas Cartas um Mahatma cita Platão e Pitágoras para explicar que, na verdade, Atma e Buddhi não estão no interior do ser humano:

“…Nem Atma nem Buddhi jamais estiveram dentro do homem – um pequeno axioma metafísico que você pode estudar com proveito em Plutarco e Anaxágoras. (…) Plutarco ensinava, com base em Platão e Pitágoras, que o demonium [12] ou (…) nous sempre permanecia fora do corpo; que ele flutuava ou inspirava, digamos assim, a extremidade da cabeça humana; é apenas a opinião vulgar que sustenta que ele está dentro.” [13]

Entre a tríade imortal e o quaternário mortal, funciona Antahkarana, a ponte que liga Buddhi-Manas a Kama-Manas. Os sete princípios da consciência humana são a escada de Jacó que liga céu (Atma) e terra (Sthula-Sharira, corpo físico). A alegoria da escada para o céu está em Gênesis, 28:10-12.

Em “A Chave Para a Teosofia” [14], H.P.B. relaciona os sete princípios do homem com a constituição setenária do nosso planeta. E acrescenta:

“A nossa filosofia nos ensina que, assim como há sete forças fundamentais na natureza e sete planos de existência, há também sete estados de consciência nos quais o homem pode viver, pensar, lembrar-se e ter o seu ser.”

Segundo a teosofia original, tudo no ser humano e no cosmo deve ser estudado do ponto de vista do esquema setenário. Na ciência esotérica, se você não sabe de que ponto de vista está falando, não sabe do que está falando. Tratemos, pois, de resumir e fixar bem na memória as palavras-chave do esquema setenário:

1 – Sthula-Sharira – o veículo, corpo ou instrumento físico;

2 – Prana – a vitalidade;

3 – Linga-Sharira – o astral, o duplo, o modelo, o corpo-fantasma;

4 – Kama – o princípio que é sede das paixões animais e dos sentimentos de apego e rejeição;

5 – Manas – a mente, o princípio dual, gravitando ora em torno de Buddhi, ora em torno de Kama;

6 – Buddhi – alma espiritual, compaixão universal, o veículo de Atma;

7 – Atma – o princípio supremo, que existe em unidade com o absoluto.

Estes sete princípios estão divididos em dois grupos. O quaternário inferior gravita em torno do físico. A tríade imortal gravita em torno de Atma. Entre a tríade e o quaternário existe uma ligação chamada antahkarana. E antahkarana é, tecnicamente, a “ponte” entre Manas inferior e Manas superior.

Para efeitos didáticos, podemos visualizar o esquema setenário da seguinte forma:


Os Princípios da Consciência Humana
 
 

Uma imagem alegórica, limitada, do movimento dinâmico destes sete princípios pode ser a seguinte.

Quando Atma, o princípio supremo, olha para baixo, sente compaixão e se torna Buddhi, uma alma espiritual. Quando Buddhi olha para baixo, tem pensamentos universais que veem a diversidade externa do ponto de vista da unidade interior, e se torna Manas em seu aspecto mais elevado. Quando Manas olha para baixo, fica preso, ou tende a ser preso por Kama, e se torna Kama-Manas. Ao olhar para baixo, Kama-Manas enxerga Linga-Sharira. Este é o modelo astral que reúne os registros cármicos de vidas anteriores. É o arquétipo de um corpo físico, preparado pelo Carma. Linga-Sharira olha para baixo e localiza Jiva, a vida no sentido absoluto. Absorve Jiva e forma Prana, o princípio vital. Assim se cria, renova e fortalece Sthula-Sharira, o corpo físico.

No ciclo ascendente, a volta para casa é a marcha evolutiva em que o foco de consciência olha cada vez mais para cima.

Esse não é o único esquema setenário possível quando se pensa em descrever os vários níveis de consciência do ser humano. A classificação dos princípios, e mesmo a ordem entre eles, pode variar de um indivíduo para outro. As descrições gráficas são apenas aproximações e devem servir como estímulo para o despertar da autoconsciência.

Ao tentar compreender racionalmente o mistério dos sete princípios, alguns estudantes alegam que o esquema referencial dado por H.P.B. é complexo e imperfeito. E isso é verdade. Sobre certos temas, a teosofia não transmite publicamente mais do que esboços gerais e fragmentários, cuja compreensão parcial deve estimular a intuição de cada estudante. Não se pode fotografar o vento, e o espírito é sutil como o vento.

É verdade que a literatura pseudoteosófica criada por Annie Besant, Charles Leadbeater e seus seguidores busca apresentar a teosofia como se ela fosse simples, linear, como se dependesse de crença cega e estivesse ligada a rituais. Tal subliteratura é uma paródia da verdadeira teosofia e deve ser abandonada sem hesitação. Durante sua discussão com Subba Row em torno da classificação dos princípios da consciência, Helena Blavatsky escreveu:

“O que é esotérico deve ser mais deduzido do que ensinado abertamente.” [15]

Na realidade, o processo racional comum só pode obter fragmentos da verdade. Querer capturar as realidades da quarta e quinta dimensões com imagens mentais tridimensionais é como pretender guardar o vento do topo das montanhas em um pequeno vidro fechado com tampa de metal. A importância do estudo é que ele serve como uma base da qual se salta para o plano intuitivo.

A Carta de 1900, a última recebida de um Mahatma, informa como os Adeptos trabalham:

“Em períodos favoráveis, liberamos influências elevadoras que impressionam várias pessoas de diferentes maneiras. É o aspecto coletivo de muitos destes pensamentos que pode dar o rumo correto à ação.” [16]

Isto pode levar-nos a perceber que a energia oculta está além das faixas vibratórias que o hemisfério esquerdo e lógico-linear do cérebro é capaz de captar. Diferentes indivíduos têm diferentes graus e tipos de consciência e captam ângulos e aspectos diferentes da energia oculta, ou essencial. Ou seja, não há como colocar em palavras o que é oculto. O estudante tem de se erguer acima das classificações lineares, que são apenas como réguas indicando o real, e o não real.

O livro “O Mundo Oculto”, de Alfred P. Sinnett, publica várias cartas dos Mahatmas. Ali um Mestre explica, em um trecho de importância decisiva para que se compreenda como ocorre o contato entre o Mestre e o aspirante ao discipulado:

“Só o progresso que uma pessoa faça no estudo do conhecimento Arcano a partir dos elementos rudimentares a leva a compreender gradualmente o nosso propósito. Somente assim, e não de outra forma, ela o faz fortalecendo e refinando aqueles misteriosos laços de simpatia que unem os seres inteligentes – fragmentos temporariamente isolados da Alma universal e da própria Alma cósmica – trazendo-os a uma completa harmonia. É assim, e não de outro modo, que estas simpatias despertadas servirão, na verdade, para conectar o ser humano com aquilo que, na falta de um termo científico europeu mais adequado, sou novamente compelido a descrever como aquela cadeia energética que une o cosmo material e imaterial – passado, presente e futuro – acelerando as suas percepções de modo que ele capte claramente não apenas todas as coisas materiais, mas também as espirituais. Sinto-me até irritado ao ter que usar estas três palavras desajeitadas, passado, presente e futuro! Como conceitos miseravelmente estreitos de fases objetivas do Todo Subjetivo, elas são tão inadequadas nesse sentido quanto seria um machado para fazer um trabalho delicado de escultura.” [17]

A visão oculta do ser humano é complexa. É multidimensional. As palavras não são capazes de descrevê-la adequadamente. Chega-se a ela por um salto interior, espontâneo, involuntário, que ocorre a partir de muitas pequenas evidências recolhidas no mundo tridimensional.

Este ponto de vista intangível, do qual o estudante olha para toda vida dentro e fora de si, deve iluminar também a sua vida concreta. Além de estudar o esquema setenário de Blavatsky e outros esboços dos princípios da consciência, o estudante deve perguntar a si mesmo, do ponto de vista prático e vivencial, qual tem sido o funcionamento cotidiano dos seus vários “eus”, colocados em uma escala vertical.

Ele deve avaliar o seu “eu” físico, incluindo o grau de pureza dos seus alimentos e a quantidade de exercício adequado que pratica no trabalho ou durante o lazer, assim como o seu descanso. Estes são fatores importantes para o seu segundo princípio. Ele deve examinar o seu “eu” emocional animal, Kama, com as suas diversas variantes, que se estruturam conforme as diferentes situações concretas que vive. O comportamento de Kama é igualmente importante para o funcionamento eficaz do segundo princípio, Prana.

O estudante deve observar seu “eu” mental – com suas opiniões e raciocínios objetivos, e ver honestamente, sem autocondenação ou autojustificação, se ele gravita mais em torno do sexto princípio ou do quarto princípio. A palavra “eu”, aqui, é usada no sentido de “centro organizador da consciência conhecida”.

Os ensinamentos teosóficos ganham significado novo a cada instante. O estudante os grava em sua própria alma, à medida que capta neles camadas superiores de significado e que os transforma em uma parte coerente da sua vida diária. Não por acaso Platão escreveu:

“Eu falo da palavra inteligente gravada na alma do aprendiz…” ( “Phaedrus” [276] )

Embora a teosofia de H.P.B. ainda seja recente – tendo sido dada à humanidade há menos de 200 anos – ela já pode ser em parte compreendida e vivenciada. Cada vez mais atual, a obra de H.P.B. veio na frente e está abrindo caminho para passos evolutivos que a mente humana de hoje apenas é capaz de ensaiar precária e desajeitadamente, enquanto sonha com uma humanidade mais sábia e mais fraterna. 
 
 
Carlos Cardoso Aveline 
 
 
 
NOTA
 
[8] Sobre o corpo físico, veja o capítulo 14, “O Corpo Inseparável da Alma”, na obra “Três Caminhos Para a Paz Interior”, Carlos Cardoso Aveline, Ed. Teosófica, Brasília, 2002, pp. 113-126.
 
[9] “A Chave Para a Teosofia”, Capítulo VI, subtítulo “A Natureza Setenária do Homem”.
 
[10] “Cartas dos Mahatmas Para A. P. Sinnett”, obra citada, volume I. Trata-se da carta 16 nas edições não-cronológicas (em inglês) das “Cartas dos Mahatmas”.
 
[11] “Cartas dos Mahatmas Para A.P. Sinnett”, obra citada, veja a Carta 42.
 
[12] “Demônio”, originalmente, significa “espírito” em grego. Foi a ortodoxia cristã que, para melhor dominar os povos “pagãos”, deu significado negativo à palavra, o que serviu de justificativa para perseguições.
 
[13] “Cartas dos Mahatmas Para A.P. Sinnett”, obra citada, volume I, carta 72.
 
[14] “A Chave para a Teosofia”. Veja o capítulo VI, subtítulo “Sobre a Constituição Setenária do Nosso Planeta”. 
 
[15] Texto intitulado “Classification of ‘Principles’”, publicado na coletânea em três volumes em “Theosophical Articles”, Helena P. Blavatsky, Theosophy Co., Los Angeles, 1981, ver volume II, p. 233. 
 
[16] O texto incompleto da Carta de 1900 está em “Cartas dos Mestres de Sabedoria”, editadas por C. Jinarajadasa, Ed. Teosófica, Brasília, Carta 46, primeira série, p. 106. Leia a íntegra da carta em nossos websites associados. Título: “A Carta de 1900, na Íntegra”. Nome de autor, “Um Mestre de Sabedoria”.
 
[17] “O Mundo Oculto”, Alfred P. Sinnett, Editora Teosófica, Brasília, 2000, ver p. 142. 
 
Fonte: Fonte: http://www.filosofiaesoterica.com

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