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segunda-feira, 12 de setembro de 2016

A EDUCAÇÃO DO HOMEM INTEGRAL


Entrevista com Huberto Rohden


O velho slogan “abrir uma escola é fechar uma cadeia” peca por uma ridícula ingenuidade. O verdadeiro sentido de uma escola é intensificar a consciência, e nem o governo, nem as igrejas, estão interessados nisso. O governo está interessado em instrução científica, e as igrejas limitam-se apenas à moralização. Mas nem instrução nem moralização tornam o homem melhor.

- Ninguém pode educar ninguém. Não é possível. Os governos entendem educação como uma coisa transitiva, do professor para o aluno. Isso só é possível no nível da ciência, da física. Mas não é possível no nível da consciência, da metafísica. A verdadeira educação é intransitiva. Nem o próprio Cristo conseguiu educar seus discípulos com palavras, do contrário Judas não o teria traído. Os outros discípulos de Jesus só se auto educaram na manhã de Pentecostes, quando o espírito da verdade, que neles despertou, transformou-os completamente.
 
 
Um passo em mil anos

Escrevo livros há mais de cinqüenta anos. Quando escrevi o primeiro, tinha 25. Não posso reafirmar o que disse há tanto tempo. Todos nós mudamos, não somos estáticos, somos dinâmicos. A verdade pode ser absoluta, mas o conhecimento dela é elástico, progressivo. Se fôssemos múmias o suficiente para nos petrificarmos e fossilizarmos em museus, poderíamos afirmar nossas convicções de vinte, trinta anos atrás.

A Educação do Homem Integral é a minha experiência de auto educação. Sou eu educando a mim mesmo. Agora,, uma pergunta: de que maneira a minha auto educação pode beneficiar os outros? Se o educador se auto educa, se ele se auto realiza, poderá beneficiar indiretamente a outras pessoas. Onde há plenitude de auto realização, há um transbordamento, na forma de vibrações benéficas. É como uma luz muito intensa que, além da casa, atinge também a vizinhança. Uma vez Mahatma Gandhi disse: "Quando um único homem chega à plenitude do amor, neutraliza o ódio de muitos milhões". O oposto é igualmente verdadeiro: quando um homem chega à plenitude do ódio, sua maldade se dissemina por toda parte. As duas últimas guerras degradaram horrivelmente a humanidade. Foram guerras de ódio, principalmente a última, quando Hitler mandou matar 6 milhões de pessoas só porque eram judias. Foi um ódio satânico, causado por um único homem. Isso prejudicou demais a humanidade. Ainda não nos recuperamos dos danos morais e espirituais da última guerra. Tudo aquilo nos afetou e afeta ainda hoje. Criou-se, desde então, uma atmosfera mundial de ódio. Todas as guerras que continuam existindo nos prejudicam, pois dificultam a atmosfera ao nosso redor e a nossa auto realização.


Crise, agonia e catástrofe

- O processo de evolução espiritual da humanidade é muito lento. Alguns dão um passo para a frente em mil anos. Se alguém se realiza plenamente é um redentor da humanidade. Jesus estava a ponto de chegar a essa perfeição. Quem entre nós, seres humanos, poderia desafiar publicamente amigos e inimigos perguntando, como Jesus o fez: "Quem de vós é capaz de me acusar de um só pecado?" Para se fazer um desafio como este é preciso estar em absoluta sintonia com as leis cósmicas. Isso, para mim, é plenitude, bondade. Bondade é estar em sintonia com as leis do infinito. As religiões chamam as leis cósmicas de Deus, eu chamo de leis cósmicas. Esta é a diretriz que o homem integral deve ter em mente: a auto realização de uma pessoa favorece outras. Ninguém pode converter ninguém com palavras. Podemos converter alguém pelo que somos, nunca pelo que dizemos.

- A maior crise do homem moderno continua sendo existencial, uma caótica frustração existencial. No passado o homem tinha perdido seu caminho, agora ele perdeu também o próprio endereço. Não sabe mais qual o seu destino nem a finalidade da sua existência. Chega até a negar a existência de uma finalidade. O homem está perdendo a noção da sua existencialidade. Escritores e filósofos proclamam abertamente que a vida humana não tem finalidade alguma e que o homem é um mero joguete no acaso de nascer, viver e morrer. Esta é à típica visão anti cósmica da existência. É o resultado da instrução do ego periférico, sem a educação do homem integral. Não adianta correr cada vez mais. O que falta ao homem moderno é uma orientação, no meio dessa desorientação geral. Por exemplo: é preciso saber se todo esse progresso científico tem uma razão de ser. O progresso da ciência, para Einstein, é uma coisa maravilhosa. Mas a ciência não pode dar ao homem nenhuma finalidade certa da sua existência terrestre. Esta é a razão da crise existencial que está levando a humanidade à agonia. Os profetas e clarividentes de todos os tempos preveem uma catástrofe universal para o fim do segundo milênio (entrevista dada em março de 1979). Essa tragédia não é outra coisa senão o resultado final da caótica frustração que o homem vive. O homem da frustração existencial é sempre infeliz, mesmo no gozo do sucesso social. O homem da realização existencial é sempre feliz, mesmo sem o gozo do sucesso social.
 

A divisão em felizes e infelizes

A felicidade do homem depende da visão panorâmica que ele tem da sua existência total. Essa visão não abrange apenas os poucos decênios de sua vida terrestre, mas também da vida após a morte. É absolutamente certo que o homem, quando deixa seu corpo material, continua a existir conscientemente em outras regiões do cosmos. A vivência terrestre é uma parcela insignificante da sua existência total. É importante que o homem adquira, aqui na terra, a certeza da sua vivência cósmica. Felicidade não é gozar todos os prazeres, mas viver em harmonia com a verdade, a justiça, a honestidade, o amor, a bondade, a fraternidade universal. Muitas vezes essa harmonia exige sofrimentos e sacrifício, renúncia, e prazeres imediatos. É exatamente aqui que a humanidade se divide em homens felizes e infelizes. A visão panorâmica da existência do homem nada tem a ver com qualquer religião ou filosofia. É uma experiência interna que o homem adquire quando remove de si todos os obstáculos que possam impedi-la. É difícil explicar aos ignorantes em que consiste esta experiência. O homem deve, antes, adivinhar e sentir, como que por empatia, o que é essa experiência da alma do Universo, que é a sua própria alma.

Há quem considere a natureza humana como um depósito de coisas boas e más. Na verdade, não existe nada de bom nem de mau na natureza humana. O bom e o mau só aparecem com o advento do livre-arbítrio, que faz o homem bom e o homem mau. Bom é tudo o que está em harmonia com as leis cósmicas, e mau é o que está em desarmonia. Bom e mau não são fatos objetivos, são valores subjetivos, criações metafísicas. O homem é quem faz existir o que é bom e o que é mau. Ninguém vai receber prêmio por ser bom nem será punido por ser mau. Prêmio e castigo, prometidos de fora para dentro, antes ou depois da morte, não são motivos honestos para ser bom ou deixar de ser mau. A única finalidade da encarnação terrestre do homem é a sua auto realização, e o único desastre é a sua auto frustração.

Einstein tem uma frase que bem poderia ser a bandeira para uma nova educação: "O mundo dos fatos não conduz a nenhum caminho para o mundo dos valores". A educação atual limita-se apenas a fatos, é apenas instrução. E nenhuma instrução, por melhor que seja, aprimora o homem, pois limita-se ao conhecimento de fatos já existentes. O velho slogan "abrir uma escola é fechar uma cadeia" peca por uma ridícula ingenuidade. Os piores criminosos da humanidade não foram analfabetos, muitos deles eram homens eruditos. Abrir uma escola é incentivar a ciência, mas não significa necessariamente intensificar a consciência. Se houvesse consciência suficiente não haveria necessidade de cadeias.

Nem o governo nem as igrejas tratam seriamente a educação, no sentido verdadeiro da palavra. O governo está interessado em instrução científica, e as igrejas limitam-se apenas à moralização. Nem instrução nem moralização tornam o homem melhor. O homem realmente educado é bom e não espera recompensa, nem antes nem depois da morte. É incondicionalmente bom. É um equívoco que as teologias eclesiásticas eduquem o homem para ser bom. Elas apenas transferem o egoísmo terrestre para um egoísmo celeste.

A metafísica de Einstein vale mais para a verdadeira educação do que todas as instruções científicas dos governos e todas as teologias moralizantes das igrejas.

Estou, sim, denunciando os governos e as igrejas como responsáveis pela situação calamitosa da educação. Estamos num vácuo educacional. Governos e igrejas não se interessam pelos valores e sem valores não há educação. Verdade, justiça, amor e honestidade são valores, criações da consciência e não simples descobertas da ciência.
 

A luta entre espírito e matéria

Até meados do século passado era essa a doutrina sobre a origem e natureza do homem: o homem tinha vindo diretamente de Deus, como um ser perfeito, mas o diabo provocou a sua queda; depois da queda, Deus mandou um Salvador à humanidade para restabelecer o que o diabo havia destruído. Desde a segunda metade do século, prevaleceu entre os cientistas a teoria de Darwin sobre a descendência animal do homem. Nem uma nem outra teoria é aceitável pela lógica ou pela história. O homem era, de início, um verdadeiro ser humano, mas no estágio ínfimo da sua evolução. Não houve nenhuma queda. O que houve e continua a haver é uma luta entre os dois princípios básicos da natureza humana: espírito e matéria. A matéria se manifesta, no princípio, como mente que, no Gênesis, aparece na forma simbólica da serpente, enquanto o espírito é chamado de sopro de Deus. A tarefa do homem não consiste em extinguir o elemento mental e desenvolver o lado espiritual. A tarefa da vida e da evolução humana é estabelecer a harmonia entre o sopro de Deus e o sibilo da serpente. O homem é o senhor do seu destino e comandante da sua vida. Deus criou o homem o mínimo possível para que ele se pudesse criar o mais possível.



O Deus que todos odeiam

Parece que a educação religiosa que muitos recebem na infância gera um senso de revolta e mania de vingança. O Deus que eu conheci quando criança era um Deus de temor, não de amor. Me disseram que eu devia temer a Deus, que os homens tementes a Deus eram os santos. Eu pensava que Deus era um papão perigoso para ser tão temido. Por isso, compreendo melhor o que aconteceu a Voltaire, o pai do ateísmo. Perguntado por que não aceitava Deus, ele respondeu: "Não posso aceitar um Deus a quem não posso amar. O Deus que me ensinaram deve ser temido e, como não quero temê-lo, prefiro ignorá-lo".

Lembro dos meus oito anos, quando uma professora piedosa e piegas me preparava para a primeira comunhão. Ela disse que eu não devia esconder nenhum pecado mortal na confissão porque isso era sacrilégio. Eu nem sabia o que era sacrilégio, mas uma palavra tão feia só podia significar coisa ruim. E, para não cometer o tal sacrilégio, copiei do catecismo todos os pecados contra os dez mandamentos, que encontrei, muitos deles mortais. Na hora da confissão, li toda a lista, inclusive os meus homicídios e os meus adultérios. O confessor, vendo um garotinho através da grade do confessionário, não me levou a sério e me absolveu de tudo. Depois, veio o tormento da primeira comunhão. A professora, sempre muito piedosa, me preveniu severamente que eu não podia mastigar a hóstia sagrada, que era o corpo de Jesus. O único jeito era engolir a hóstia, sem deixá-la tocar nos dentes. Para maior segurança contra um possível sacrilégio, cortei, em casa, uma série de hóstias de papel e fui engolindo, uma por uma, sem morder nem encostar nos dentes. Como Voltaire, na minha infância só conheci um Deus e um Cristo que deviam ser temidos. Não sei se não cheguei a odiar secretamente esse papão do além ....

O catolicismo é a religião oficial do Brasil, mas, segundo Tristão de Athayde, apenas 3% da população são católicos praticantes. É que nós chamamos de católicos todos aqueles que são batizados, casam-se e vão ser enterrados segundo os rituais do catolicismo. Se catolicismo fosse isso, poderíamos dizer que o Brasil é um país católico. A verdade é que a umbanda e o espiritismo são as religiões predominantes.
 

O caminho para a auto-realização

Da África só nos vieram religiões de baixíssimo gabarito. Elas são ocultistas, lidam apenas com o subconsciente, com as forças elementais da natureza, nunca com o consciente ou o superconsciente. As religiões avançadas estão no nível do superconsciente, ou seja, atingiram uma consciência acima do ego. As religiões orientais estão neste estágio porque os orientais têm cerca de 7 mil anos de cultura. O Oriente é voltado para dentro de si próprio, para o interior, enquanto o Ocidente prefere as exterioridades. O homem cósmico é a mistura equilibrada de interior e exterior.

- Segundo as leis cósmicas, onde há uma vacuidade acontece uma plenitude. Quem se esvazia totalmente de todos os conteúdos da sua ego consciência será plenificado pela cosmo consciência. Esta invasão da cosmo plenitude na ego vacuidade resolve todos os problemas da vida.
 

A verdade que o Cristo ensinou
 
- Jesus passou três anos falando a seus discípulos sobre um mesmo assunto: "O reino dos céus está dentro de vós, é um tesouro oculto que deveis descobrir, é uma luz debaixo do velador que deveis pôr no candelabro, é uma pérola no fundo do mar que deveis trazer à tona". E, apesar da insistência do melhor de todos os mestres, os cristãos de hoje ainda acham que o reino dos céus só vem depois da morte. É preciso ruminar esses fatos, como vacas que, deitadas à sombra de uma árvore, fazem voltar à boca o capim engolido inteiro.
 
 
Fonte: Instituto Imagick


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