O IMPORTANTE ESTADO
DE PERCEPÇÃO
Estar consciente
constitui
um extraordinário estado da mente.
Escutem o movimento de
seus próprios pensamentos — não os controlem, não os moldem, não digam
"isto está certo, isto está errado". Apenas movam-se com eles. Esta é a
percepção na qual não existem preferências nem condenações, nem juízos,
nem comparação ou interpretação — apenas simples observação. Isso torna
suas mentes altamente sensíveis. Do momento em que dão nome, vocês
regrediram, suas mentes voltam a estar maçantes: porque é isso o que
vocês estão acostumados a fazer.
Neste estado de percepção existe atenção: não controle, não
concentração. Há atenção. Vocês estão atentos a seus próprios
pensamentos e sentimentos e ao movimento que existe nessa atenção. Vocês
estão atentos de uma forma abrangente, sem barreiras, não apenas
conscientemente, mas também inconscientemente. O inconsciente é mais
importante, de maneira que vocês têm que inquirir o inconsciente.
Não estou empregando a palavra inconsciente como uma
palavra técnica ou como uma técnica. Não o estou usando no sentido em
que os psicólogos o fazem, mas como aquilo de que vocês não estão
conscientes. Porque a maioria de nós vive na superfície da mente: indo
para o escritório, adquirindo conhecimento ou dominando uma técnica,
brigando e assim por diante. Nunca prestamos atenção às profundezas de
nosso ser, que resulta de nossa comunidade, dos resíduos raciais, de
todo o passado — não somente no que diz respeito a vocês, como seres
humanos, mas também ao homem, às ansiedades do homem.
Quando vocês
dormem, tudo isso se projeta como sonho e então entra em cena a
interpretação desses sonhos. O sonho, para o homem que está alerta,
acordado, vigilante, consciente, atento, o sonho, para o homem que
escuta, transforma-se numa coisa absolutamente desnecessária.
Agora, essa atenção requer uma tremenda energia; não a energia que vocês
adquiriram através da prática, do celibato e tudo o mais — essa energia
é toda feita de ambição. Estou me referindo à energia do
autoconhecimento. Pelo fato de vocês terem lançado os alicerces certos,
deriva disso a energia necessária para estarem atentos, na qual não
existe o senso de concentração.
Concentração é exclusão se vocês simplesmente se concentram, apenas resistem,
excluem. Mas a mente que está atenta pode se concentrar e não excluir. Assim, desta atenção surge um cérebro que está quieto. As próprias
células cerebrais são quietas — não por terem sido forçadas a ficarem
quietas, a serem disciplinadas, por terem sido obrigadas, por terem sido
brutalmente condicionadas, mas porque toda essa atenção se concretizou
naturalmente, espontaneamente, sem esforço, facilmente, as células
cerebrais não se perverteram, não endureceram, não calejaram, não se
brutalizaram.
Espero que vocês estejam acompanhando tudo isso. A menos
que as células cerebrais estejam extraordinariamente sensíveis, alertas,
cheias de vida, não endurecidas, não machucadas, não sobrecarregadas,
não especializadas num determinado setor do conhecimento, a mesmo que
estejam extraordinariamente sensíveis, não podem estar quietas. Então, o
cérebro precisa estar quieto e ao mesmo tempo sensível a cada reação,
estar consciente de toda música, de todo ruído, dos pássaros, precisa
estar apto a ouvir estas palavras, a admirar o por-do-sol — sem sofrer
qualquer pressão, qualquer tensão, qualquer influência. O cérebro
precisa estar muito quieto porque sem quietude — não induzida, não
suscitada artificialmente — não pode haver clareza.
E a clareza só pode chegar quando há espaço. Vocês terão espaço no
momento que o cérebro estiver absolutamente quieto e no entanto
extraordinariamente sensível, não amortecido. E é por isso que o que
vocês fazem o dia todo é tão importante. O cérebro é brutalizado pelas
circunstâncias, pela sociedade, pelo trabalho, pela especialização,
pelos seus trinta ou quarenta anos trancados em um escritório, se
acabando brutalmente — tudo isso destrói a extraordinária sensibilidade
do cérebro. E o cérebro precisa estar quieto. A partir daí, toda a
mente, na qual o cérebro está incluído, é capaz de ficar absolutamente
quieta.
Esta mente quieta não está mais buscando,
não está mais
aguardando a experiência —
não está experimentando nada mesmo.
Depois a mente se torna absolutamente quieta, sem sofrer nenhum
tipo de pressão, de compulsão. Essa quietude não é uma coisa produzida
pelo pensamento, porque o pensamento cessou, toda a máquina do
pensamento chegou ao fim. O pensamento precisa cessar, caso contrário
gerará mais imagens, mais ideias, mais ilusões — mais, mais e mais.
Portanto, vocês precisam compreender todo esse mecanismo do pensamento —
não como deixar de pensar. Se entenderem todo o mecanismo do
pensamento, que é a resposta da memória, associação e reconhecimento,
denominação, comparação, julgamento — se vocês entendem isso, ele cessa
naturalmente. Quando a mente está completamente quieta, nessa quietude
existe um movimento bem diferente.
Esse movimento não é um movimento criado pelo pensamento, pela
sociedade, pelo que vocês leram ou não leram. Esse movimento não
pertence ao tempo, à experiência, porque esse movimento não tem
experiência. Para uma mente quieta não existe experiência. Uma luz que
está ardendo com muito brilho, que é forte, não precisa de mais nada, é
uma luz para si mesma. Esse movimento não é um movimento voltado a
nenhuma direção, porque direção implica tempo. Esse movimento não tem
causa, porque qualquer coisa que tenha causa produz um efeito e esse
efeito se transforma em causa e assim por diante — numa cadeia
interminável de causas e efeitos. De forma que inexiste, mesmo, efeito,
causa, motivo, senso de experimentação. Pelo fato da mente estar
absolutamente quieta, naturalmente quieta, pelo fato de vocês terem
lançado os alicerces, ela está diretamente relacionada com a vida, não
divorciada da vida cotidiana.
Se a mente chegou a esse ponto, esse movimento é criação. Então não
existe mais ansiedade de expressar, porque a mente que está em estado de
criação pode expressar ou não. Esse estado mental que reina nesse
completo silêncio se moverá, executará seu próprio movimento rumo ao
desconhecido, rumo ao que é inominável.
Portanto, a meditação a que nos referimos não é a meditação que vocês
fazem. A meditação de que falamos parte da eternidade para a eternidade
porque vocês lançaram os alicerces não no tempo, mas na realidade.
Jiddu Krishnamurti
Enquanto estivermos desejando alguma coisa do mundo, ou seja, na expectativa de resultados abstratos ou materiais, estaremos pondo mais lenha na fogueira da mente, no grande apetite ou vontade de ter realizado algo pelo qual tanto 'lutamos' e 'queremos' vê-lo realizado. A mente é semelhante a um computador, claro, bem mais aprimorada e extraordinariamente complexa, mas segue o mesmo princípio: 'search'. Estamos quase sempre pesquisando: Será que isso vai dar certo? Preciso encontrar a fórmula correta... e assim vai. A mente necessita disso: material de pesquisa e resposta para a questão. Por isso não conseguimos acompanhar os nossos pensamentos, pois desejamos coisas demais. Viver no mundo sem pertencer ao mundo é o começo de uma verdadeira meditação. Só podemos perceber nossos pensamentos quando não tivermos mais expectativas. KyraKally
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