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quinta-feira, 19 de dezembro de 2019

A SABEDORIA DO TAO I


A virtude das Águas

A maior das virtudes pode ser contemplada 
nas águas que banham as dez mil criaturas,
e ocupam as fendas e os pântanos,
onde ninguém gostaria de estar.
Por tal motivo, as águas se comparam ao Caminho!

A virtude de uma casa é a sua localização.
A virtude da mente é estar em silêncio e em paz.

A boa sociedade é aquela que busca a virtude.
O bom governo é aquele que busca a ordem.

A virtude do artista é sua habilidade para a arte.
A virtude do movimento é ser executado
no preciso momento.

Mas o sábio é virtuoso sem nunca combater,
e assim nunca pode ser combatido.


A diminuição do brilho 

O Céu e a Terra são resilientes.
Sua resiliência advém do fato 

de não haverem gerado a si mesmos.
E, como tampouco vivem para si mesmos,
possuem longa duração.

Dessa forma o sábio se coloca no último lugar
para chegar a frente de todos.
Trata a si mesmo como um estrangeiro,
diminui o brilho do próprio ego,
e assim, sem nada desejar,
conquista a perfeição que jamais havia buscado.


A fórmula do vazio

O Céu e a Terra não agem como nós,
eles seguem a ordem natural
lidando com todas as coisas como nós lidamos
com os cães de palha nos rituais [1].

Assim também os sábios, ao lidar com as pessoas,
não se preocupam em ser benevolentes,
mas antes em permitir que a natureza dos homens
se mova livremente.

Não poderíamos comparar o espaço entre o Céu 
e a Terra a um par de pulmões gigantescos?

Esvaziam, mas sem se exaurir.
Enchem novamente…
Quanto mais trabalham, mais respiram, 
sem jamais cansar.

Mas quem muito fala, se esgota rapidamente.
Devemos calar e cuidar de nosso interior.
Devemos mantê-lo liberto e vazio, como a natureza.



A fonte sem origem 

O Caminho é como o vazio de um vaso.
Ao utilizá-lo, devemos nos guardar de todo excesso.
Oh, e como é vasto, profundo como um abismo!
É como se fosse o Ancestral de todas as coisas.

Deixemos que as rodas percorram
os velhos sulcos da estrada.
Devemos cegar nossas adagas,
desfazer os nós e diminuir o brilho
para que nos harmonizemos com a escuridão alheia.

Oh, como é puro e tranquilo o Caminho,
pode ser que continue para além do Céu!
Não sei de quem possa ser filho,
pode ser anterior ao próprio Imperador de Jade [2].


O lago da tranquilidade 

Ao não exaltar aqueles que são importantes
evitamos estimular a rivalidade entre os medíocres.
Ao não ostentar as joias raras
evitamos que sejam alvo de ladrões.

Ocultar aquilo que excita o desejo dos homens
faz com que eles permaneçam sem perturbações.

Dessa forma, o sábio governa os homens
mergulhando suas mentes e seus corpos 
na Tranquilidade; preenchendo os últimos
e esvaziando os primeiros.

Ele alivia o povo da angústia do conhecimento vazio
e das garras do desejo desenfreado.
Mas aqueles que alcançaram ao Conhecimento de Si,
ensina a via da não-ação;
pois que quando nos abstemos de intervir
reina suprema a ordem universal.


A harmonia dos opostos 

Todos neste mundo reconhecem a beleza do que é Belo
e, desta forma, reconhecem também a feiura.
Todos neste mundo reconhecem a habilidade dos Habilidosos
e, desta forma, desejam desenvolver tal habilidade.

Da mesma forma, a existência e a não-existência
geram uma a outra.
E assim o longo e o curto se delimitam entre si,
o alto e o baixo surgem de seu próprio contraste,
as notas musicais se harmonizam na própria melodia,
e aquele que veio antes demarca o que veio após.

Com este conhecimento,
o sábio executa suas tarefas sem agir
e ensina sem nada dizer.

Todas as coisas fluem sem timidez.
Elas crescem, e nenhuma interfere no fluxo natural.
Sem expectativas nem orgulho,
elas realizam o que devem realizar.

É a sua falta de apego ao mérito da realização
que faz com que sua energia jamais as abandone.



A fonte de tudo  

O Caminho é vazio e inesgotável,
profundo como um abismo.
É como se fosse o ancestral das dez mil criaturas.
Suavizai o corte
Desfazei os nós
Diminuí o brilho.
Deixai que as rodas percorram os velhos sulcos.
Devemos considerar nosso brilho
a fim de que nos harmonizemos com a escuridão dos outros.
Como é puro e tranquilo o Caminho!
Não sei de quem possa ser filho
pois parece ser anterior ao Soberano do Céu.
 
 
Retirado do Tao Te Ching
 

NOTA:

1] Segundo Murillo Nunes de Azevedo, os “cães de palha” eram usados em rituais antigos como sacrifício, e destroçados impiedosamente. Não se sabe se isto é uma referência a alguma espécie de artesanato, ou a animais vivos (e sacrificados). Aleister Crowley preferiu usar o termo “talismãs usados”. 

2] Segundo Aoi Kuwan (autora do blog Magia Oriental), “o Imperador de Jade, na tradição taoista da China, é o Soberano do Céu, amplamente conhecido como Imperador Celeste. Ele também é chamado de Yuhuang, Yudi, Yuhuand Dadi, Puro Augusto Imperador de Jade e Avô Celestial, dentre outros diversos nomes que abrangem praticamente tudo. Isso porque o Imperador de Jade governa o céu e toda a existência abaixo dele”.

https://www.deldebbio.com.br 
 

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