Translate

sexta-feira, 24 de novembro de 2017

LUXÚRIA MENTAL


Há tempo que abandonei a minha velha luxúria verbal.
Hoje, vivo mais na castidade do silêncio
Do que na prostituição dos ruídos
Entretanto, mil vezes mais difícil
Do que renunciar à profanidade verbal
Me foi superar a luxúria mental.
Ainda por largo tempo,
Após a renúncia à incontinência das palavras
Continuou o meu cérebro praça pública
Profanada pelo tropel indisciplinado
De pensamentos rebeldes e vagabundos...
Pensamentos que iam e vinham,
Desordenadamente,
Sem licença nem seleção...
Era tão jucundo pensar à toa,
Divagar e devanear,
Espojar-se nas areias fofas dessa indisciplina mental...
E, quando a minha alma acordou
E resolveu fazer dessa praça profana
Um santuário do espírito –
Foi violenta a rebeldia do meu lúcifer...
Ele, que, por tanto tempo,
Fora senhor e soberano da minha vida,
Abdicar do seu governo?...
Ceder o cetro ao meu Eu divino?...
Quem era esse Eu?
Esse ignoto Alguém que se arvorava em soberano?
E a minha luxúria mental continuou por largo tempo...
Continuei a banhar-me voluptuosamente
Nas tépidas carícias do pensamento...
Assistindo, cheio de prazer,
A essa deslumbrante sucessão
De fogos de artifício,
A esse estonteante doidejar
Dos vaga-lumes cerebrais,
Em plena noite tropical...
Era tão inebriante esse devaneio
Das fantásticas bolhas multicores,
A bailarem no espaço vazio do meu interior...
Que seria de mim se eu sustasse
Essa torrente mental?...
Não era eu mesmo essa cachoeira de pensamentos?...
Se ela parasse, onde estaria eu?
Que sobraria de mim?...
Não me sumiria nas fauces do nada?
Não cometeria abominável suicídio?...

Assim falava a minha mente,
Que sempre mente
Tão sagazmente...
Que desnorteia a verdade
E impinge as suas inconsistentes miragens
Pela sólida Realidade
Eu, porém, sentia dentro de mim,
Dentro do meu centro divino,
Um anseio imenso de verdade e segurança.
Nauseado do sacrilégio da minha luxúria mental,
Suspirava pela sacralidade da virgindade espiritual...
Vislumbrava ao longe, muito ao longe,
Para alem dos áridos desertos da mente humana,
Os altos Himalaias do espírito divino.
E aos poucos, muito aos poucos,
Re-virginei a minha alma
Prostituída pela indisciplina mental.
Impus silêncio ao meu ruidoso pensar,
Fiz calar o meu inteligir,
Sustei o barulhento caos
Das minhas arrogantes análises,
A insolência dos meus silogismos,
A impertinência das minhas deduções,
A complacente mesquinhez das minhas acrobacias cerebrais.

E fez-se uma grande silêncio dentro de mim...
Tão vasto e profundo era esse silêncio
Que nele percebi a voz de Deus
A falar-me,
Assim como o grande silêncio fala ao pequeno silêncio...
E minha alma silente compreendeu
Essa voz do silêncio......
E agora me sinto puro,
Silenciosamente puro,
Agora me sinto vazio,
Poderosamente vazio,
Porque o ocaso da minha profanidade mental
Expirou na alvorada da minha sacralidade espiritual...


Huberto Rohden
Fonte:http://www.academiadeletrasdepalhoca.com.br
 

Nenhum comentário:

Postar um comentário