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segunda-feira, 1 de março de 2021

 A VIDA É UM LUGAR DE CURA

Parte I

Todos precisamos sarar, de diferentes modos e em tempos diferentes, física, emocional ou espiritualmente. Não há vergonha nisso, embora a nossa necessidade de cura seja, muitas vezes, sentida como uma fraqueza que deveríamos esconder dos outros, como escondemos as nossas partes privadas ao vestir-nos bem.   

Ser visto como uma “imagem de saúde” é gratificante e, quando encontramos alguém, é frequente elogiar-nos uns aos outros com: “Que bom vê-lo; está com tão bom aspecto!”   

Depois, por precaução, acrescentamos: “Como é que tem passado?” Porém, a saúde mais profunda e a plenitude não são estados que consigamos assegurar do mesmo modo que criamos um plano de reforma.   

A saúde profunda não é nem uma posse nem o resultado da sorte. É um dom que flui continuamente, através do processo de cura. Não nos podemos agarrar a ele porque está sempre a preparar-se para o estágio seguinte da viagem.

O hospital da vida dá as boas-vindas tanto aos saudáveis como aos doentes. A distinção entre estes dois estados da vida não é tão exclusiva quanto possa parecer. 

Como é que sabemos que o médico que está a tratar o nosso braço partido não acabou de ser diagnosticado com uma doença terminal? Ou que, talvez, o choque desse diagnóstico venha conduzir a uma integração mais rica da personalidade, a uma reconciliação das partes destroçadas da pessoa e uma melhor capacidade de amar os outros?

Os sintomas de saúde e os sintomas de doença são muito diferentes. A ordem, a harmonia, a paz mental, a flexibilidade, a espontaneidade, a beleza atraente (por um lado) e o caos, a violência, a agressividade, o desequilíbrio e a repugnância natural (por outro lado). Porém o pior pode ser transposto para o melhor.

Começa pela aceitação.

O primeiro passo pode ser o mais difícil. 

As piores notícias criam, naturalmente, a tentação de negar aquilo de que não gostamos. Vemos isso demonstrado em conferências de imprensa políticas e em entrevistas todos os dias e que se podem tornar auto convincentes e acabarmos acreditando nas falsas notícias que estamos a ouvir-ver-ler.

O primeiro passo é sermos honestos conosco mesmos e com os outros.
Depois da aceitação vem a adaptação.

Estar encarcerado e desumanizado pode provocar uma enorme negação e um desespero zangado, mas, com o tempo e com ajuda, a aceitação conduz também à auto adaptação. Então, aprender a meditar transforma-se numa profunda cura da vergonha pelo passado e numa reintegração do “eu” dividido. Depois de nos vermos como rejeitados, encontramos um novo respeito próprio no autoconhecimento e na sabedoria.   

Porque pensa na prisão como uma punição e, apenas formalmente, como reabilitação, o sistema penal raramente repara no tipo de transformação pessoal que muda para melhor os presos. Quanto melhor um curador conhece a natureza da doença, melhor a pode tratar.

A doença e a má sorte, muitas vezes, despertam um sentimento de culpa ou responsabilidade, sejamos nós ou outros quem sofre. O ego crê que Deus recompensa os bons e aflige os maus. O ego é sempre muito sensível à sua reputação. Porém, o facto de ocorrer a cura denuncia esta falácia. 

As feridas podem curar, a doença pode trazer uma saúde mais profunda do que alguma vez conhecemos e ser-se esmagado pode evoluir para ser-se reerguido mais alto e mais saudável do que poderíamos ter imaginado. Mais ainda, o sofrimento pode ser redentor.

Na Mitologia Grega, a primeira coisa a existir, sem uma fonte parental, foi o Caos. Era o vazio, o nada de que tudo, até os deuses, emerge. É o submundo da escuridão e da lama. A palavra quer dizer buraco ou abismo porque é o espaço entre o céu e a terra. 

É preciso compreender o mito de forma psicológica.   

Quando a doença nos assoberba, mental ou fisicamente, mergulhamos no caos interior. Um abismo de separação abre-se entre nós como éramos e nós como somos agora. Não conseguimos relacionar-nos com nada nem com ninguém como anteriormente. Não gostamos do caos e estamos muitas vezes prontos a assumir falsos compromissos, a negar o que é evidente, a isolar-nos dos outros para evitarmos cair no abismo.

No entanto, negar o sofrimento ou a perda significa negar a nossa necessidade de cura.   

Com custos crescentes para o nosso bem-estar e sanidade, mantemos as aparências, como se nada tivesse acontecido.   

A geração dos meus pais era resiliente e contava consigo própria de uma forma que os seus filhos bem podem invejar.   

Mas também, muitas vezes, as pessoas escondiam os seus sentimentos e recusavam-se a pedir ajuda quando dela mais precisavam.   

Os seus mecanismos de sobrevivência foram formados pelo século mais violento da História humana, mas a própria repressão é uma violência contra nós mesmos.   

Hoje em dia, a repressão é ainda mais fácil. A realidade virtual está na ponta dos nossos dedos.   

O clique do rato(mouse) e o engolir duma pílula transportam-nos para outro mundo onde sentimos, por um tempo, que temos o controlo e que escolhemos o que quisermos para nos fazer sentir melhor .... ILUSÕES ....... de um doente que rejeita a cura pela Realidade que pode ser dor e sofrimento.

A tecnologia parece, muitas vezes, suspeita às pessoas de orientação espiritual. A ciência e os objetos tecnológicos são, muitas vezes, empregados ao serviço do ego narcisista. No entanto, no final, o irreal passa por uma morte inevitável e a repressão e a autoilusão, as falsas aparências colapsam. Há uma oposição entre a tecnologia e o divino que fazia com que fosse mais fácil as pessoas, numa cultura tecnológica, caírem no caos.

As amizades do Facebook podem oferecer algum alivio face à solidão do espaço digital que habitam; mas, tal como todas as falsas consolações, desilude-os e trai quem eles são em profundidade.

O caos está sempre a ameaçar tomar conta da existência humana, sugar de nós a esperança.O abismo da nossa mortalidade e das dores da perda e da separação desestabilizam constantemente a segurança de que precisamos para crescer.   

A vida é um hospital movimentado. Temos que assegurar que seja quem for que conheçamos ou com quem trabalhemos, neste lugar de cura, encontra as boas-vindas.

http://acaminhodacasa.blogspot.com

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