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sexta-feira, 20 de novembro de 2020

MOMENTOS COM THOMAS MERTON

Não vamos para o deserto com o intuito de fugir das criaturas e sim para  aprender como encontrá-las. | Espaço de Sol Trechos de livros e Pensamentos

Entregar-se, dar-se, confiar-se completamente ao silêncio de uma vasta paisagem de bosques e colinas ou mar ou deserto; ficar sentado, imóvel, enquanto o sol desponta sobre a terra e enche de luz o silêncio. Orar a trabalhar pela manhã e dar-se ao labor da meditação ao entardecer quando a noite cai sobre a terra e quando o silêncio se enche de escuridão e estrelas. Essa é uma verdadeira vocação especial. Poucos há que estejam dispostos a pertencer inteiramente a um tal silêncio, a deixa-lo penetrar até os ossos, a nada respirar a não ser o silêncio, a se nutrir de silêncio e a transformar a própria substância da vida em um silêncio vivo e vigilante.

Não podemos deixar de errar o principal em quase tudo que fazemos. Que tem isso? A vida não é questão de tirar algo de cada coisa. A vida em si é imperfeita. Todas as coisas criadas principiam a morrer na mesma hora em que começam a viver, e ninguém espera de qualquer delas que chegue a uma absoluta perfeição e muito menos que nela se mantenha. Cada indivíduo é apenas um esboço da perfeição específica prevista para o seu gênero. Por que exigir mais do que isso?

Um curso de literatura jamais deveria ser um curso de economia ou filosofia, de sociologia ou psicologia. E já expliquei antes como essa era uma das grandes virtudes de Mark; não se deixar levar por tais coisas. Não resta dúvida que o material da literatura e principalmente do drama são os atos tipicamente humanos – isto é, atos livres, atos morais. E, na verdade, só a literatura, o drama, a poesia podem afirmar certas declarações sobre tais atos e que não podem ser feitas por outras formas. É precisamente por isso que se perderá todo profundíssimo significado de Shakespeare, de Dante e de outros se se reduzir seus conceitos vitais e criadores sobre a vida e os homens a termos secos, sintéticos, de história, de ética ou de qualquer outra ciência, que pertencem a uma ordem diferente.

Sem dúvida a grande força de obras como Hamlet, Coriolano, o Purgatório ou Os Sonetos Sacros de Donne jaz indiscutivelmente no fato de serem uma espécie de comentário sobre ética, psicologia e mesmo filosofia e teologia.

Para mim, a atitude ‘mundana’ que creio ser nefasta não é apenas ‘voltar-se para o mundo’, nem mesmo a secularização total que se quer sem compromissos, da turma do ‘honest to God’. É ainda menos a nobre preocupação pela justiça social e pelo bom emprego da tecnologia a serviço das verdadeiras necessidades do homem em sua indigência e seu desespero. O que quero dizer por ‘mundanidade’ é o envolvimento na absurda e maciça mitologia da cultura tecnológica e em todas as invenções obsessivas de sua mente vazia. Um dos sintomas disso é precisamente a angustiada preocupação de manter-se em dia com a fictícia, sempre variável e complexa ortodoxia em matéria de gosto, política, culto, credo, teologia e que sei mais — um cultivar o jeito de redefinir, dia a dia, a própria identidade em harmonia com a autodefinição da sociedade. ‘Mundanidade’, a meu ver, é típico dessa espécie de servidão em relação ao cuidado com as aparências e a ilusão, essa agitação em torno de pensar os pensamentos certos e usar os chapéus corretos; essa vulgar e vergonhosa preocupação, não com a verdade, mas apenas com aquilo que está em voga. A meu ver, a preocupação dos cristãos em manterem-se na moda por medo de ‘perderem o mundo’ é apenas mais uma lamentável admissão de que já o perderam.

https://tmerton.wordpress.com

 

A vida espiritual se resume em amar. E o amor, é claro, significa mais que sentimento, mais que caridade, mais que proteção. O amor é a identificação completa com a pessoa amada – sem a intenção de “fazer o bem” ou “ajudar”. 

Quando se tenta fazer o bem através do amor, é porque estamos vendo o próximo como um simples objeto, e estamos vendo a nós mesmos como pessoas generosas, cultas, e sábias. Isto, muitas vezes, pode resultar numa atitude dura, dominante, brutal. 

Amar é comungar com quem se ama. Ama teu próximo como a ti mesmo, com humildade, discrição, e reverência. Só assim é possível entrar no santuário do coração alheio.  

http://tulioragozo.blogspot.com

 

A humildade é a única chave que dá acesso à fé, início da vida espiritual. Pois fé e humildade são inseparáveis. Na perfeita humildade desaparece todo o egoísmo e a alma não vive mais para si nem em si mesma para Deus; na humildade a alma se perde de vista, mergulha em Deus e é nele transformada.

Tenho uma forma muito simples de orar, inteiramente centrada na atenção à presença de Deus, à sua vontade e ao seu amor. O que significa que está centrada na fé, que é o único meio que nos permite reconhecer a presença de Deus. Poder-se-ia dizer que isso confere à minha meditação o caráter descrito pelo profeta: "estar diante de Deus como se o víssemos", o que, por outra parte, não significa de modo algum conceber uma imagem precisa de Deus, pois para a minha mente isso seria uma espécie de idolatria. Pelo contrário, trata-se de o adorar como invisível e como infinitamente para além da nossa compreensão; é darmo-nos conta de que Ele é tudo. A minha oração parece-se muito com a que os senhores chamam fana. Há no meu coração esse grande anseio de reconhecer plenamente o nada de tudo o que não é Deus. A minha oração é, pois, uma espécie de louvor que brota do próprio centro do Nada e do Silêncio.

O verdadeiro contemplativo não é aquele que se dispõe a acolher a mensagem que deseja ou espera escutar, mas aquele que permanece vazio pelo facto de saber que nunca poderá conhecer antecipadamente as palavras que transformarão em luz a sua escuridão. Mais, nem sequer ousa precipitar qualquer transformação em particular. Não pede luz em vez de escuridão. Espera pela Palavra de Deus em silêncio e, quando é “respondido”, não é tanto por alguma palavra que irrompa do silêncio, mas pelo seu próprio silêncio, que, repentinamente e de modo inexplicável, se lhe revela como palavra de enorme poder, cheia da voz de Deus.

Em certo sentido, estamos sempre a viajar, e a viajar como se não soubéssemos para onde vamos. Noutro sentido, já chegamos mesmo.Não podendo chegar à perfeita posse de Deus nesta vida, estaremos sempre de viagem no meio de trevas. Porém, já o possuímos pela graça, e, nesse sentido, já chegámos e habitamos na luz. Mas, ai, que longe tenho de ir para Te encontrar, para chegar a quem já cheguei!   

No fim das contas, o problema da sinceridade é um problema de amor. Sincero não é tanto o homem que vê a verdade e a manifesta tal qual a vê, mas o que lhe tem um puro amor. Mas, a verdade é mais do que uma abstração. Ela vive, e incorpora-se aos homens e às coisas, que são reais. Assim, não se deve procurar o segredo da sinceridade num amor filosófico da verdade abstrata, mas num amor por pessoa e coisas concretas, um amor de Deus, aprendido na realidade ambiente.

É difícil exprimir em palavras a importância dessa noção. O problema fundamental do nosso tempo não é falta de conhecimento, mas falta de amor. Se os homens simplesmente se amassem entre si, não teriam dificuldade em confiar-se reciprocamente, e em partilhar uns com os outros a verdade. Se todos tivessem caridade, achariam a Deus facilmente.

O profundo mistério do meu ser frequentemente é-me ocultado pelo conceito que faço de mim mesmo. A ideia que faço de mim mesmo é falsificada pela admiração que tenho pelos meus atos. E as ilusões que acalento a meu respeito são produzidas pelo contágio das ilusões de outros homens. Cada qual procura imitar a imaginária grandeza do outro.

Se não me conheço, é porque penso ser a espécie de pessoa que o meu círculo desejaria que eu fosse. Talvez nunca me tenha perguntado se realmente desejo ser aquilo que os outros parecem querer de mim. Se somente me desse conta de que não admiro o que todos parecem admirar, talvez começasse a viver realmente. Passaria a libertar-me do doloroso dever de dizer o que realmente não penso e de agir de uma forma que atraiçoa a verdade de Deus e a integridade da minha alma.

Na realidade, o amor é uma força positiva, um poder espiritual transcendente. É, de fato, o poder criativo mais profundo na natureza humana. Enraizado nas riquezas biológicas de nossa herança, o amor floresce espiritualmente como liberdade e como resposta da criatura à vida num encontro perfeito com uma outra pessoa. É uma apreciação viva da vida como valor e como dom. Responde à fecundidade, à variedade e à total riqueza da própria experiência viva; ele "conhece" o mistério interior da vida. Deleita-se com a vida como uma fortuna inesgotável. O amor aprecia essa fortuna de uma maneira impossível ao conhecimento. O amor tem a sua própria sabedoria, sua própria ciência, sua própria maneira de explorar as profundezas interiores da vida no mistério da pessoa amada. O amor sabe, compreende e satisfaz as exigências da vida, na medida em que responde com calor, abandono e entrega.

Quando ajo de forma desapegada, livre e conscienciosa, estou trabalhando bem, estou agindo como instrumento de Deus. Então estou em plena consonância com a grande obra que não entendo, dando minha pequena contribuição. A verdadeira alegria e recompensa que há de vir é um constante senso de gratidão por ser isso. Vendo-o assim, o seu trabalho se torna fonte de paz e uma verdadeira oração.
 

https://sonho_realidade.blogs.sapo.pt

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