MOMENTOS COM THOMAS MERTON
Trechos de livros e Pensamentos
Entregar-se,
dar-se, confiar-se completamente ao silêncio de uma vasta paisagem de
bosques e colinas ou mar ou deserto; ficar sentado, imóvel, enquanto o
sol desponta sobre a terra e enche de luz o silêncio. Orar a trabalhar
pela manhã e dar-se ao labor da meditação ao entardecer quando a noite
cai sobre a terra e quando o silêncio se enche de escuridão e estrelas.
Essa é uma verdadeira vocação especial. Poucos há que estejam dispostos a
pertencer inteiramente a um tal silêncio, a deixa-lo penetrar até os
ossos, a nada respirar a não ser o silêncio, a se nutrir de silêncio e a
transformar a própria substância da vida em um silêncio vivo e
vigilante.
Não podemos deixar de errar o principal em quase tudo que fazemos. Que
tem isso? A vida não é questão de tirar algo de cada coisa. A vida em si
é imperfeita. Todas as coisas criadas principiam a morrer na mesma hora
em que começam a viver, e ninguém espera de qualquer delas que chegue a
uma absoluta perfeição e muito menos que nela se mantenha. Cada
indivíduo é apenas um esboço da perfeição específica prevista para o seu
gênero. Por que exigir mais do que isso?
Um
curso de literatura jamais deveria ser um curso de economia ou
filosofia, de sociologia ou psicologia. E já expliquei antes como essa
era uma das grandes virtudes de Mark; não se deixar levar por tais
coisas. Não resta dúvida que o material da literatura e principalmente
do drama são os atos tipicamente humanos – isto é, atos livres, atos
morais. E, na verdade, só a literatura, o drama, a poesia podem afirmar
certas declarações sobre tais atos e que não podem ser feitas por outras
formas. É precisamente por isso que se perderá todo profundíssimo
significado de Shakespeare, de Dante e de outros se se reduzir seus
conceitos vitais e criadores sobre a vida e os homens a termos secos,
sintéticos, de história, de ética ou de qualquer outra ciência, que
pertencem a uma ordem diferente.
Sem
dúvida a grande força de obras como Hamlet, Coriolano, o Purgatório ou
Os Sonetos Sacros de Donne jaz indiscutivelmente no fato de serem uma
espécie de comentário sobre ética, psicologia e mesmo filosofia e
teologia.
Para mim, a atitude ‘mundana’ que creio ser nefasta não é apenas
‘voltar-se para o mundo’, nem mesmo a secularização total que se quer
sem compromissos, da turma do ‘honest to God’. É ainda menos a nobre
preocupação pela justiça social e pelo bom emprego da tecnologia a
serviço das verdadeiras necessidades do homem em sua indigência e seu
desespero. O que quero dizer por ‘mundanidade’ é o envolvimento na
absurda e maciça mitologia da cultura tecnológica e em todas as
invenções obsessivas de sua mente vazia. Um dos sintomas disso é
precisamente a angustiada preocupação de manter-se em dia com a
fictícia, sempre variável e complexa ortodoxia em matéria de gosto,
política, culto, credo, teologia e que sei mais — um cultivar o jeito de
redefinir, dia a dia, a própria identidade em harmonia com a
autodefinição da sociedade. ‘Mundanidade’, a meu ver, é típico dessa
espécie de servidão em relação ao cuidado com as aparências e a ilusão,
essa agitação em torno de pensar os pensamentos certos e usar os chapéus
corretos; essa vulgar e vergonhosa preocupação, não com a verdade, mas
apenas com aquilo que está em voga. A meu ver, a preocupação dos
cristãos em manterem-se na moda por medo de ‘perderem o mundo’ é apenas
mais uma lamentável admissão de que já o perderam.
https://tmerton.wordpress.com
A vida espiritual se resume em amar. E o amor, é claro, significa mais que sentimento, mais que caridade, mais que proteção. O amor é a identificação completa com a pessoa amada – sem a intenção de “fazer o bem” ou “ajudar”.
Quando se tenta fazer o bem através do amor, é porque estamos vendo o próximo como um simples objeto, e estamos vendo a nós mesmos como pessoas generosas, cultas, e sábias. Isto, muitas vezes, pode resultar numa atitude dura, dominante, brutal.
Amar é comungar com quem se ama. Ama teu próximo como a ti mesmo, com humildade, discrição, e reverência. Só assim é possível entrar no santuário do coração alheio.
http://tulioragozo.blogspot.com
A
humildade é a única chave que dá acesso à fé, início da vida
espiritual. Pois fé e humildade são inseparáveis. Na perfeita humildade
desaparece todo o egoísmo e a alma não vive mais para si nem em si mesma
para Deus; na humildade a alma se perde de vista, mergulha em Deus e é
nele transformada.
Tenho
uma forma muito simples de orar, inteiramente centrada na atenção à
presença de Deus, à sua vontade e ao seu amor. O que significa que está
centrada na fé, que é o único meio que nos permite reconhecer a presença
de Deus. Poder-se-ia dizer que isso confere à minha meditação o
caráter descrito pelo profeta: "estar diante de Deus como se o
víssemos", o que, por outra parte, não significa de modo algum conceber
uma imagem precisa de Deus, pois para a minha mente isso seria uma
espécie de idolatria. Pelo contrário, trata-se de o adorar como
invisível e como infinitamente para além da nossa compreensão; é
darmo-nos conta de que Ele é tudo. A minha oração parece-se muito com a
que os senhores chamam fana. Há no meu coração esse grande anseio de
reconhecer plenamente o nada de tudo o que não é Deus. A minha oração é,
pois, uma espécie de louvor que brota do próprio centro do Nada e do
Silêncio.
O
verdadeiro contemplativo não é aquele que se dispõe a acolher a
mensagem que deseja ou espera escutar, mas aquele que permanece vazio
pelo facto de saber que nunca poderá conhecer antecipadamente as
palavras que transformarão em luz a sua escuridão. Mais, nem sequer
ousa precipitar qualquer transformação em particular. Não pede luz em
vez de escuridão. Espera pela Palavra de Deus em silêncio e, quando é
“respondido”, não é tanto por alguma palavra que irrompa do silêncio,
mas pelo seu próprio silêncio, que, repentinamente e de modo
inexplicável, se lhe revela como palavra de enorme poder, cheia da voz
de Deus.
Em
certo sentido, estamos sempre a viajar, e a viajar como se não
soubéssemos para onde vamos. Noutro sentido, já chegamos mesmo.Não
podendo chegar à perfeita posse de Deus nesta vida, estaremos sempre de
viagem no meio de trevas. Porém, já o possuímos pela graça, e, nesse
sentido, já chegámos e habitamos na luz. Mas, ai, que longe tenho de ir
para Te encontrar, para chegar a quem já cheguei!
No
fim das contas, o problema da sinceridade é um problema de amor.
Sincero não é tanto o homem que vê a verdade e a manifesta tal qual a
vê, mas o que lhe tem um puro amor. Mas, a verdade é mais do que uma
abstração. Ela vive, e incorpora-se aos homens e às coisas, que são
reais. Assim, não se deve procurar o segredo da sinceridade num amor
filosófico da verdade abstrata, mas num amor por pessoa e coisas
concretas, um amor de Deus, aprendido na realidade ambiente.
É
difícil exprimir em palavras a importância dessa noção. O problema
fundamental do nosso tempo não é falta de conhecimento, mas falta de
amor. Se os homens simplesmente se amassem entre si, não teriam
dificuldade em confiar-se reciprocamente, e em partilhar uns com os
outros a verdade. Se todos tivessem caridade, achariam a Deus
facilmente.
O
profundo mistério do meu ser frequentemente é-me ocultado pelo conceito
que faço de mim mesmo. A ideia que faço de mim mesmo é falsificada pela
admiração que tenho pelos meus atos. E as ilusões que acalento a meu
respeito são produzidas pelo contágio das ilusões de outros homens. Cada
qual procura imitar a imaginária grandeza do outro.
Se
não me conheço, é porque penso ser a espécie de pessoa que o meu
círculo desejaria que eu fosse. Talvez nunca me tenha perguntado se
realmente desejo ser aquilo que os outros parecem querer de mim. Se
somente me desse conta de que não admiro o que todos parecem admirar,
talvez começasse a viver realmente. Passaria a libertar-me do doloroso
dever de dizer o que realmente não penso e de agir de uma forma que
atraiçoa a verdade de Deus e a integridade da minha alma.
Na
realidade, o amor é uma força positiva, um poder espiritual
transcendente. É, de fato, o poder criativo mais profundo na natureza
humana. Enraizado nas riquezas biológicas de nossa herança, o amor
floresce espiritualmente como liberdade e como resposta da criatura à
vida num encontro perfeito com uma outra pessoa. É uma apreciação viva
da vida como valor e como dom. Responde à fecundidade, à variedade e à
total riqueza da própria experiência viva; ele "conhece" o mistério
interior da vida. Deleita-se com a vida como uma fortuna inesgotável. O
amor aprecia essa fortuna de uma maneira impossível ao conhecimento. O
amor tem a sua própria sabedoria, sua própria ciência, sua própria
maneira de explorar as profundezas interiores da vida no mistério da
pessoa amada. O amor sabe, compreende e satisfaz as exigências da vida,
na medida em que responde com calor, abandono e entrega.
Quando
ajo de forma desapegada, livre e conscienciosa, estou trabalhando bem,
estou agindo como instrumento de Deus. Então estou em plena consonância
com a grande obra que não entendo, dando minha pequena contribuição. A
verdadeira alegria e recompensa que há de vir é um constante senso de
gratidão por ser isso. Vendo-o assim, o seu trabalho se torna fonte de
paz e uma verdadeira oração.
https://sonho_realidade.blogs.sapo.pt
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