Translate

segunda-feira, 1 de abril de 2019

CONFIANDO NA ALEGRIA


O tipo de nascimento que temos na próxima vida é determinado então pela natureza de nossas ações nesta vida. E é importante não esquecer nunca que o efeito das nossas ações depende inteiramente da intenção ou motivação que está por trás delas, e não da sua magnitude.

No tempo do Buda vivia uma velha mendiga chamada “Confiando na Alegria”. Ela observava os reis, príncipes e o povo em geral fazendo oferendas ao Buda e a seus discípulos, e não havia nada que quisesse mais do que poder fazer o mesmo. Saiu então pedindo esmolas, mas ao fim do dia não havia conseguido mais do que uma moedinha. Levou-a ao mercador para tentar trocá-la por algum óleo, mas ele lhe disse que aquilo não dava para comprar nada. Quando soube que ela queria fazer uma oferenda ao Buda, encheu-se de pena e deu-lhe o óleo que queria. A mendiga foi para o mosteiro e acendeu uma lâmpada. Colocou-a diante do Buda e fez o seguinte pedido: “Nada tenho a oferecer senão esta pequena lâmpada. Mas com esta oferenda, possa eu no futuro ser abençoada com a lâmpada da sabedoria. Possa eu libertar todos os seres das suas trevas, purificar todos os seus obscurecimentos e levá-los à iluminação”.

Durante a noite, o óleo de todas as outras lâmpadas se acabou. Mas a lâmpada da mendiga ainda queimava na alvorada, quando Maudgalyayana, o discípulo do Buda, chegou para recolher as lâmpadas. Ao ver aquela única ainda brilhando, cheia de óleo e com pavio novo, pensou: “Não há razão para que essa lâmpada continue ainda queimando durante o dia”, e tentou apagá-la. Mas ela continuou queimando. Tentou apagar a chama com os dedos, mas foi inútil. Tentou abafá-la com suas vestes, mas ela ainda ardia. O Buda o observava há algum tempo, e disse: “Maudgalyayana, você quer apagar essa lâmpada? Não vai conseguir. Não conseguiria nem movê-la daí, que dirá apagá-la. Se jogasse nela toda a água dos oceanos ainda assim não adiantaria. A água de todos os rios e lagos do mundo não poderia extinguir essa chama. Por que não? Porque ela foi oferecida com devoção e pureza de coração e mente. E essa motivação produziu um enorme benefício”. Quando o Buda terminou de falar, a mendiga se aproximou e ele profetizou que no futuro ela se tornaria um perfeito buda, conhecido como “Luz da Lâmpada”.

É a nossa motivação, portanto, seja ela boa ou má, que determina os frutos da nossa ação. Shantideva disse:

Toda a alegria que há neste mundo
Vem do desejo de que os outros sejam felizes,
E toda a dor que há neste mundo
Vem do desejo de que eu mesmo seja feliz.

Como a lei do carma é inevitável e infalível, sempre que fazemos mal aos outros estamos diretamente fazendo mal a nós mesmos, e sempre que os fazemos felizes, estamos trazendo futura felicidade para nós mesmos. Assim diz o Dalai Lama:

Se fosse tentar dominar seus impulsos egoístas – raiva e assim por diante – e desenvolver mais bondade e compaixão pelos outros, no fim você mesmo estará se beneficiando mais do que estaria de outra forma. Por isso às vezes digo que o egoísta sábio deveria praticar desse modo. Os egoístas tolos estão sempre pensando em si mesmos, e o resultado disso é negativo. Os egoístas sábios pensam nos demais, ajudando-nos o quanto podem, e o resultado é que também eles recebem benefícios.

A crença na reencarnação mostra-nos que há no universo uma espécie de justiça e bondade suprema. É essa bondade que todos estamos querendo descobrir e libertar. Sempre que agimos positivamente, movemo-nos na direção dela; sempre que agimos negativamente, nós a obscurecemos e a inibimos. E sempre que não podemos expressá-la em nossas vidas e ações sentimo-nos infelizes e frustrados.

Assim, se tivesse de tirar uma mensagem essencial do fato da reencarnação, seria esta: desenvolva esse bom coração que deseja ardentemente que os outros seres encontrem felicidade duradoura, e age para assegurá-la. Nutra e pratique a bondade. Disse o Dalai Lama: "Não há necessidade de templos, nenhuma necessidade de filosofias complicadas. Nosso próprio cérebro, nosso próprio coração é nosso templo; minha filosofia é a bondade".


Sogyal Rinpoche “O Livro Tibetano do Viver e do Morrer”
http://darma.info

Nenhum comentário:

Postar um comentário