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segunda-feira, 13 de agosto de 2018

A DIFICULDADE DA 
ATENÇÃO TOTAL
 
 
Última Parte
 
Pergunta: Se vemos as coisas como são, com atenção total, com percebimento sem escolha, que acontece em relação às várias formas de arte, principalmente aquelas que se relacionam com a palavra?

Krishnamurti: A beleza é coisa construída pelo homem? A beleza é questão de capacidade ou gosto pessoal? Ou é a beleza algo que transcende o pensamento e o sentimento, algo que nada tem que ver com capacidade, inclinação, simpatia e antipatia pessoal?

E que necessidade há de expressão? Podeis expressar uma dada coisa em palavras, na forma de uma poesia; podeis expressá-la na tela ou no mármore; podeis expressá-la na cozinha, ou no segurar a mão de outra pessoa. Mas, que necessidade há de expressão? Não estou dizendo que não deveis expressar-vos. Podeis expressar uma coisa qualquer, pô-la em palavras; mas a palavra não é a coisa. O símbolo nunca é o real. Mas vós expressastes a coisa e, porque sois dotado de capacidade ou talento, essa expressão se torna significativa; tem um valor, proporciona lucro, aplausos, popularidade.

Ora, como dizia, na atenção total há uma criação que não se pode exprimir em palavras, símbolos, ideias. Ela é energia total. Eu posso ter o dom de escrever poesias; mas, como posso definir essa energia total, essa coisa extraordinária chamada criação? Se não gostais da palavra “criação”, escolhei outro nome: “Deus”, “cachorro”, qualquer nome serve. Uma pessoa sente, talvez, que existe essa coisa — um movimento de criação, uma imensidade, uma atemporalidade. Entretanto, como expressar em palavras o imensurável? E, mesmo, quando o expressamos, a expressão não é a própria coisa. Assim, que valor, que importância, que significação tem a poesia para o homem ou a mulher que compreendeu essa atenção completa? Tem essa poesia necessidade de sair de casa para contemplar obras de arte, visitar museus, assistir a concertos? Entendeis? Quem bebeu na fonte da criação, de que mais necessita?

Mas, para a maioria de nós a arte, a poesia, ou a música se tornou muito importante. Somos como os assistentes de uma partida de futebol a observar os jogadores. Poucos estão jogando, e milhares assistindo. Porém, depois de vos desembaraçardes completamente da estrutura psicológica da sociedade, que importância tem a palavra, a forma, o som, o símbolo?

Receio que estejais escutando o orador na esperança de que ele vos ponha milagrosamente naquele estado ou a ele vos conduza. Mas tal não é possível. Para isso tendes de trabalhar intensamente. Requer-se uma energia imensa para ouvir corretamente. Impõe-se toda a vossa atenção, para destruir a vossa desatenção, e não há, então, distração de espécie alguma. Não existe distração, em tempo algum, para o homem atento. Já para o homem concentrado há sempre distração.
 
A arte, é claro, tem seu lugar próprio; mas a coisa não acaba aí. Só quando sois capaz de ultrapassar a arte, de superar a beleza criada pelo homem, só então conhecereis diretamente aquela beleza inexprimível. E, estando presente essa beleza, nada mais necessitais buscar. 


Krishnamurti - O homem e seus desejos em conflito
http://pensarcompulsivo.blogspot.com 
 
 

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