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quarta-feira, 27 de dezembro de 2017

O EGOÍSMO, O PROBLEMA DO SEXO, A SANTIFICAÇÃO DA VIDA CONJUGAL


Parte II - O Problema do Sexo


O sexo é decididamente um dos problemas mais importantes com o qual a mente humana é confrontada no domínio da dualidade. É um dos elementos na composição da natureza humana com o qual temos de lidar. Como tudo na vida humana, o sexo passa a ser julgado através de opostos, que são necessariamente criações da mente limitada.
 
Assim como a mente tenta ajustar a vida em um esquema de alternativas, tal como alegria ou dor, bom ou ruim, solidão ou companhia, atração ou repulsão, em relação ao sexo ela tende a pensar em indulgência e repressão como alternativas das quais não há escapatória para ela. Parece como se a mente tivesse de aceitar uma alternativa ou a outra. Contudo, ela não pode aceitar nenhuma delas sem restrições. Quando tenta a repressão fica insatisfeita com sua situação e com saudade pensa na indulgência. Quando tenta a indulgência torna-se consciente de sua escravidão aos sentidos e busca a liberdade, voltando à repressão mecânica. A mente continua insatisfeita com as duas alternativas, e assim, surge um dos problemas mais importantes e complicados da vida humana. Para resolver o problema do sexo, a mente precisa primeiro entender que ambas as alternativas são igualmente criação da imaginação que trabalha sob a influência ilusória do desejo. O desejo está implicitamente presente na repressão do sexo, bem como na sua gratificação. Ambos resultam em viciar a consciência através da concupiscência (luxúria) ou pelo desejo de sensações. A mente fica, portanto, inevitavelmente inquieta em qualquer das alternativas. Assim como quando há nuvens no céu, há escuridão e falta de sol esteja chovendo ou não, também quando a mente humana está envolta pelo desejo há uma diminuição de ser e uma falta de felicidade verdadeira, seja esse desejo satisfeito ou não.
 
A mente, quando agitada com o desejo, cria uma ideia ilusória de felicidade na satisfação do desejo e, em seguida, sabendo que a alma continua insatisfeita mesmo após a satisfação do desejo, busca a liberdade através da repressão. Assim, em busca da felicidade e da liberdade a mente fica presa nos opostos da indulgência e da repressão, os quais ela acha igualmente decepcionantes. Uma vez que ela não tente ir além destes opostos, seu movimento é sempre de um oposto para o outro e, consequentemente, de uma decepção para outra.

Assim, o desejo falsifica o funcionamento da imaginação e apresenta a mente a opção entre as alternativas de indulgência e repressão, que se revelam igualmente decepcionantes em sua promessa de trazer felicidade. No entanto, apesar das decepções repetidas e alternadas na indulgência bem como na repressão, a mente normalmente não renuncia a causa da infelicidade, a qual é o desejo. Desse modo, enquanto experimenta a decepção na repressão, ela é facilmente suscetível à falsa promessa de gratificação e enquanto experimenta a decepção na gratificação, fica facilmente suscetível à falsa promessa de repressão puramente mecânica. Isso é como mover-se dentro de uma gaiola. A porta de entrada para o caminho espiritual da renúncia interna e espontânea do desejo permanece fechada para aqueles que não têm a sorte de serem despertados por um Mestre Perfeito. O verdadeiro despertar é a entrada no caminho da sabedoria, que, no decorrer do tempo, certamente leva à liberdade e à felicidade duradoura da vida eterna.
 
A renúncia interna e espontânea do desejo é tão diferente da repressão mecânica quanto é diferente da indulgência. A mente se volta para a repressão mecânica do desejo por causa da decepção, mas ela se volta para a renúncia interna e espontânea do desejo por causa da desilusão ou do despertar. A necessidade de indulgência ou de repressão mecânica surge apenas quando a natureza do desejo não é claramente compreendida. Quando os aspirantes despertam totalmente para escravidão e o sofrimento inevitáveis decorrentes de desejo, eles começam voluntariamente a se livrar do fardo do desejo através da compreensão inteligente. A questão de indulgência ou repressão só surge quando há desejo. A necessidade de ambos desaparece com o completo desaparecimento do desejo. Quando a mente está livre do desejo, ela já não pode ser movida pelas falsas promessas de indulgência ou repressão mecânica. No entanto, deve-se ter em mente que a vida de liberdade está mais perto da vida de contenção do que da vida de indulgência (embora em termos de qualidade seja essencialmente diferente de ambas). Dessa forma, para os aspirantes uma vida de celibato rigoroso é preferível à vida de casado, se a retenção chega a eles facilmente sem um sentido indevido de auto-repressão. Tal restrição é difícil para a maioria das pessoas e às vezes impossível, e para eles a vida conjugal é, decididamente, mais útil do que uma vida de celibato. Para as pessoas comuns, a vida conjugal é sem dúvida aconselhável a menos que eles tenham uma aptidão especial para o celibato.

Assim como a vida de celibato exige e suscita o desenvolvimento de muitas virtudes, a vida conjugal por sua vez também alimenta o crescimento de muitas qualidades espirituais de extrema importância. O valor do celibato está no hábito de contenção e do sentido de desprendimento e independência que ela dá. Mas, enquanto a mente não está totalmente livre do desejo, não há verdadeira liberdade. Da mesma forma, o valor do casamento está nas lições de ajustamento mútuo e no sentido de unidade com o outro. A verdadeira união ou dissolução da dualidade é possível, entretanto, somente através do amor divino, que nunca pode alvorecer enquanto houver a menor sombra de luxúria ou de desejo na mente. Somente ao trilhar o caminho da renúncia interior e espontânea do desejo é que é possível alcançar a verdadeira liberdade e unidade.
 
Para aqueles que são celibatários, bem como para as pessoas casadas, o caminho da vida interior é o mesmo. Quando os aspirantes são atraídos pela Verdade, não anseiam por mais nada e conforme a Verdade chega cada vez mais dentro do seu alcance, eles gradualmente se livram do desejo. Seja no celibato ou no casamento, eles não são mais seduzidos pelas promessas enganosas de indulgência ou repressão mecânica e praticam a renúncia interna e espontânea do desejo até que sejam libertados dos opostos enganosos. O caminho da perfeição está aberto aos aspirantes tanto no celibato quanto no casamento, e se eles começam a partir do casamento ou do celibato vai depender de seus sanskaras e dos laços karmicos do passado. Eles alegremente aceitam as condições que suas vidas passadas determinaram para eles e utilizam essas condições para o avanço espiritual à luz do ideal que vieram a perceber.

Os aspirantes devem escolher um dos dois cursos que estão abertos para eles. Devem levar a uma vida de celibato ou a uma vida de casado e devem evitar a todo custo uma conciliação barata entre os dois. Promiscuidade na gratificação sexual está fadada a aportar os aspirantes no caos mais lastimável e perigoso da luxúria ingovernável. Dessa forma, a luxúria difusa e desgovernada vela os valores mais elevados, perpetua o enredamento e cria no caminho espiritual dificuldades inultrapassáveis à renúncia interna e espontânea do desejo. O sexo no casamento é totalmente diferente do sexo fora do casamento. No casamento, os sanskaras de luxúria são muito mais leves e capazes de serem removidos mais facilmente. Quando um relacionamento sexual é acompanhado por um senso de responsabilidade, amor e idealismo espiritual, as condições para a sublimação do sexo são muito mais favoráveis do que quando ele é mais barato e promíscuo. Na promiscuidade a tentação de explorar as possibilidades de mero contato sexual é formidável. É somente pela restrição máxima do âmbito do mero sexo que os aspirantes podem chegar a qualquer compreensão real dos valores atingíveis através da transformação gradual do sexo em amor. Se a mente tenta entender o sexo com a ampliação do escopo do sexo, não há fim para as ilusões para as quais ela torna-se presa, pois não há fim para a ampliação de seu escopo. Na promiscuidade as sugestões da luxúria são necessariamente as primeiras a se apresentarem à mente e os indivíduos ficam condenados a reagirem às pessoas dentro das limitações dessa perversão inicial e, assim, fecham a porta para experiências mais profundas.
 
A verdade não pode ser compreendida ao saltarmos sobre a superfície da vida e multiplicarmos os contatos superficiais. É necessária a preparação da mente, que pode centrar suas capacidades sobre experiências selecionadas e livrar-se de suas características limitantes. Esse processo de discriminação entre o superior e o inferior e da transcendência do inferior em favor do superior, torna-se possível através de uma concentração plena e de um interesse real e sério na vida. Essa concentração plena e interesse real é necessariamente excluída quando a mente se torna escrava do hábito de correr pela tangente e vagar entre muitos possíveis objetos de experiência semelhante.
 
Na vida conjugal o alcance da experiência a ser experimentada em companhia do parceiro é tão grande que as sugestões da luxúria não são necessariamente as primeiras a se apresentar à mente. Há, portanto, uma real oportunidade para os aspirantes de reconhecer e anular os fatores limitantes na experiência. Através da eliminação gradual da luxúria e da progressão através de uma série de experiências cada vez mais ricas de amor e sacrifício, eles podem finalmente chegar à Infinidade.
 
 
Meher Baba
 ricardo-yoga.blogspot.com.br
 

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