O AMOR ALÉM DA ILUSÃO
Parte II
Aqui chegamos a outro aspecto do amor. Ou talvez a fraternidade, na verdade, constitua a essência do amor.
A
Fraternidade, em última instância, é a convicção inabalável de que cada
vida e cada alma têm uma relação e uma identidade com todas as outras. A
Fraternidade é o conhecimento do “ponto de acordo” entre todos os
seres, e através do qual todos compartilham da Alma Universal. Se
poderia dizer que quando o amor existe por si mesmo, sem a expectativa
de recompensa ou reciprocidade, sem referência a qualidades particulares
e portanto sem ser ameaçado por defeitos pessoais, ele é fraternidade
pura e simples. Um tal amor é, evidentemente, uma sabedoria. Ele é
intocado pelos pares de opostos. Ele não é ameaçado pela ação, pelo
resultado da ação, ou por desejos. Ele mantém o prumo perfeito da
equanimidade, que é a perfeição da habilidade na realização das ações.
Ele é a intenção que dá forma à ação correta.
Como
pode ser obtida a sabedoria do amor? Ela é obtida do modo como sempre
se alcança a sabedoria. Ela é obtida por aquele que se torna digno dela.
O Carma, a lei da ação,
regula este processo assim como regula todas as coisas. Um amor mais
sábio não é obtido pela inação, nem é dado pelo capricho ou pelo acaso.
Desrespeitar em nome do amor a integridade de outra pessoa, ainda que a
outra pessoa não se oponha a isso e não veja a paralisação da sua
própria vontade, é trair a fraternidade humana e negar a si mesmo o
poder elevado do verdadeiro amor. Manchar ou tornar cega a compaixão,
insistindo em que o amor deve ser homenageado, recompensado ou admirado,
é selecionar para o futuro individual o sofrimento de uma paixão
exigente. O amor, a fraternidade e a compaixão não podem ser ensinados,
mas podem ser aprendidos.
Os
paradoxos são úteis quando descrevemos o intangível, porque eles
dissolvem as definições rígidas e sugerem uma realidade mais inclusiva.
Assim, o amor, que parece ser intensamente pessoal, se torna com
frequência maior e mais invencível quando é verdadeiramente impessoal. O
“coração de criança”, a confiança dada tão livremente pelo ser humano
não sofisticado, é encontrado também naqueles em quem a sabedoria está
estabelecida, cuja visão não tem véus, aqueles que conhecem o bem e o
“mal” e permanecem imperturbados por qualquer coisa que ocorra.
Há
uma impressão de que aqueles que estão “apaixonados” sabem pouco sobre o
amor, simplesmente porque não podem ficar à parte e compreender que o
amor é uma energia a ser dirigida conscientemente.
Assim
como a vontade, o amor é uma força sem cor determinada, que assume o
seu caráter conforme as motivações daquele que o vive. O amor não é uma
desculpa, não é uma razão, não é uma justificação e tampouco é uma
causa. Ele é uma energia que pode ser colocada em ação em qualquer
plano, através de qualquer um dos princípios ou instrumentos da
consciência humana. Dependendo de do plano ou estado de consciência em
que o Eu está agindo, esta energia pode ser de união ou destruição.
O
amor, quando real, puro e profundo, tem sido para muitos uma
antecipação da imortalidade, e, de certo modo, uma evidência de que há
uma alma que não morre. Teosoficamente isso também significa uma
evidência da reencarnação. A doutrina do renascimento é a única
explicação das afinidades - sejam casuais ou dominantes - que emergem
com toda força nas vidas das pessoas e produzem amor ou ódio
contrariando aparentemente o que elas querem e desejam. O amor e o ódio,
na filosofia da reencarnação, são as grandes forças de atração que
reúnem, uma e outra vez, amigos e inimigos do passado.
Porém, tanto o amor quanto o ódio, como opostos,
devem desaparecer, porque “se um indivíduo trabalha, ainda que
indiretamente, para si mesmo e de modo parcial, ele se torna nesta mesma
medida um mago antievolucionista”.
H. P. Blavatsky distingue o real do parcial da seguinte maneira:
“O
amor puro e divino não é apenas o fruto de um coração humano, mas tem
sua origem na eternidade. O amor espiritual e sagrado é imortal, e o
Carma faz com que, cedo ou tarde, todos os que se amaram com afeto
espiritual nasçam no mesmo grupo familiar. Nós dizemos novamente que o
amor além da morte, ainda que possa ser chamado de ilusão, tem uma
potência mágica e divina que reage sobre os vivos . . . . Ele se
manifesta nos seus sonhos, e frequentemente em vários acontecimentos -
em proteção e fatos providenciais, porque o amor é um escudo forte, e não é limitado por espaço ou tempo.”
O
laço cármico da afeição espiritual talvez vá criar famílias cujos
membros são fraternalmente devotados a viver a vida mais elevada e a
seguir “a doutrina do coração”. Os casais em que o amor de um pelo
outro abre em certa medida o “terceiro olho” irão encontrar na vida
cotidiana correspondências e analogias com a raça etérea dos Filhos
nascidos da Mente, e começarão a sentir a força de uma profecia
teosófica dada em “A Doutrina Secreta”. [2]
As
crianças que crescerem na presença de um amor que é verdadeiramente “a
luz do sol da vida” irão assimilar mais decididamente o carma da sua
hereditariedade e do seu ambiente, e compreenderão mais cedo a função
das afinidades na evolução da alma.
Uma
família cujo ideal é a afeição espiritual jamais se desintegrará. Ela
permanece como um núcleo de incontáveis ramificações e relacionamentos,
cujo denominador comum é o impulso em direção à fraternidade: ela é um
“movimento teosófico”, com potencialidades incalculáveis do ponto de
vista do progresso da humanidade.
Theosophy
NOTAS:
[2] “The Secret Doctrine”, H. P. Blavatsky, Theosophy Co., Los Angeles, volume II, p. 415.
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