SOBRE A FUGA DA INTIMIDADE
Já reparou?
É mais fácil ser verdadeiro com os estranhos.
As pessoas que viajam
de comboio começam a falar
com estranhos e contam coisas que nunca
contaram
aos amigos, porque, com um estranho, não se sentem envolvidas.
Meia hora mais tarde, chegam ao seu destino
e saem; esquecem e o
estranho esquecerá tudo aquilo que lhe contaram. Por isso nada do que
lhe disseram tem qualquer importância. Não se correm riscos com um
estranho.
Ao falar com estranhos, as pessoas são mais verdadeiras
e revelam o seu
coração. Mas ao falar com os amigos,
com os familiares — pai, mãe,
mulher, marido, irmão, irmã — há uma profunda inibição inconsciente.
«Não digas isso, ele pode ficar magoado. Não faças isso, ela pode não
gostar.
Não te comportes dessa maneira, o pai é velho,
pode ficar
chocado.» Então a pessoa continua a controlar-se.
e pouco A pouco, a
verdade cai na cave do seu ser
e ela torna-se muito esperta e astuciosa
com o não verdadeiro.
Continua a fazer falsos sorrisos, que não passam
de pinturas nos lábios.
Continua a dizer coisas simpáticas
sem qualquer significado. Começa a
sentir-se aborrecida
com o namorado ou com os pais, mas continua a
dizer:
«Estou muito contente por te ver!» Enquanto isso,
todo o seu ser
diz: «Agora deixa-me em paz!»
Mas verbalmente continua a fingir. E os
outros também
estão a fazer a mesma coisa; ninguém se apercebe
de que
estamos todos no mesmo barco.
Toda a gente tem medo da intimidade — ter ou não ter consciência desse
medo é outra história. A intimidade significa expor-se perante um
estranho — e todos nós somos estranhos; ninguém conhece ninguém. Somos
mesmo estranhos a nós próprios, porque não sabemos quem somos.
A intimidade aproxima-o de um estranho.
Tem de deixar cair todas as suas
defesas;
só assim a intimidade é possível. E o seu medo é que
se deixar
cair todas as suas defesas, todas as suas máscaras, quem sabe o que o
estranho lhe poderá fazer.
Todos nós andamos a esconder mil e uma
coisas,
não só dos outros mas de nós próprios,
porque fomos criados por
uma humanidade doente
com toda a espécie de repressões, inibições e
tabus.
E o medo é que, com alguém que seja um estranho — e não importa
se se viveu com a pessoa durante trinta ou quarenta anos; a estranheza
nunca desaparece —, parece
mais seguro manter uma ligeira defesa, uma
pequena distância, porque alguém se poderá aproveitar das suas
fraquezas,
da sua fragilidade, da sua vulnerabilidade.
Toda a gente tem medo da intimidade.
O problema torna-se mais complicado
porque todos
querem intimidade. Pois, de outro modo, está sozinho neste Universo — sem um amigo, sem
um amante, sem ninguém
em quem confiar, sem ninguém a quem abrir todas
as suas feridas. E as feridas não saram se não forem abertas.
Ninguém sabe nada sobre o futuro. O seu céu, o seu inferno
e o seu Deus
muito provavelmente não passam de hipóteses
não comprovadas. A única
coisa que está nas suas mãos
é a sua vida - faça dela a mais
interessante possível.
Pela intimidade, pelo amor, por se abrir a muitas pessoa
você se torna
mais interessante. E se puder viver um amor profundo, uma amizade
verdadeira, uma intimidade generosa com muitas pessoas, você terá
vivido da melhor maneira possível, e onde quer que esteja, se tiver
aprendido essa arte, viverá assim ali também, com felicidade.
Se for simples, carinhoso, receptivo, compreensivo, íntimo,
terá
criado um paraíso ao seu redor. Se for fechado, constantemente na
defensiva, sempre preocupado que alguém possa perceber os seus
pensamentos, os seus sonhos, as suas perversões - você estará vivendo no
inferno. O inferno está dentro de você, assim como o paraíso. Eles não
são lugares geográficos,
são espaços espirituais.
Purifique-se. E a meditação não é nada além de uma limpeza
de todo o
lixo que se acumulou na sua mente.
Quando a mente estiver em silêncio e o
coração batendo,
você estará pronto - sem nenhum medo, mas com uma
grande alegria - para ser íntimo. E sem intimidade você está sozinho
aqui, entre estranhos. Com intimidade você está cercado de amigos, de
pessoas que o amam. A intimidade é uma experiência importante. Não se
deve esquecer disso.
Osho
Não nos mostramos como verdadeiramente somos, mas no íntimo, bem no íntimo sabemos que é muito doloroso, trabalhoso e complicado procedermos assim. Caímos, geralmente, em contradição, pois as máscaras nos conduzem a mentira. Como poderemos manter algo, que não é verdadeiro, senão através de mentiras? É insano e traz consequências; aquelas que não desejamos confrontar. E assim vivemos e convivemos com os demais, claro, em desarmonia, numa completa tensão. Quando não somos reais vivemos estressados, amargurados, não dormimos direito, não temos paz. Tudo isso porque não nos abrimos para o outro, não somos autênticos. Ora, que importa se o outro não é? Cada um que faça sua parte. E a parte que me cabe nesse grande contexto, nesse grande conjunto 'humanidade' é viver em paz, em harmonia e permitir aqueles que me rodeiam também possam viver essa experiência. KyraKally
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