Translate

segunda-feira, 1 de julho de 2019

RESPONSABILIDADE
É EGOÍSMO
 
 
Pergunta: Falais da Vida sempre se renovando. Por que usais a palavra “renovar”? Não é a Vida sempre completa, jamais exaurida, sem necessidade de renovação?

Krishnamurti:
Faço uso das palavras “renovar” para transmitir a ideia de que não existe começo nem fim. Aquilo que sempre está se renovando, que é sempre plástico, é a Vida. Aquilo que sempre está se recriando é imortalidade, é eternidade. Estou me esforçando por descrever o indescritível e jamais entendereis, se vos esforçardes para copiar. A imortalidade, a realização do que está isento de morte, não é coisa estática, não é um fim, uma conclusão; é a essência concentrada da própria Vida, que é energia. Não podeis pensar da energia como sendo um fim. Vós dela pensais como um fim, porque pretendeis atingir este fim; quereis alcança-lo, de modo a sentir a satisfação de haver feito progresso. Por essa razão vos tenho estado a dizer que não pode existir consecução, porque, aquilo mesmo que atingirdes, vos destruirá. Se buscardes um fim e vos esforçardes por atingi-lo, estareis destruindo essa mente que a si própria busca libertar-se.

 
Pergunta: Haveis dito que se estivésseis em posição de ter responsabilidade para com os outros, cumpriríeis esse dever, porém não tomaríeis novas responsabilidades. Por que não? Para que evitar ação e trabalho neste mundo de objetividade? Será que a plena realização da Verdade coloca o interesse do homem fora do seu trabalho cotidiano no mundo? Não será a sua busca um processo interior, contínuo, independente de sua ação e responsabilidade diária, embora saturando-os?

Krishnamurti:
Certamente, concordo com o inquiridor; vou, porém, tentar explicar algo que será certamente mal compreendido, portanto, esforçai-vos por prestar atenção.

Responsabilidade é egoísmo. Sois responsáveis para com os vossos pertences, não é assim? Tendes deveres para com os vossos. Dizeis: “tenho que ter em vista meu filho, minha esposa, meus bens, portanto, tenho responsabilidades”. Ao passo que eu vos falo da liberdade em que não há distinção de “teu” e de “meu” e, portanto, nem responsabilidade nem o seu oposto. Quanto mais vos inculcais como responsáveis pelo bem do homem e da sociedade, no sentido de seguir um sistema, mais autocentrados, estreitos, tolos, vos tornais. Se, porém, a mente não estiver limitada pelo desejo, se não estiver embaraçada pela ideia do “meu” e do “teu”, sereis livres e conhecereis a verdadeira responsabilidade que não é uma fuga da ação.
 
Enchei-vos de deveres, tornai-vos falsamente responsáveis, enquanto existi a ideia de “vosso”. Não sois responsáveis por mim, não é verdade? Se, porém, eu for vosso amigo particular, vosso companheiro, vosso esposo, vossa esposa, vosso filho, vós vos tornais responsáveis. Isto quer dizer que pretendeis dominar-me, guiar-me, ajudar-me, proteger-me. Portanto, aquilo que chamais responsabilidade nada mais é do que uma forma sutil de posse, de desejo; ao passo que eu vos falo da libertação de todo desejo.

A verdadeira ação somente é possível quando a mente estiver completamente livre da eu-consciência, do desejo. A verdadeira espontaneidade, é ser completamente livre; então vossa ação não terá motivos. Se compreendeis isto, se viverdes alguns dias com apercebimento, sabereis o que é a verdadeira ação. Vereis que, se estiverdes libertos da responsabilidade, sereis a própria reflexão; cedereis ao inevitável, e neste ceder está o êxtase da Vida.


Pergunta: Será possível estar isento de motivos e, apesar disso, ter ativo interesse por uma particular forma de trabalho?

Krishnamurti:
Porque não? Quereis dizer que vos interessais pelo trabalho, porque ele vos devolve algo em retorno. Todo o arcabouço da civilização se acha edificado sobre esta ideia, porém os poucos que compreendem têm que romper com isso. Para se estar isento de motivos na ação, é preciso se libertar da vontade coletiva e pessoal. Romper com a uniformidade de pensamento, e isto exige grande apercebimento e a alegria da solidão; vós, porém, pensais que este isolamento é uma desgraça, algo de trágico, de espantoso, que vos faz fugir.

 
Pergunta: Não estamos, apesar disso, interessados pela Realidade que nos dá liberdade?

Krishnamurti:
Se estiverdes interessados em qualquer coisa porque ela vos proporciona algo, nada mais será que desejo, não é? Por acaso amais a outrem porque vos dá alguma coisa? Se tiverdes em vista a Realidade com o fim dela vos proporcionar o que denominais liberdade, certo não vos a dará, e tornar-vos-á escravos de vossa ideia.

Como disse, a verdadeira ação, isenta de motivos, só é possível quando houver cessado o desejo. Só podeis agir claramente, livremente, quando a mente estiver liberta de toda a sensação e só então cessará vossa ação de produzir caos completo que no mundo existe presentemente. A ação isenta de motivos é, na realidade, verdadeiramente livre; nela não há cálculo nem desejo. Fazer algo que de momento vos agrada, não é espontaneidade. Espontaneidade de ação é plenitude de percepção, e esta somente ode ser obtida pelo processo de liberar a mente do desejo.

 
Krishnamurti
 http://pensarcompulsivo.blogspot.com
 

Nenhum comentário:

Postar um comentário