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quarta-feira, 31 de julho de 2019

O QUE IMPORTA É A MANEIRA 
PELA QUAL VIVEIS


Pergunta: Outro dia haveis falado do propósito da vida. Por isto pensamos que quereis significar o propósito da existência individual. Podeis desenvolver a ideia de que a pura vida não pode ter propósito?

Krishnamurti: Naturalmente, a vida, pura ação, pura vida em si mesma considerada, a totalidade, a soma de toda a vida, não tem propósito. Ela é. Esta vida não pertence a temperamento algum especial ou a uma espécie qualquer do mesmo; ela é impossível. 
 
Assim, a vida não pode ser compreendida, por intermédio de temperamento algum, por meio de qualquer caminho; ela é o Ser de todas as coisas. Porém, entre Ser e o entendimento dele pelo indivíduo, acha-se essa existência individual, esta cicatriz de sofrimento da qual tenho falado. No desgaste desta individualidade, este ego de reação, reside o propósito da existência individual, da vida com “v” minúsculo. Na Vida, por outro lado — Vida com “V” maiúsculo — na Vida Pura, que não tem propósito, não há divisão; não existe distinção entre manifestação e vida. 
 
No indivíduo que é autoconsciente existe um propósito — este é o de realizar completamente, sem atributos, qualidades, relações especiais, esta totalidade que é auto-existente, cuja causa está em si mesma. Porém, nesta Vida auto-existente, causa-de-si-mesma, não existe propósito. O indivíduo que conhece separação, é apanhado pelo esforço (sendo o esforço imperfeição) e para ele, como seguimento separado dessa Vida, existe o propósito. Assim, o indivíduo precisa verificar a verdade deste Eu, que é Puro Ser, que está em todas as coisas, e assim, realizando-o, preenche a consciência separada do indivíduo. Separação é limitação, tristeza, infelicidade, esforço. E, nesta e por meio desta infelicidade escolhe esforço e contínuo ajuste a existência individual, que tem a todo o instante, conformar-se à si mesmo com esta Verdade. 
 
Assim, precisa ele ter concebido, colhido um vislumbre dessa Pura Vida, este Puro Ser que é a súmula de todos os esforços e daí isento de qualquer esforço. É ele a súmula do bem — de um bem no qual não existe esforço. Realizado isto, e compreendido isto, desfará ele, por meio da ação espontânea, a parede da separação. Quando houver total realização, ou união com essa Vida, então não mais haverá anseio pela existência separada, — ele é todas as coisas, ele é criação, é perfeição — imaculado, por ter a cicatriz da individualidade desaparecido.

Sei que a maioria dentre vós hão de pensar imediatamente que isto significa o aniquilamento total, porque, direis, como pode isto ser alcançado sem a destruição da existência individual? A partir do momento em que olheis para tal, sob este ponto de vista, vossa existência individual tornar-se-á à coisa mais importante; ao passo que, do ponto de vista da Vida a individualidade é imperfeição, é um mero fragmento da totalidade, e pelo fato de sentir-se a si mesma apenas uma parte é que está a todo o instante buscando fundir-se a si mesma, realizar-se a si mesma na totalidade. 
 
A ideia de que a verdade é o desdobramento do indivíduo, precisa ser colocada de lado. Não podeis desenvolver algo que é por sua própria natureza, imperfeito — e é isto que a individualidade é. Podeis, porém, desmanchá-la por meio de contínuas reparações — pelas reparações da conduta em ação. Por isso, é que tem importância vital aquilo que agora sois, e a razão pela qual necessitais colocar de lado todas as teorias filosóficas e metafísicas. O que importa é a maneira pela qual viveis, o vosso modo de vos comportardes, vossa conduta, vossa ação, vossa seleção — não para saber se o Eu existe ou se aquilo que existe não é o Eu — se é o “Eu” que progride ou o “não eu”. Quem virá a importar-se futuramente com essas teorias? O que realmente tem importância é o estardes com tristeza. Quando um homem é colhido pela tristeza, quer ficar livre dela, quer estabelecer dentro de si a tranquilidade e a paz; necessita de uma mente plácida e aguda, e isto somente pode ser desenvolvido por meio da seleção. A seleção é a contínua descoberta da Verdade. 
 
É preciso que exista esse agudo apercebimento para contínua reparação — sem jamais ceder nem por um segundo sequer. Isto, para mim, não é teoria, pois que eu próprio executei. Eu coloco perante vós para que o vivais ou o abandoneis. O homem sábio, o homem que se acha prisioneiro da tristeza (e o homem sábio acha-se em tristeza por estar a todo o instante lutando na sua busca) examina, analisa, procura mediante a crítica, o princípio fundamental; e por meio dessa crítica, por meio do exame impessoal, torna-se ele apercebido da realidade total.
 
Krishnamurti
http://pensarcompulsivo.blogspot.com

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