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quarta-feira, 30 de agosto de 2017

POSSUIR E DESFRUTAR


 
Era um dia bonito. O céu estava claro e a temperatura suavemente agradável, de modo que o sábio resolveu dar uma volta.

Por acaso, seu passeio o conduziu até uma casa luxuosa, que pertencia a um homem rico que o sábio conhecia bem. Em sua frente havia um belo jardim com muitas flores exóticas importadas de terras distantes.

À medida que o sábio se aproximava viu que muitas dessas flores estavam no auge do florescimento. Ele ficou maravilhado pela sua beleza. As cores eram tão vivas e brilhantes que pareciam se separar das pétalas em seu esplendor.

O sábio se maravilhou com a habilidade humana que foi capaz de transplantar estas flores de tão longe - provavelmente de algum paraíso tropical que ele nunca visitara.

Ele ficou alguns minutos saboreando a vista. Respirou fundo para sentir a fragrância. Depois de algum tempo suspirou discretamente e seguiu seu caminho.

O sábio pensou sobre o homem rico. Há pouco tempo ele adoecera seriamente. Como eram amigos há muito tempo, o sábio estava muito preocupado.

O médico dissera que a doença foi causada por stress. O homem estava sujeito a muita tensão ao administrar seu negócio. O negócio era a origem de sua fortuna, mas ele pagou um alto preço por ele – sua saúde.

O problema era que o homem insistia em fazer tudo pessoalmente, assumindo cada vez mais responsabilidades. À medida que as pressões aumentavam, perdeu o apetite e não conseguia mais uma boa noite de sono. Estava sempre cansado e perdera o interesse pelos prazeres simples da vida.

O homem tinha ignorado o jardim por muitos anos. Ele não tinha tempo, energia e disposição para passear entre as belas flores de seu próprio jardim.

De repente, a ironia da situação se tornou manifesta. O homem rico tinha o jardim, mas não podia apreciá-lo. O sábio não o possuía, mas era capaz de desfrutá-lo plenamente.

Um dos erros mais comuns da vida envolve a relação da felicidade com o possuir e o desfrutar.

Esta confusão acontece porque usualmente imaginamos que devemos possuir para desfrutar. Compramos um DVD para ver filmes, um estéreo para ouvir música. Possuir e desfrutar parecem andar juntos, e assim pensamos que são correlacionados.

Na verdade, os dois são independentes. Apenas um deles está associado à felicidade, e não é a posse. O possuir não só é desnecessário para o desfrutar, como pode ser um obstáculo. Mas muitas pessoas não pensam assim, e associam a felicidade mais ao possuir do que ao desfrutar – exatamente o oposto da realidade.

Por exemplo, conheço uma senhora que associa a aquisição de joias à felicidade. Ela ama anéis, colares e braceletes. Ela tem muitos, mas nuca os usa, por medo de perda ou roubo. A coleção é muito preciosa para ser posta em risco!

Ela só fica realmente feliz imediatamente antes e depois de uma aquisição. Comprar joias lhe dá um fugaz momento de excitação, seguido pelo volta do desejo de comprar, levando-a implacavelmente a uma nova compra.

Você provavelmente conhece alguém assim. Talvez um aficionado por carros antigos, que tem um na garagem. Não poupa esforços para consertos e ajustes, nunca se cansa de limpar e polir, mas nunca o dirige.   
 
Ou então alguém que tem uma vasta coleção de gravações de músicas, mas ouviu apenas uma pequena fração delas. Por que? Porque está muito ocupado procurando novos Cds para a coleção.

Talvez você conheça alguém que acabou de mobiliar a sala com sofás e almofadas novas, num tecido da moda, e as mantém cobertas com capas plásticas, porque não quer os móveis novos fiquem manchados, ou sequer empoeirados. Quando você a visita e senta em sua sala, está sentando literalmente em móveis de plástico, e tem de ser cuidadoso com seus movimentos para não causar muito barulho.

Ou então tem um conhecido com um relacionamento baseado em possuir o outro, em lugar de apreciá-lo. Você sabe que o relacionamento vai fracassar se continuar nesse caminho.

Pode ser que o elemento comum em todos os exemplos acima é a ênfase em possuir em lugar de desfrutar. Se olhar à sua volta com espírito observador, verá muitos outros exemplos.

Quando olho para minhas estantes vejo muitos livros de meus autores favoritos. Cada um é uma bela flor de sabedoria, esperando para ser saboreada. O que eu já possuo é um jardim cheio com essas flores, mas da mesma forma que o homem rico, estou negligenciando-o. Em lugar de desfrutá-lo, continuo indo às livrarias para comprar outros. A aquisição contínua tornou-se um hábito.

Fazemos um enorme favor a nós mesmos quando quebramos esse padrão habitual. O tempo e a energia que desperdiçávamos antes agora estão liberados para que possamos usar e desfrutar aquilo que já temos. Com isto, melhoramos a qualidade da vida e tomamos a chave da felicidade em nossas mãos.

Há muitos “jardins” em sua vida. Pode-se possuir alguns ou muitos deles, mas este é um detalhe sem importância. O que é importante – e a única coisa importante – é que você pode desfrutá-los se realmente quiser.

Vamos dirigir nossa atenção para as flores desses jardins. Quando respira sua fragrância e se contempla suas cores brilhantes, você não pode senão se maravilhar com milagre da existência humana. É um milagre que trouxe uma parte do paraíso celestial para o plano mortal. É o Tao.


 
Derek Lin
Fonte:http://www.taoism.net

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