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sábado, 5 de dezembro de 2020


O MISTÉRIO DO SILÊNCIO

Sobre o pavor de ficar em silêncio | by Bárbara Brasileiro Cristovão |  Medium  

Para o homem profano e inexperiente, o silêncio é uma simples ausência de ruídos, sobretudo de ruídos físicos.

E, como o ego humano vive no ruído e do ruído, o silêncio representa para o homem profano a morte. O homem comum se afoga literalmente no oceano pacífico do silêncio. Um padre, interrogado se fazia de manhã uma hora de silêncio meditativo, respondeu que, se o fizesse, ia enlouquecer.

Uma senhora, muito religiosa, afirmou-me que tinha certeza de que nem ela e nem ninguém era capaz de fazer meia hora de meditação.
 
Ouve-se muito falar sobre o que Jesus disse e fez, mas não se fala sobre o que não disse e não fez, por exemplo, sobre os dezoito anos de silêncio em Nazaré e sobre os quarenta dias de silêncio no deserto.

Moisés e Elias passam 40 dias de silêncio na solidão com Deus.

Francisco de Assis passa meses inteiros de silêncio nas alturas do Monte Alverne, depois do que lhe apareceu o Cristo crucificado e lhe imprimiu as suas chagas.

Paulo de Tarso, após sua conversão em Damasco, retira-se para os desertos da Arábia, onde permaneceu três anos em solidão com Deus.

Rabindranath Tagore e Mahatma Gandhi praticavam longos períodos de silêncio.

A ordem dos Trapistas, um de cujos membros Thomas Merton, se tornou célebre pelos seus escritos, viveu praticamente a vida inteira em permanente silêncio. Sobre a Trapa perto de Paris, se vê esta legenda: “O pesar de viver sem prazer bem vale pelo prazer de morrer sem pesar”.

Um dos maiores tesouros que o Cristianismo oficial perdeu, nestes últimos séculos, foi, sem dúvida, o tesouro do silêncio dinâmico. E talvez seja uma das principais razões da sua ineficiência na sociedade humana.

Silêncio é receita – ruído é despesa. E quem tem mais despesas do que receitas abre falência e não é à toa que esta nossa pobre humanidade de hoje está permanentemente falida.

Quando digo aos profanos que nossos grupos de estudos fazem periodicamente o seu retiro espiritual por diversos dias em total silêncio, o inexperiente logo pensa em doença física ou mental.
 
A razão deste horror ao silêncio é o conceito radicalmente falso sobre silêncio.

O profano entende por silêncio não falar nem ouvir nada. Outros, mais avançados, incluem no silêncio também a ausência de ruído mental e emocional, nada pensar e nada desejar.

Mas entre mil pessoas não encontramos uma que entenda por silêncio uma grandiosa atitude de presença cósmica ou uma fascinante plenitude no Universo. Só pensam em silêncio como ausência e como vacuidade e, como a natureza tem horror à ausência e à vacuidade, esses inexperientes não podem amar e querer bem ao silêncio, que não lhes parece fecundação e enriquecimento da alma.

Até que o homem, diz o maravilhoso livrinho de Mabel Collins, “Luz no Caminho” “Light on the Path”, possa ouvir a voz dos Mestres, deve ele ter se tornado totalmente surdo aos ruídos profanos.
 
Enquanto o homem vive na falsa concepção, que quase todos nós aprendemos nos colégios e nas igrejas, de que meditação consista em analisar determinados textos sacros, estão todas as portas fechadas e nunca aprenderemos a arte divina do silêncio fecundo e enriquecedor.

Meditar não é pensar. Meditar é esvaziar-se totalmente de qualquer conteúdo do ego e colocar-se, plenamente consciente, como canal vazio, diante da plenitude da Fonte, ou em linguagem da Sagrada Escritura: “Sê quieto – e saberás que Eu sou Deus”. Ou ainda: “Deus resiste aos soberbos (para as pessoas plenas de ego) e dá sua graça aos humildes (para as pessoas vazias de ego)”. Segundo a eterna matemática cósmica, a cosmoplenitude plenifica somente a ego vacuidade, mas não plenifica a egoplenitude.

Disto sabia Maria quando exclamou diante de Isabel: “Deus encheu de bens aos famintos e despediu vazios os fartos”. Ou ainda no Sermão da Montanha de Jesus: “Bem-aventurados os que têm fome e sede da Justiça (da Verdade), porque eles serão saciados”.

O silêncio-presença e o silêncio-plenitude são uma ausência e uma vacuidade do ego humano que tem intenso desejo da Teopresença e da Teoplenitude.

Mesmo no terreno meramente humano vale esta matemática: o homem que já superou e se desiludiu da esperança de encontrar na zona meramente periférica das exterioridades relativas e inconstantes a verdade do Uno, dirige-se, como o girassol, ao centro do Absoluto e constante da Realidade.

Pode-se dizer que a Teoria da Relatividade é uma fuga de todas as coisas relativas e um refúgio para dentro do Absoluto.

Quem não vislumbrou, ou pelo menos farejou o Absoluto, o Uno, em longos e profundos mergulhos de silêncio, não sente a vacuidade dos Relativos e o desejo do Absoluto.

Pela vacuidade do silêncio prolongado, a plenitude da alma flui irresistivelmente para dentro da vacuidade do cosmos humano.

O silêncio é a linguagem do espírito – que é interrompida pelo falar.
 
Eu nunca vi homem mais silencioso do que Einstein.


Huberto Rohden
 
 
“O texto acima foi escrito por Rohden durante seus contatos pessoais com A. Einstein na Universidade de Princeton, USA, durante o período de 1945 a 1946”.

Sabe-se que Albert Einstein se abstraia durante muitas horas de seu dia-a-dia em profundo silêncio, encontros solitários consigo mesmo, onde ele mergulhava em seus pensamentos, ou simplesmente em nada pensava como ficou gravado na frase retirada de suas memórias: “Eu penso 99 vezes, e nada descubro; deixo de pensar e mergulho no silêncio – e eis que a verdade se me revela”. 

https://ihgomes.wordpress.com

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