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terça-feira, 3 de maio de 2022

CORRESPONDÊNCIA SOBRE O TEXTO
“A CONTEMPLAÇÃO” 
 

Lamento que todo o artigo tenha sido inteiramente mal compreendido. Tudo o que quis  dizer é que o afastamento temporário da família ou amigos não constitui uma qualificação essencial para fazer  progresso em ocultismo. Isso deveria ficar claro para qualquer um que considere cuidadosamente a história de Janaka.  Trata-se de, mesmo estando no mundo, não ser do mundo.  Muitas pessoas, sem compreender o significado deste importante ensinamento, se apressam movidas por um desprezo sentimental pelas coisas mundanas – que surge provavelmente de uma decepção naquele nível – e começam  a praticar o que consideram uma forma autêntica de contemplação.  O próprio fato de que esta é a motivação  que leva estas pessoas a adotar esta prática  . . . . –  este fato é uma indicação suficiente de que tais pessoas não sabem como é a “contemplação” de um Raja Iogue. É, portanto, impossível que essas pessoas possam seguir o método correto; e a prática física, que necessariamente realizam, as leva aos resultados desastrosos assinalados no artigo.
 
Qualquer leitor com intuição suficiente para ser um estudante prático de ocultismo verá de imediato que alcançar a perfeição é o ideal mais elevado que um ser humano pode ter diante de si. Essa não é a tarefa de um dia ou de alguns anos. “Alguém se torna um Adepto, ninguém É TRANSFORMADO em Adepto” – esse é um ensinamento que o estudante deve compreender desde o início.  O aspirante trabalha por sua meta ao longo de uma  série de vidas.  O coronel Olcott diz em seu livro “O Catecismo Budista”:  “. . . Incontáveis gerações são necessárias para transformar um homem em um  Buddha, e a vontade de ferro de tornar-se um Buddha percorre igualmente todos os renascimentos sucessivos.”
 
Esta vontade de ferro de tornar-se perfeito deve estar operando incessantemente, sem um só momento de relaxamento, como ficará claro para alguém que leia cuidadosamente o artigo todo. É  dito claramente que durante o tempo em que esta contemplação não é praticada, isto é, que a vontade de ferro não está sendo exercida, o processo de emissão e atração de átomos não pára, e que os desejos,  instintivos ou não, devem ser regulados de modo a atrair apenas átomos que possam ser adequados a seu progresso. Portanto, não entendo por que meu correspondente pergunta o que ele deveria fazer em  uma hora específica da manhã. Ele deve cultivar apenas os pensamentos que não sejam incompatíveis com o mais alto ideal em função do qual ele trabalha.
 
Devo acrescentar que entendo por perfeição –  que deveria ser o seu ideal mais elevado – aquela divina condição humana que a Filosofia Oculta prevê para a sétima raça da sétima Ronda.  Isso,  como todo  principiante sabe, depende em grande parte do cultivo de um sentimento de Amor Universal;  portanto, um desejo intenso de fazer algum trabalho filantrópico prático é o primeiro  requisito. Mesmo este estado, admito, não é absoluta perfeição: mas o limite máximo de perfeição Espiritual suprema está além da nossa compreensão, atualmente.  Aquela condição só pode ser compreendida intelectualmente como um ideal prático por homens divinos  como os Dhyan-Chohans.  Para estar identificado com O  TODO, devemos viver nele e sentir através dele. Como isto poderia ser feito sem a compreensão do sentimento de Amor Universal? Naturalmente, o Adeptado não está dentro do alcance fácil de todos.   De outro lado, o ocultismo não atribui nenhum lugar ou localidade desagradáveis para aqueles que não aceitam as suas doutrinas. Ele apenas reconhece evoluções mais e mais altas de acordo com uma cadeia de causas e efeitos que trabalha sob o impulso da lei imutável da Natureza. O artigo sobre “Estudo Oculto” no último número [“The Theosophist”, Março de 1884, pp. 131-133] dá a explicação necessária sobre este ponto.
 
É desagradável para mim descobrir que exatamente aquilo que tentei assinalar naquele artigo como prejudicial em seus resultados é, novamente, apresentado como um atributo desejável ou como um suplemento da verdadeira contemplação. Eu pediria a quem escreveu a carta que lesse novamente o artigo, com esses comentários adicionais, antes de pensar sobre a necessidade de qualquer postura determinada para o propósito da contemplação. Eu, pelo menos, sou incapaz de indicar qualquer postura específica para o tipo de contemplação incessante que recomendo.
 
Apesar do artigo sobre o tema acima, publicado em “The Theosophist” de fevereiro, muitos dos seus leitores ainda imaginam que a “contemplação” é uma determinada forma de olhar fixamente para alguma coisa, um processo que, sendo realizado durante um número estabelecido de horas durante o dia,  dará poderes psicológicos. Aparentemente essa compreensão equivocada se deve ao fato de que se perdeu de vista o ponto principal discutido. Em vez de compreender que há apenas uma ideia principal sendo transmitida naquele artigo, e que ela é defendida em muitos dos seus trechos, parece que imaginou-se que quase cada frase expressa uma ideia completamente diferente.  Talvez não seja  desinteressante nem inútil, portanto, voltar ao assunto e colocar a mesma ideia desde outro ponto de vista e, se possível, sob uma luz mais clara. Primeiro, deve ser levado em conta que o autor do artigo, ao usar a palavra “contemplação”,  não queria de modo algum  referir-se ao ato de olhar fixamente para algo. Se essa fosse a ideia, ele teria usado a expressão “olhar fixamente”.  O Imperial Dictionary of  the English Language (1883) define a palavra contemplação da seguinte maneira:
 
(1) O ato da mente de considerar com  atenção; meditação; estudo; atenção continuada da mente para um assunto determinado.  Especificamente – (2) Meditação sagrada; atenção a coisas sagradas.
 
O dicionário Webster’s, edição revista –  também dá o mesmo significado. 
 
Vemos assim que contemplação é a “atenção continuada da mente para um assunto determinado”, e, no plano  religioso, é a “atenção a coisas sagradas.”   É difícil imaginar, portanto,  como a ideia de olhar fixamente possa ter sido associada com a palavra contemplação, a menos que seja porque, geralmente, quando um indivíduo está profundamente absorvido em seus pensamentos, ele parece estar olhando fixamente para alguma coisa no espaço vazio.  Mas este tipo de olhar é o efeito do ato da contemplação.  E, como acontece com  frequência, aqui também o efeito parece ser confundido com a causa. Só porque a atitude de olhar fixamente acompanha o ato da contemplação, já se conclui que o olhar fixo é a causa que produz a contemplação!  Tendo isso claro em nossas mentes, vejamos agora que tipo de contemplação  (ou meditação) o texto “O Elixir da Vida”  recomenda para os aspirantes. Ele diz: “Deve ser praticado e encorajado  o raciocínio que vai do conhecido para o desconhecido – a meditação.”
 
Isto significa  dizer  que a meditação de um chela deve ser “o raciocínio que vai do conhecido para o desconhecido”.  O “conhecido” é o mundo dos fenômenos, que é cognoscível pelos nossos cinco sentidos. E tudo o que vemos neste mundo são os efeitos, cujas causas devem ser buscadas no mundo dos númenos, o imanifestado,  “o mundo desconhecido”: isto deve ser conseguido através da meditação, isto é, pela contínua atenção ao tema.  O Ocultismo não depende de um só método, mas emprega  tanto o método dedutivo como o método indutivo. O  estudante deve aprender primeiro os axiomas gerais.   Durante algum tempo, ele terá naturalmente que adotá-los como hipóteses de trabalho, se ele preferir chamá-los assim. Ou, como “O Elixir da Vida” coloca:
 
“O  que podemos dizer é que se você  está ansioso para beber do Elixir da Vida e viver durante mil anos ou algo semelhante,  você deve aceitar neste momento o que dizemos a respeito, e avançar com base nesta hipótese. Porque a ciência esotérica não dá a menor esperança de que o  objetivo desejado será alcançado de qualquer outro modo; enquanto a ciência moderna, a chamada ciência exata, ri  diante do assunto.”
 
Estes axiomas já foram suficientemente expostos nos artigos sobre o Elixir da Vida e em vários outros que tratam sobre ocultismo, nos diferentes números de “The Theosophist”. O  que o estudante tem que fazer primeiro é compreender estes axiomas e, empregando o método dedutivo, avançar do universal para o específico.  Ele deve então raciocinar “do conhecido para o desconhecido”, e ver se o método indutivo de avançar do específico para o universal confirma estes axiomas. Este processo forma o  primeiro estágio da verdadeira contemplação.  O estudante deve primeiro captar o assunto intelectualmente, antes que possa ter a esperança de realizar as suas aspirações. Quando isto é alcançado, vem então o próximo estágio da meditação, que é  “a inexprimível ânsia do homem interior por ‘sair em direção ao Infinito’.”  Antes que qualquer ânsia desse tipo possa ser adequadamente direcionada, a meta que o estudante deverá ser levado a buscar deve ser determinada durante os estágios preliminares.  O estágio mais alto, na verdade, consiste em compreender na prática aquilo que os primeiros passos colocaram dentro do campo da nossa compreensão.  Em resumo, a contemplação, no seu verdadeiro sentido, consiste em reconhecer a verdade da afirmação de Eliphas Levi: – “Acreditar sem saber é fraqueza; acreditar porque sabemos, é poder.”
 
Ou, em outras palavras, trata-se de saber que “CONHECIMENTO É PODER”.  O texto “O Elixir da Vida” não só dá os passos preliminares na escada da contemplação, mas também diz ao leitor como realizar as concepções mais elevadas.  Ele investiga,  em certa medida pelo processo de contemplação, a relação entre o ser humano – “o conhecido”, o manifestado, o fenômeno – e  “o desconhecido”, o imanifestado, o númeno.  Ele mostra ao estudante que ideal ele deve contemplar e como poderá erguer-se até ele. O texto coloca diante do estudante a natureza das potencialidades interiores do ser humano e diz como desenvolvê-las.  Para um leitor superficial, talvez isto possa parecer o máximo do egoísmo.  A reflexão ou a contemplação, no entanto, mostrarão que na verdade o que ocorre é o oposto. Porque o texto ensina ao estudante que, para compreender o numenal, ele deve identificar-se com a Natureza.  Ao invés de olhar para si mesmo como um ser isolado, ele deve aprender a ver a si mesmo como parte do TODO INTEGRAL.    Isso porque, no mundo imanifestado, pode ser claramente percebido que tudo é controlado pela “Lei da Afinidade”, pela atração entre um e outro.  Assim, tudo é Amor Infinito,  entendido em seu verdadeiro sentido.
 
Talvez seja apropriado recapitular agora o que já foi dito. A primeira coisa a ser feita é estudar os axiomas  do Ocultismo e trabalhar com eles pelos métodos dedutivo e indutivo, o que constitui a real contemplação. Para colocar isto em função de um propósito útil, aquilo que é compreendido teoricamente deve ser compreendido e realizado praticamente.  É de se esperar que esta explicação torne mais claro  o significado do artigo anterior sobre este assunto.
 
D.K.M.  (Damodar K. Mavalankar)    
(‘The Theosophist”,  Índia, edições de fevereiro, abril e agosto de 1884.)
https://www.filosofiaesoterica.com 

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