CORRESPONDÊNCIA SOBRE O TEXTO
“A CONTEMPLAÇÃO”
Lamento
que todo o artigo tenha sido inteiramente mal compreendido. Tudo o que
quis dizer é que o afastamento temporário da família ou amigos não
constitui uma qualificação essencial para fazer progresso em ocultismo.
Isso deveria ficar claro para qualquer um que considere cuidadosamente a
história de Janaka. Trata-se de, mesmo estando no mundo, não ser do
mundo. Muitas pessoas, sem compreender o significado deste importante
ensinamento, se apressam movidas por um desprezo sentimental pelas
coisas mundanas – que surge provavelmente de uma decepção naquele nível –
e começam a praticar o que consideram uma forma autêntica de contemplação. O próprio fato de que esta é a motivação
que leva estas pessoas a adotar esta prática . . . . – este fato é
uma indicação suficiente de que tais pessoas não sabem como é a
“contemplação” de um Raja Iogue. É, portanto, impossível que essas
pessoas possam seguir o método correto; e a prática física, que
necessariamente realizam, as leva aos resultados desastrosos assinalados
no artigo.
Qualquer
leitor com intuição suficiente para ser um estudante prático de
ocultismo verá de imediato que alcançar a perfeição é o ideal mais
elevado que um ser humano pode ter diante de si. Essa não é a tarefa de
um dia ou de alguns anos. “Alguém se torna um Adepto, ninguém É
TRANSFORMADO em Adepto” – esse é um ensinamento que o estudante deve
compreender desde o início. O aspirante trabalha por sua meta ao longo
de uma série de vidas. O coronel Olcott diz em seu livro “O Catecismo Budista”: “. . . Incontáveis gerações são necessárias para transformar um homem em um Buddha, e a vontade de ferro de tornar-se um Buddha percorre igualmente todos os renascimentos sucessivos.”
Esta vontade de ferro de tornar-se perfeito deve estar operando incessantemente, sem um só momento de relaxamento, como ficará claro para alguém que leia cuidadosamente o artigo todo.
É dito claramente que durante o tempo em que esta contemplação não é
praticada, isto é, que a vontade de ferro não está sendo exercida, o
processo de emissão e atração de átomos não pára, e que os desejos,
instintivos ou não, devem ser regulados de modo a atrair apenas átomos
que possam ser adequados a seu progresso. Portanto, não entendo por que
meu correspondente pergunta o que ele deveria fazer em uma hora
específica da manhã. Ele deve cultivar apenas os pensamentos que não
sejam incompatíveis com o mais alto ideal em função do qual ele
trabalha.
Devo acrescentar que entendo por perfeição – que deveria ser o seu ideal mais elevado – aquela divina condição
humana que a Filosofia Oculta prevê para a sétima raça da sétima
Ronda. Isso, como todo principiante sabe, depende em grande parte do
cultivo de um sentimento de Amor Universal; portanto, um desejo intenso
de fazer algum trabalho filantrópico prático é o primeiro requisito.
Mesmo este estado, admito, não é absoluta perfeição: mas o
limite máximo de perfeição Espiritual suprema está além da nossa
compreensão, atualmente. Aquela condição só pode ser compreendida
intelectualmente como um ideal prático por homens divinos como
os Dhyan-Chohans. Para estar identificado com O TODO, devemos viver
nele e sentir através dele. Como isto poderia ser feito sem a
compreensão do sentimento de Amor Universal? Naturalmente, o Adeptado
não está dentro do alcance fácil de todos. De outro lado, o ocultismo
não atribui nenhum lugar ou localidade desagradáveis para aqueles que
não aceitam as suas doutrinas. Ele apenas reconhece evoluções mais e
mais altas de acordo com uma cadeia de causas e efeitos que trabalha sob
o impulso da lei imutável da Natureza. O artigo sobre “Estudo Oculto” no último número [“The Theosophist”, Março de 1884, pp. 131-133] dá a explicação necessária sobre este ponto.
É
desagradável para mim descobrir que exatamente aquilo que tentei
assinalar naquele artigo como prejudicial em seus resultados é,
novamente, apresentado como um atributo desejável ou como um suplemento
da verdadeira contemplação. Eu pediria a quem escreveu a carta que lesse
novamente o artigo, com esses comentários adicionais, antes de pensar
sobre a necessidade de qualquer postura determinada para o propósito da contemplação. Eu, pelo menos, sou incapaz de indicar qualquer postura específica para o tipo de contemplação incessante que recomendo.
Apesar do artigo sobre o tema acima, publicado em “The Theosophist”
de fevereiro, muitos dos seus leitores ainda imaginam que a
“contemplação” é uma determinada forma de olhar fixamente para alguma
coisa, um processo que, sendo realizado durante um número estabelecido
de horas durante o dia, dará poderes psicológicos. Aparentemente essa
compreensão equivocada se deve ao fato de que se perdeu de vista o ponto
principal discutido. Em vez de compreender que há apenas uma ideia
principal sendo transmitida naquele artigo, e que ela é defendida em
muitos dos seus trechos, parece que imaginou-se que quase cada frase
expressa uma ideia completamente diferente. Talvez não seja
desinteressante nem inútil, portanto, voltar ao assunto e colocar a
mesma ideia desde outro ponto de vista e, se possível, sob uma luz mais
clara. Primeiro, deve ser levado em conta que o autor do artigo, ao usar
a palavra “contemplação”, não queria de modo algum referir-se ao ato
de olhar fixamente para algo. Se essa fosse a ideia, ele teria usado a
expressão “olhar fixamente”. O Imperial Dictionary of the English Language (1883) define a palavra contemplação da seguinte maneira:
(1)
O ato da mente de considerar com atenção; meditação; estudo; atenção
continuada da mente para um assunto determinado. Especificamente – (2)
Meditação sagrada; atenção a coisas sagradas.
O dicionário Webster’s, edição revista – também dá o mesmo significado.
Vemos
assim que contemplação é a “atenção continuada da mente para um assunto
determinado”, e, no plano religioso, é a “atenção a coisas
sagradas.” É difícil imaginar, portanto, como a ideia de olhar
fixamente possa ter sido associada com a palavra contemplação, a
menos que seja porque, geralmente, quando um indivíduo está
profundamente absorvido em seus pensamentos, ele parece estar olhando
fixamente para alguma coisa no espaço vazio. Mas este tipo de olhar é o
efeito do ato da contemplação. E, como acontece com frequência, aqui
também o efeito parece ser confundido com a causa. Só porque a atitude
de olhar fixamente acompanha o ato da contemplação, já se conclui que o
olhar fixo é a causa que produz a contemplação! Tendo isso claro em
nossas mentes, vejamos agora que tipo de contemplação (ou meditação) o
texto “O Elixir da Vida” recomenda para os aspirantes. Ele
diz: “Deve ser praticado e encorajado o raciocínio que vai do conhecido
para o desconhecido – a meditação.”
Isto significa dizer que a meditação de um chela
deve ser “o raciocínio que vai do conhecido para o desconhecido”. O
“conhecido” é o mundo dos fenômenos, que é cognoscível pelos nossos
cinco sentidos. E tudo o que vemos neste mundo são os efeitos, cujas
causas devem ser buscadas no mundo dos númenos, o imanifestado, “o
mundo desconhecido”: isto deve ser conseguido através da meditação, isto
é, pela contínua atenção ao tema. O Ocultismo não depende de um só
método, mas emprega tanto o método dedutivo como o método indutivo. O
estudante deve aprender primeiro os axiomas gerais. Durante algum
tempo, ele terá naturalmente que adotá-los como hipóteses de trabalho,
se ele preferir chamá-los assim. Ou, como “O Elixir da Vida” coloca:
“O que podemos dizer é que se você está ansioso para beber do Elixir da Vida e
viver durante mil anos ou algo semelhante, você deve aceitar neste
momento o que dizemos a respeito, e avançar com base nesta hipótese.
Porque a ciência esotérica não dá a menor esperança de que o objetivo
desejado será alcançado de qualquer outro modo; enquanto a ciência
moderna, a chamada ciência exata, ri diante do assunto.”
Estes axiomas já foram suficientemente expostos nos artigos sobre o Elixir da Vida e em vários outros que tratam sobre ocultismo, nos diferentes números de “The Theosophist”. O que o estudante tem que fazer primeiro é compreender estes
axiomas e, empregando o método dedutivo, avançar do universal para o
específico. Ele deve então raciocinar “do conhecido para o
desconhecido”, e ver se o método indutivo de avançar do específico para o
universal confirma estes axiomas. Este processo forma o primeiro
estágio da verdadeira contemplação. O estudante deve primeiro captar o
assunto intelectualmente, antes que possa ter a esperança de realizar as
suas aspirações. Quando isto é alcançado, vem então o próximo estágio
da meditação, que é “a inexprimível ânsia do homem interior por ‘sair
em direção ao Infinito’.” Antes que qualquer ânsia desse tipo possa ser
adequadamente direcionada, a meta que o estudante deverá ser levado a
buscar deve ser determinada durante os estágios preliminares. O estágio
mais alto, na verdade, consiste em compreender na prática aquilo que os
primeiros passos colocaram dentro do campo da nossa compreensão. Em
resumo, a contemplação, no seu verdadeiro sentido, consiste em
reconhecer a verdade da afirmação de Eliphas Levi: – “Acreditar sem
saber é fraqueza; acreditar porque sabemos, é poder.”
Ou, em outras palavras, trata-se de saber que “CONHECIMENTO É PODER”. O texto “O Elixir da Vida” não só dá os passos preliminares na escada da contemplação, mas também diz ao leitor como realizar as
concepções mais elevadas. Ele investiga, em certa medida pelo
processo de contemplação, a relação entre o ser humano – “o conhecido”, o
manifestado, o fenômeno – e “o desconhecido”, o imanifestado, o
númeno. Ele mostra ao estudante que ideal ele deve contemplar e como
poderá erguer-se até ele. O texto coloca diante do estudante a natureza
das potencialidades interiores do ser humano e diz como desenvolvê-las.
Para um leitor superficial, talvez isto possa parecer o máximo do
egoísmo. A reflexão ou a contemplação, no entanto, mostrarão que na
verdade o que ocorre é o oposto. Porque o texto ensina ao estudante que,
para compreender o numenal, ele deve identificar-se com a Natureza. Ao
invés de olhar para si mesmo como um ser isolado, ele deve aprender a
ver a si mesmo como parte do TODO INTEGRAL. Isso porque, no mundo
imanifestado, pode ser claramente percebido que tudo é controlado pela
“Lei da Afinidade”, pela atração entre um e outro. Assim, tudo é Amor
Infinito, entendido em seu verdadeiro sentido.
Talvez
seja apropriado recapitular agora o que já foi dito. A primeira coisa a
ser feita é estudar os axiomas do Ocultismo e trabalhar com eles pelos
métodos dedutivo e indutivo, o que constitui a real contemplação. Para
colocar isto em função de um propósito útil, aquilo que é compreendido
teoricamente deve ser compreendido e realizado praticamente. É de se
esperar que esta explicação torne mais claro o significado do artigo
anterior sobre este assunto.
D.K.M. (Damodar K. Mavalankar)
(‘The Theosophist”, Índia, edições de fevereiro, abril e agosto de 1884.)
https://www.filosofiaesoterica.com
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