O LADO SAGRADO DO ANIVERSÁRIO
Uma Reflexão Sobre o Ciclo Anual da Alma
Quando, afinal, começa o ano novo?
Na
contagem cristã o ano inicia em primeiro de janeiro. Para o povo
judaico, ele começa em uma data variável entre setembro e outubro.
Pela
contagem lunar do extremo oriente, o ano inicia em janeiro, ou
fevereiro. Para cada um de nós, no entanto, o ano novo começa no dia do
nosso aniversário.
É
certo que todas as celebrações são bonitas – quando sinceras. Mas para
marcar o nosso ano novo pessoal talvez não sejam necessárias grandes
festas. Muitos sentem que o dia do aniversário é um renascimento
demasiado importante para ser motivo de agitação externa.
“O
que pode haver de sagrado em um aniversário?”, pergunta um cético.
“Para o budismo, o ‘eu’ pessoal é ilusório. Seria correto comemorar
sinceramente o aniversário de um ‘eu’ que não existe?”
Em “Cartas dos Mestres de Sabedoria”,
um Iogue dos Himalaias admite: para o profano, que vive
inconscientemente, um aniversário significa “apenas mais doze meses em
direção à sepultura” [1]. É triste, mas é verdade. No entanto, esse é só um lado da moeda.
“O
tempo que nos é dado viver só parece curto quando vivemos de modo
errado”, ensinou Sêneca. Na realidade, há algo de substancial e divino a
ser celebrado. Especialmente quando um ano a mais de vida significa um
passo adiante na evolução e no autoaperfeiçoamento – um ano mais de
experiência e aprendizado.
Sem
dúvida, tudo no universo é provisório. De eterno, mesmo, só a lei da
evolução através da verdade, do amor e da justiça. O fato de que uma
vida humana é um processo provisório a torna ainda mais preciosa e digna
de celebração. Nossos aniversários devem celebrar a presença
passageira, na terra, da nossa alma imortal.
Escrevendo
sobre a mitologia clássica, Thomas Bulfinch afirma: “Os romanos
acreditavam que cada homem tinha seu Gênio e cada mulher sua Juno, isto
é, um espírito que lhe dera vida e que era seu protetor, durante toda a
vida. No dia do seu aniversário, os homens faziam oferendas a seu
Gênio, e as mulheres à sua Juno.” [2]
O Gênio romano (“daimon”)
é nosso próprio espírito, nosso anjo da guarda e mestre interior. Nada
mais justo, em nosso aniversário, que prestarmos homenagem a essa nossa
alma imortal. O imperador romano Marco Aurélio escreveu em seu caderno
de meditações:
“Vive
com os deuses quem mostra constantemente a eles que sua alma está
satisfeita com o que lhe foi aquinhoado e que ela satisfaz todos os
desejos do Gênio que Zeus deu a cada homem para seu guardião e guia, uma
parcela dele mesmo.” Em outro trecho, ele anotou: “O que é peculiar ao
homem bom é estar feliz e contentar-se com o que acontece e com a
urdidura dos acontecimentos de sua vida; e não aviltar o Gênio
implantado dentro de seu peito, e não perturbá-lo com pensamentos
demais, mas conservá-lo tranquilo, seguindo-o obedientemente como a um
deus, e não dizer nada contrário à verdade nem fazer nada contrário à
justiça.” [3]
O verdadeiro aniversariante, pois, é nosso espírito imortal. De fato, do ponto de vista astrológico, nosso verdadeiro eu
é do tamanho do sistema solar. Cada planeta ou asteroide que gira em
torno do nosso sol faz parte da nossa personalidade – ou pelo menos
exerce uma viva influência sobre ela. Esse processo psicológico tem como
pano de fundo, e como testemunha, a Via Láctea.
Como
se sabe, é possível conhecer nossa natureza e missão através de uma
análise dos raios cósmicos que os planetas derramaram sobre nós no
momento em que nascemos. O retrato dessas energias inaugurais é chamado
de mapa natal. Além disso, temos um certo “renascimento” a cada
ano. Quando o Sol passa pela mesma posição do céu em que ele estava
quando nascemos, toda nossa energia vital renasce e é renovada.
É
depois do aniversário que sentimos o alívio maior chegar e a presença
de uma nova força magnética à nossa disposição. Astrologicamente, o
aniversário não se dá só no dia em que nascemos, mas inclui os três
dias anteriores e os três dias posteriores.
Assim, dura um total de sete dias a conjunção do sol-em-trânsito com o sol-natal, mais conhecida como aniversário.
Esse
é um tempo para resgatar a energia vital. Para recordar e renascer.
Para meditar e conversar com a Alma. Para receber com calma e humildade a
bênção da energia espiritual renovada.
Carlos Cardoso Aveline
NOTAS:
[1]
“Cartas dos Mestres de Sabedoria”, Editora Teosófica, Brasília, 1996,
295 pp., primeira série, Carta I para Laura C. Holloway, ver p. 145.
[2] “O Livro de Ouro da Mitologia”, Thomas Bulfinch, Ediouro, RJ, 2002, p. 16.
[3] “Meditações”, Marco Aurélio, Ediouro, RJ. O primeiro trecho citado está na p. 61, livro V. O segundo, na p. 42, livro III.
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