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domingo, 19 de julho de 2020

C  O  N  F  L  I  T  O

 Se não me comparo, sou o que sou
 
Eu conheço a obtusidade somente mediante a comparação. Eu vejo você, muito brilhante, muito hábil, muito inteligente – e digo, comparado a ela como sou bronco. Mas, se não comparo, sou o que sou. Certo? Posso então começar daí; mas se estou me comparando todo o tempo com você, que é brilhante, inteligente, de boa aparência, capaz, e todo o resto, estou em eterno conflito com você. Mas se aceito o que sou – eu sou isto – posso começar daí. Portanto, o conflito existe somente quando negamos o fato real de “o que é”. Eu sou isto, mas se estou todo o tempo tentando ser aquilo, estou em conflito. Vocês são assim porque todos vocês se lançam no vir a ser psicológico. Todos querem tornar-se homens de negócios, santos ou meditar adequadamente, não querem? Portanto há conflito. Ao invés de perceber o fato de que sou violento e não me afastar desse fato, eu finjo não ser violento; e quando eu simulo não ser violento, o conflito começa. Portanto, você cessará de fingir e dirá, eu sou violento, vamos lidar com essa violência?


O conflito interno

Depois existe o conflito interno, que é muito mais complexo. Por que há conflito em nós? Estamos examinando; não estamos dizendo que deveríamos ou não deveríamos estar sem conflito. Estamos examinando-o, e para examinar temos de ser muito claros em nosso pensamento, muito perspicazes em nossa observação; temos de estar intensamente conscientes ao observar toda a natureza e o significado do conflito. Por que existe o conflito? O que queremos dizer com a palavra “luta”? Estamos examinando o significado da palavra, não o que produz o conflito. Quando é que estamos de todo conscientes desta palavra, do fato? Somente quando existe dor; apenas quando há uma contradição; só quando há uma busca do prazer e ele é negado. Estou consciente do conflito quando minha forma de prazer na realização, na ambição, em várias formas é contrariada. Quando o prazer da ambição é frustrado, então estou consciente do conflito, mas, enquanto o prazer da ambição continuar sem nenhum bloqueio, não tenho nenhuma percepção de conflito. Existe prazer no conformismo. Quero ajustar-me à sociedade porque ela me recompensa; ela me dá lucro. Por segurança, por um meio de subsistência, para tornar-me famoso, para ser reconhecido, para ser alguém na sociedade, tenho de me ajustar à norma, ao padrão estabelecido pela sociedade. Enquanto eu estiver ajustando-me a ela completamente, o que é um grande prazer, não há nenhum conflito; mas existe conflito no momento em que há uma distração dessa conformação.


Viver uma vida sem conflito

Os seres humanos têm vivido neste estado de conflito desde que a história humana é conhecida. Tudo que eles tocam transforma-se em conflito, interno e externo. Ou é uma guerra entre pessoas, ou a vida como ser humano é um campo de batalha interior. Todos conhecemos essa batalha constante, permanente, externamente e internamente. O conflito produz, sim, certo resultado pelo uso da vontade, mas o conflito nunca é criativo. Essa é uma palavra perigosa de se usar; investigaremos isso logo mais. Para viver, para florescer na bondade, tem que haver paz, não a paz econômica, a paz entre duas guerras, a paz de políticos negociando tratados, a paz de que fala a igreja, ou que as religiões organizadas pregam, mas a paz que se descobriu por si mesmo. Somente em paz é que podemos florescer, podemos crescer, podemos funcionar. Ela não pode surgir quando há conflito de qualquer tipo, consciente ou inconsciente.

É possível viver uma vida sem conflito no mundo moderno, com toda a tensão, luta, pressões e influências na estrutura social? Isso é realmente viver – a essência de uma mente que está indagando seriamente. A questão de se Deus existe, se a verdade existe, se a beleza existe, só pode acontecer quando isso for estabelecido, quando a mente não estiver mais em conflito.


Não é um assunto egoísta

Você poderia perguntar: Se eu, como um ser humano mudar, isso afetará de alguma maneira o resto da humanidade? Se mudar mesmo, se houver uma mudança em uma pessoa específica, como isso afetará toda a consciência da humanidade?” Por favor, coloque, sim, essa questão a si próprio; mesmo como um só ser humano isolado você pergunta, “Se eu mudar, que efeito isso terá no mundo

A questão é, se você muda fundamentalmente, você afeta toda a consciência do homem. Napoleão afetou toda a consciência da Europa. Stalin afetou toda a consciência da Rússia. O salvador Cristão, ele afetou a consciência do mundo, e os Hindus, com seus deuses peculiares afetaram a consciência do mundo. Quando você, como um ser humano, se transformar psicologicamente de forma radical, isto é, ficar livre do medo, tiver uma relação correta com os outros, cessar o sofrimento e assim por diante, o que é uma transformação radical, então você afeta toda a consciência do homem. Não é um assunto individual. Não é um assunto egoísta. Não é uma salvação individual; é a salvação de todos os seres humanos dos quais você é um.


Olhar para a totalidade da vida

Assim a questão agora é como olhar para a totalidade da vida não fragmentariamente. Quando olhamos para a totalidade da vida – não como um hindu, um muçulmano, um comunista, um socialista, um católico, um professor ou um homem religioso – quando vemos esse extraordinário movimento da vida na qual tudo está incluído – morte, sofrimento, infelicidade, confusão, a absoluta falta de amor, e a imagem do prazer que engendramos durante séculos para nós mesmos, que dita nossos valores, nossas atividades – quando virmos essa coisa imensa compreensivamente, totalmente, então nossa resposta a essa totalidade será inteiramente diferente. E é essa resposta, quando vemos totalmente, todo o movimento da vida, que vai produzir uma revolução em nós próprios.


Entendendo o conflito como um todo

Compreender a natureza do conflito exige não a compreensão do seu conflito particular como um indivíduo, mas o entendimento do conflito total como um ser humano – o conflito total, que inclui nacionalismo, diferença de classe, ambição, avareza, inveja, o desejo de posição, prestígio, todo o sentido de poder, dominação, medo, culpa, ansiedade, no qual está envolvida a morte, a meditação – o todo da vida. E para entender o todo da vida, deve-se ver, ouvir não fragmentariamente, mas observar o vasto mapa da vida. Uma de nossas dificuldades é, não é, que funcionamos fragmentariamente, funcionamos em seções, numa parte – você é um engenheiro, um artista, um cientista, um homem de negócios, um advogado, um físico e assim por diante – dividido, fragmentário. E cada fragmento está em luta com o outro fragmento, desprezando-o ou sentindo-se superior


Ensinamentos de Krishnamurti
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